Fidel Cardoso de Pina, líder da JPAI, defende que “sem esmero, dedicação e empenho as coisas tornam-se mais difíceis ou não se realizam”. Isto pode não ser uma piada a esta importante camada da sociedade cabo-verdiana, mas antes, uma chamada de atenção dirigida a toda a nação, ciente de que “só teremos uma juventude ousada, inovadora, ambiciosa, proativa e empreendedora se existirem incentivos e políticas públicas que premeiam o mérito, a inovação, a produtividade e o empreendedorismo”. É a conversa do líder da JPAI por ocasião dos 23 anos da criação desta agremiação juvenil do partido tambarina.
Santiago Magazine - A JPAI acaba de completar mais um ano da sua existência. Que mensagens gostaria de deixar para os jovens cabo-verdianos?
Fidel Cardoso de Pina - Gostaria primeiramente de felicitar a todos os camaradas da JPAI, em especial aos Vice-presidentes, à Secretária-geral, a todos os Secretários Nacionais de coordenação, a Presidente da CNJA, bem como todos Presidentes Concelhios e membros da JPAI, que realmente têm feito um grande esforço para que melhoremos no dia-a-dia enquanto instituição e organização. Igualmente não poderia deixar de enaltecer o contributo que todos os outros que aqui passaram, nomeadamente os Presidentes cessantes e suas respetivas direções, quer a nível nacional quer a nível concelhio para construir este património do PAICV que é a JPAI.
À juventude cabo-verdiana gostaria de dizer que nós continuamos a Acreditar no nosso país Cabo Verde que, a juventude é a força para a mudança. Mas para isso é essencial haver participação política, seja ela partidária ou não. A juventude não pode calar-se. Temos de continuar a revindicar os nossos direitos, oportunidades e as nossas causas, mas principalmente lutar por Cabo Verde. Aqui quero destacar a necessidade de um compromisso e a ação com vista a garantir um futuro melhor, com maior bem-estar para todos. O futuro a nós pertence.
Prometemos enquanto organização continuar a defender os interesses e lutar pelas causas da juventude cabo-verdiana, para a construção de uma sociedade com mais liberdade, igualdade, democracia, desenvolvimento e justiça social. Permita-me fazer um reparo no que toca à urgente necessidade de mudança de mentalidade da nossa sociedade, sobretudo da juventude nacional, por forma a fazê-la acreditar que o sucesso e a construção de algo maior é possível, caso haja engajamento, compromisso e ação para o sucesso. Tenho saudades do futuro e sei que juntos faremos a diferença.
Nota-se cada vez mais um certo desinteresse da juventude cabo-verdiana em relação á vida política. Na sua opinião, de que lado está a culpa? Do lado das formações políticas ou do lado dos jovens?
Todos têm parte da responsabilidade no processo. Mas infelizmente é preciso dizer que o atual cenário político-governativo do país caminha no sentido inverso e não há sinais que haverão mudanças num futuro recente. A ausência de políticas públicas claras e o desmantelamento das estruturas juvenis que outrora tiveram um papel importante na dinamização deste setor no nosso país vislumbra claramente a despreocupação do atual governo para com o setor da juventude. É certo que não podemos imputar todas as responsabilidades às autoridades. A juventude tem um papel a exercer e liderar este processo. É preciso foco no futuro. Nós, enquanto, jovens temos que nos esforçar por aquilo que almejamos. Temos de ser capazes de criar e ousar para podermos triunfar. Mesmo que seja difícil, acreditamos que é fundamental a preparação e definição clara de objetivos e o buscar de alternativas que nos leve ao sucesso. Sem esmero, dedicação e empenho as coisas tornam-se mais difíceis ou não se realizam.
Contudo, o comportamento dos indivíduos numa sociedade depende da estrutura de incentivos vigente, o que significa dizer que só teremos uma juventude ativa, atuante e portadora de conhecimentos se tivermos incentivos para o efeito. Ou seja, só teremos uma juventude ousada, inovadora, ambiciosa, proativa e empreendedora se existirem incentivos e políticas públicas que premeiam o mérito, a inovação, a produtividade e o empreendedorismo.
Normalmente, as juventudes partidárias são vistas como viveiros de formação e preparação de lideranças políticas. Acredita que a JPAI tem sido este viveiro?
Acredito que sim. Aliás, acredito sempre! Não tem sido fácil o processo de renovação de estruturas da nossa organização, mas o secretariado-geral tem feito muito esforço e grande trabalho neste sentido. Hoje temos muitos jovens líderes e com muito potencial na JPAI por todo país.
Sente-se um ambiente fantástico e família JPAI tem crescido bem. Em quantidade e em qualidade. Existe uma amizade enorme, um espírito de camaradagem e motivo que leva os jovens cabo-verdianos a quererem fazer parte desta família. Estou muito convencido, que no futuro curto, médio e longo prazo o partido estará bem servido com vários quadros preparados para dar o contributo ao PAICV, mas sobretudo a Cabo Verde.
