A ex-líder do PAICV Janira Hopffer Almada voltou hoje a intervir no parlamento, 15 meses depois de ter deixado a liderança da oposição, concentrando parte da atenção do anual debate sobre o estado da Nação.
“Para dizer que acredito em Cabo Verde. Acreditei ontem, acredito hoje e continuarei a acreditar amanhã. Mas optei nesta primeira fase por não falar, por observar. Porque às vezes é preciso deixar o tempo falar, deixar o julgamento ser feito e a sentença ser dada. No seu tempo”, começou por afirmar a deputada Janira Hopffer Almada.
A ex-presidente do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV) concorreu ao cargo de primeira-ministra nas eleições legislativas de 2016 e de 2021, em ambas derrotada pelo Movimento para a Democracia (MpD), liderado pelo primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, tendo anunciado a saída da liderança do partido na sequência da derrota eleitoral em 18 de abril do ano passado.
Hoje foi a primeira intervenção que realizou no atual mandato, iniciado em maio de 2021 e durante o qual tem vindo a pedir a substituição em vários períodos, mas também uma das raras declarações públicas desde que deixou a liderança do PAICV, liderado por Rui Semedo, inicialmente interinamente e depois escolhido em eleições diretas em dezembro passado.
A intervenção, de vários minutos e depois com esclarecimentos às respostas dos deputados do MpD e do Governo, surgiu após o cenário que o país vive, traçado pelo ministro de Estado, da Família e da Inclusão e Desenvolvimento Social, Fernando Elísio.
“A situação é crítica, complexa e difícil, por isso é que este país, cor-de-rosa pintado, salvo o devido respeito, pelo senhor ministro da Família, não deve ser Cabo Verde. Deve ser o país onde ele vive, na sua cabeça, mas não o país que os cabo-verdianos sentem”, criticou Janira Hopffer Almada.
“Mesmo discurso, sempre com o mesmo resultado. Derrota nas eleições”, respondeu o ministro, depois de o deputado do MpD Emanuel Barbosa ter também ironizado sobre a liderança do PAICV.
“Uma oposição de duas cabeças. Mas de pensamento zero”, afirmou o deputado, com Janira Hopffer Almada a dirigir-se à bancada da maioria a dizer que “já estavam com saudades”.
“Eu não estou em campanha interna porque eu saí pelos meus próprios pés da liderança, não fui retirada. Saí com os meus pés”, disse.
A deputada, ex-líder do PAICV e antiga ministra no Governo de José Maria Neves, atualmente Presidente da República, criticou ainda o primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, por no, discurso desta manhã sobre o estado da Nação, manter, como há um ano, os argumentos da crise provocada pela seca e pela pandemia de covid-19.
“E acrescentou a guerra na Ucrânia. Mas não tirou as consequências nas despesas públicas que faz, na criação de estruturas, no aumento dos gastos públicos. Porque a crise só serve quando é para cortar naqueles que precisam mais, nos setores prioritários, como a saúde, a educação, a habitação, a energia e a água. Mas quando é para cortar no luxo do Governo não há crise, o país está bem, está a crescer e a acena-se com os relatórios do FMI e do Banco Mundial”, acusou Janira Hopffer Almada.
Os dados do crescimento da dívida pública, dos programas de habitação e da situação do desemprego em Cabo Verde, apresentados pelo Governo, foram igualmente visados pela ex-líder da oposição, contestando-os e aludindo aos efeitos de alegadas medidas adotadas pelo executivo antes das legislativas de 2021.
“Por o momento ser difícil é preciso, sim, a união dos cabo-verdianos, para garantir o básico. Mas não é para garantir o básico apenas nos períodos pré-eleitorais, com o Cadastro Social e os perdões de dívida de eletricidade. É para garantir o básico durante todo o mandato, durante os cinco anos, para conseguirmos o caminho seguro e termos a felicidade tão ansiada, almejada e prometida”, criticou Janira Hopffer Almada.
O deputado Rui Semedo, que não interveio nos trabalhos da manhã de hoje do debate sobre o estado da Nação, foi eleito em 19 de dezembro de 2021 presidente do PAICV, com 99% dos votos favoráveis, em eleições diretas com mais de 40% de participação, em que era candidato único.
Questionado na altura sobre se admitia tentar um segundo mandato em 2024, para concorrer ao cargo de primeiro-ministro nas eleições legislativas de 2026, Rui Semedo respondeu que nada estava decidido, garantido apenas que está “disponível para tudo”.
“Estou disponível para cumprir este mandato, para me submeter à avaliação dos cabo-verdianos, para me submeter à avaliação dos militantes e fazer uma autoavaliação e tomar a melhor decisão, a mais adequada, naquele contexto concreto”, respondeu.
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