É imperativo questionar até quando essa mentalidade prevalecerá no nosso país. Quando começaremos a reconhecer que um adversário político não é um inimigo mortal? A diabolização de indivíduos com base nas suas preferências políticas é um sintoma de uma democracia imatura, onde o debate saudável e construtivo é substituído por conflitos e acusações.
Em Cabo Verde, a paisagem política é frequentemente marcada por um slogan tácito que permeia as interacções sociais e políticas: "Se não estás comigo, és contra mim." Esta máxima, embora não oficial, reflecte uma divisão alarmante que transcende a mera discordância política, transformando adversários em inimigos.
Na prática, isso traduz-se numa arena pública onde o carácter, a honra e a personalidade de indivíduos são frequentemente triturados. Especialistas e personalidades com credenciais impressionantes participam e até lideram essa cultura de silenciamento daqueles que ousam pensar de forma independente ou desafiar o statu quo. Sob o olhar muitas vezes conivente das autoridades, assistimos a um cenário onde os "não conformistas" são não apenas criticados, mas ostracizados e marcados como alvos a abater.
Essa cultura de antagonismo é alimentada e ampliada pelas redes sociais, onde o escrutínio público e as campanhas de difamação podem ser implacáveis. Em Cabo Verde, temos "ágoras" modernas — espaços virtuais e físicos — que determinam quem será o próximo ostracizado, sob o disfarce de activismo social ou formação de opinião. O título de "detentor da verdade" é frequentemente auto-atribuído, promovendo uma diabolização do outro baseada unicamente na filiação política.
É imperativo questionar até quando essa mentalidade prevalecerá no nosso país. Quando começaremos a reconhecer que um adversário político não é um inimigo mortal? A diabolização de indivíduos com base nas suas preferências políticas é um sintoma de uma democracia imatura, onde o debate saudável e construtivo é substituído por conflitos e acusações.
Este é um apelo aos cidadãos cabo-verdianos para não se deixarem intimidar e continuarem a exercer a sua cidadania de forma activa e plena. A verdadeira democracia não se sustenta na homogeneidade de opiniões, mas na capacidade de dialogar, discordar e, finalmente, coexistir pacificamente, apesar das diferenças. A cacofonia política actual precisa ser substituída por um concerto onde todas as vozes possam ser ouvidas e respeitadas.
A democracia é um trabalho em constante evolução, e é nosso dever colectivo nutrir uma cultura que celebre a diversidade de pensamentos e fomente o respeito mútuo. Que os cabo-verdianos se unam, não em uniformidade, mas no compromisso com a tolerância e a compreensão, pilares de qualquer sociedade verdadeiramente democrática.
Comentários