A marcha é da iniciativa dos irmãos e familiares de Edmilson Tavares, conhecido por Degu (foto), supostamente torturado, assassinado e lançado numa ribanceira, próxima da casa onde morava, na localidade de Ponta Belém, Achada Fátima, cidade de Pedra Badejo, concelho de Santa Cruz, no dia 24 de Outubro de 2017. Mais de 40 dias se passaram e os familiares ainda aguardam uma posiçáo das autoridades policiais e judiciais sobre este suposto crime.
Os famliares descordaram das autoridades desde a primeira hora, a começar pelo laudo médico, que definiu como causa da morte "queda de altitude". "O corpo da vítima apresentava sinais de tortura, espancamento e o pé direito estava mutilado e com inconfundíveis marcas de que tenham utilizado, para o efeito, uma rebarbadora. Percebia-se que a parte da cara que ficara exposta ao sol se aparentava pintada de preto e, a que ficara para o chão estava totalmente esmagada, o que se pressupõe, tê-lo aí colocado depois de o terem torturado, sob um plano orquestrado e milimetricamente executado", afirma o irmão Armindo Tavares.
Em carta dirigida ao presidente da Câmara Municipal local, com conhecimento ao procurador da República, ao Juiz da Comarca e ao comandante da Polícia Nacional, os promotores invocam o artigo 52 da Constituição da República de Cabo Verde para justificar o protesto, que acontece pelas 13 horas desta sexta-feira “a partir das imediações do Paço do Concelho, entre este e os Correios, com destino ao átrio do Palácio da Justiça, onde se efetuarão uma manifestação durante 45 minutos, apelando por justiça. Depois, farão um percurso simbólico pelas artérias da cidade”.
Os manifestantes querem protestar contra a insegurança que reina em Santa Cruz, concretamente na cidade de Pedra Badejo, bem como o descaso das autoridades, policial e judicial, no sentido de se fazer a justiça com a consequente descoberta dos presumiveis assassinos.
Neste caso concreto de Edmilson Tavares, os promotores da manifestação dizem que existem “evidentes sinais de ter sido brutalmente assassinado”.
“O cadáver do Degu foi encontrado abandonado numa lixeira, pelas 9h00 do dia 25 de Outubro, com o pé direito mutilado e outras marcas de que tenha sido selvaticamente torturado. Várias testemunhas afirmam tê-lo visto pela última vez com vida, cerca das 3h00 da manhã do dia 24 de Outubro”, escrevem os irmãos da vítima.
As primeiras informações veiculadas pela Televisão de Cabo Verde, foi de que, o corpo de um nigeriano, que residia na cidade da Praia, teria sido encontrado morto numa ribanceira em Santa Cruz.
“Essa notícia fez com que todas as atenções se desviassem e que ninguém se pensasse que poderia ter sido alguém da redondeza, ou conhecido, muito menos um familiar”, registam os irmãos na carta enviada às autoridades locais, acrescentando que “só no dia 28 de Outubro é que, através de uma das fotografias que foram feitas ao cadáver, foi possível aos familiares reconhecerem que na verdade se tratava do Degu. Imediatamente foram acionados os expedientes e comunicado às autoridades competentes, nomeadamente, Procurador da Comarca de Santa Cruz, Polícias Nacional e Judiciária”.
Entretanto, passados já 40 dias sobre a data da identificação do cadáver pelos familiares, “pese embora, muitas pistas encontradas e denunciadas às autoridades, nenhuma diligência ainda tem sido feita. Testemunhas importantes se prontificaram e ainda se prontificam em depor, caso fossem notificadas, mas as autoridades simplesmente as ignoram, como quem quer esconder ou deturpar algo”, afirmam na referida carta.
Os familiares de Degu não escondem a sua indignação perante esta situação. O irmão da vítima, Armindo Tavares, num artigo sobre o assunto, publicado neste diário digital, escreveu o seguinte: “O cadáver foi removido pela Polícia Nacional (PN) e pela Polícia Judiciária (PJ) que o conduziram ao Centro de Saúde de Santa Cruz e depois à morgue do Hospital Dr. Agostinho Neto, na cidade da Praia. A inexplicável ausência da médica legista no ato do levantamento do corpo deixa muitas e sérias interrogações. No Centro de Saúde de Santa Cruz foram feitas algumas fotos ao cadáver, de vários ângulos e em várias posições. O malogrado estava nú, trajando apenas um boxer de cor vermelha, o que permitia verificar que o corpo estava muito maltratado, com sinais evidentes de desmesurada sevícia. O pé direito estava mutilado e com inconfundíveis marcas de que tenham utilizado, para o efeito, uma rebarbadora. Percebia-se que a parte da cara que ficara exposta ao sol se aparentava pintada de preto e, a que ficara para o chão estava totalmente esmagada, o que se pressupõe, tê-lo aí colocado depois de o terem torturado, sob um plano orquestrado e milimetricamente executado. Colocaram-no muito comodamente, numa rampa mesmo debaixo da janela da casa do pai, onde ele também vivia com alguns familiares, com o firme propósito de dissimular a queda ou mesmo o suicídio. Possivelmente pela pancada que terá levado na parte da cabeça, os olhos saíram completamente fora das órbitas. Segundo informações de uma enfermeira que se encontrava de serviço no Centro de Saúde de Santa Cruz, ele tinha alguns dentes arrancados e o escroto exageradamente avolumado".
No dia 30 de Outubro, escreve Armindo Tavares, "o corpo foi liberado, com instruções de que o caixão não podia ser aberto e que o funeral deveria ser feito de imediato. Na declaração emitida pela Delegacia de Saúde da Praia para o registo de óbito, constava que a causa da morte tinha sido “queda de altitude”. Descontentes, alguns familiares exigiram ver o corpo para se verificarem de que tenha sido autopsiado. Não lhes foram concedidos tal permissão. O irmão mais velho teve a oportunidade de falar com a médica legista e esta lhe confirmou o conteúdo da declaração, acrescentando ainda que o cadáver já se encontrava, no ato do levantamento, em avançado estado de decomposição. Que o pé mutilado teria sido comido pelo cão e que na condição que a cara se encontrava, se justificava pela putrefação do corpo. Questionada sobre a causa factual da morte, a médica remeteu-o, tão friamente, para a PJ".
Estes e outros argumentos são apresentados pelos promotores da manifestação, que fazem questão de relembrar vários outros crimes cometidos em Santa Cruz e que até hoje não foram descobertos pelas autoridades.
“Degu é apenas mais um de entre vários assassinados em Santa Cruz, cujos verdadeiros culpados nunca tenham sido responsabilizados, por simples inércia das autoridades, afirmam, alencando “alguns nomes dos que aqui foram misteriosamente assassinados em menos de duas décadas: Em 2000, Zé di Ribeira da Barca, que era agenta da Polícia de Alfândega de Pedra Badejo; 2001, Zezito, que era Procurador da República desta Comarca; 2002, Pepi di Txetxenia, septuagenário, lavrador, morava em Achada Fátima; 2013, Kagatu di Nene Korda, que residia em Cutelinho, foi vítima de uma bala perdida quando regressava do trabalho; 2014, Lineti di Beatriz, morta em Txetxénia, Achada Fátima, com vestígios de violação e estrangulamento; 2015, Sandro di Renque Purga desapareceu misteriosamente; 2016, Felismino, ex-emigrante, morto com 11 tiros de um revólver, por volta das 6h00 de manhã em Achada Fátima; 2017, há coisa de 3 ou 4 meses, Sofy di Mafalda de Achada Fátima, foi morto após sofrer um golpe à catanada”.
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