1. Há dias, um amigo perguntou-me porque razão o governo não privatiza a GESTÃO da criminalidade e da insegurança na cidade da Praia - privatização com a qual até concordo. Era só passar essa gestão para um privado e - de uma vez por todas - ficaria logo resolvido esse que é um dos maiores problemas da capital do país. Quanto mais pensava nessa pergunta, mais pertinente me parecia. Afinal, a gestão privada não é aquela que garante o máximo de eficiência, eficácia e os melhores resultados que jamais serão alcançados pelo sector público preguiçoso, comunista, ineficaz e ineficiente?
2. À primeira vista, a pergunta pareceu-me um pouco estranha, mas a pouco e pouco, há uma ideia que se consolida: se, de facto, a privatização resolve tudo - é o remédio para todos os males - porque não entregar a gestão dos problemas mais difíceis aos privados? Se o objectivo é levar a felicidade para todas as pessoas, porque não resolver logo os problemas que mais fazem as pessoas infelizes? Se não for assim, então, pode-se pensar que haverá outros objetivos e interesses que estarão por detrás da decisão de privatizar;
3. É que há dois factos, simultaneamente, muito curiosos e contraditórios: um dos problemas mais gritantes do país não está na lista de privatizações, enquanto uma das empresas mais rentáveis, a ASA, está lá. Parece que há aqui um contra-senso! Apanhar a empresa pública que mais dá lucros e entregar a privados. O que equivale a dizer: apanhar o maior lucro do Estado e entregar a um pequeno grupo de pessoas;
4. Há duas conclusões que poderemos retirar destas decisões: a razão porque o governo não privatiza a GESTÃO da criminalidade e da insegurança na cidade da Praia é muito simples e aplica-se a todos os sectores que não são privatizáveis: não dá lucro e, logo, não tem nenhum privado interessado em assumir. Por outro lado, a verdadeira e maior razão porque se fazem determinadas privatizações - e de forma pouco transparentes - é só uma: criar oportunidades para o enriquecimento de pessoas mais próximas do aparelho do poder. Não sou eu quem aponta esta forma de enriquecimento ilícito. Quem o faz é Joseph Stiglitz, prémio Nobel da economia e que foi vice-presidente sénior do Banco Mundial;
5. Ao olharmos para o caso da ASA, poderemos constatar que nesse favorecimento há dois bónus importantes que os sortudos levam: ganham de borla os aeroportos construídos - sem gastarem nenhum tostão - e são os cabo-verdianos que vão continuar a pagar os empréstimos contraídos pelo Estado para a construção desses mesmos aeroportos, enquanto um grupo de amigos privados vão encher os seus bolsos. É a versão do "Estado amigo das empresas": as empresas são entregues aos amigos para ficarem ricos. Parece que agora os críticos do endividamento público pelo betão preferem ficar em silêncio face à doação do betão para o lucro do privado!
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