Penso que um dos maiores desafios que tenho enquanto líder da Juventude do PAICV é contribuir para o surgimento e a formação de mais jovens líderes que serão necessários para futuro do partido. A dedicação desta direção tem sido sempre direcionada neste sentido e estou seguro que muito brevemente estaremos a colher frutos neste sentido.
A Juventude do PAICV é o pulmão do PAICV, que ajuda o partido respirar com força e determinação.
Os jovens constituem a maioria da população cabo-verdiana, num país onde o desemprego jovem atinge níveis proibitivos. Na sua opinião, o que é está a falhar no domínio das políticas públicas para a juventude, se é que ela existe?
Atualmente Cabo Verde conta com uma população maioritariamente jovem, com um bom número de quadros médios e superiores e, também, com outros menos qualificados, sobretudo no meio rural que se dedicam à agricultura, ao pastoreio ou à pesca. Temos um grande número de jovens no desemprego, principalmente nos grandes centros urbanos do país e tivemos um agravamento do desemprego no meio rural devido à seca que resultou num mau ano agrícola.
O país continua com uma alta taxa de desemprego jovem, sem oportunidades para acederem, mediante concurso público, a altos cargos na administração pública. Há muitos jovens empregados em condições precárias e claramente não há uma visão do que se quer para os jovens deste país. Hoje a juventude tem menos oportunidades de formação superior ou profissional, causadas pela redução de bolsas de estudo que tivemos nestes últimos dois anos mas também por falta de emprego, gerando inclusive insucesso escolar.
A juventude cabo-verdiana está ansiosa por um futuro melhor com mais emprego e oportunidades, sejam elas de formação superior ou profissional, ou que lhes permita empreender numa atividade económica, desportiva, cultural ou contribuir de outras formas para este país. Ou seja, anseia por algo que parece não chegar, apesar das muitas promessas feitas nas campanhas.
Hoje em dia tempos cada vez mais jovens que são mães e pais e que lhes falta alguma preparação para desempenhar esse papel, gerando, inclusive, a desestruturação das famílias, por carência de recursos. O facto de cada vez mais as famílias cabo-verdianas serem monoparentais tem abalado a nossa sociedade. Esta situação atual de desânimo que se encontra a nossa juventude traz consequências ou males sociais, com agravamento bastante acentuado no alcoolismo, na delinquência juvenil, na prostituição jovem, no abandono escolar e na paternidade precoce.
Se fosses chefe do governo de Cabo Verde, que medidas de política tomarias para reverter o quadro negro em que os jovens estão vivendo?
É necessário um desenvolvimento inclusivo por todo país. São necessárias políticas fortes e sustentáveis para a juventude, que possam chegar efetivamente a todos os 22 municípios de Cabo Verde. É nosso entendimento que deverão ser criadas igualdades de oportunidades para todos os jovens no país, independentemente de onde este jovem estiver. São necessárias políticas claras e estratégicas para gerar mais emprego - o problema do desemprego é o maior “flagelo” que atormenta neste momento a nossa juventude.
Deve haver um conjunto de políticas direcionadas à juventude para dar combate aos problemas existentes, principalmente o êxodo dos nossos quadros para fora do país. Neste sentido, é fundamental, por exemplo, a desburocratização e agilidade dos processos de linhas de crédito para pequenas e médias empresas, que têm afetado sobretudo jovens empreendedores.
É necessária também uma melhor visão para a Educação, o Ensino Superior, a Formação Profissional e a Inovação. O nosso país irá desenvolver-se ao ritmo que almejamos se a juventude, actual e a vindoura, tiver acesso a um sistema de educação de qualidade, bem como de Ensino Superior, Formação Profissional e Técnica e que priorize a inovação. Portanto, é fundamental uma acção escolar pensada e que apoie com bolsas de estudos e fundos de apoio a investigação para que os nossos jovens tenham acesso, em condições de igualdade e competitividade, a formação, seja ela profissional ou superior. O nosso sistema de ensino, apesar dos inúmeros e visíveis ganhos conseguidos, ainda é muito tradicional, pelo que, muitas vezes não desperta ou não sabe aproveitar as verdadeiras potencialidades dos nossos jovens.
Também, precisamos de políticas objetivas em matéria de Desporto e Cultura. A juventude pode contribuir muito nestes sectores e, ao mesmo tempo, ter benefícios se houver uma visão estratégica para trazer ganhos na economia a partir da harmonia do Desporto e da Cultura. Todos os países que almejam o desenvolvimento também cuidam destes sectores, sendo estes claros elementos de unificação de uma nação, de um povo. Este país é rico em talentos a nível desportivo e cultural. Há muita “matéria-prima no domínio desportivo-cultural” que precisa ser trabalhada, valorizada, estimulada e colocada ao serviço do desenvolvimento do país para geração de valor cultural, desportivo e económico em Cabo Verde.
Políticas de incentivo à habitação jovem também são uma necessidade real no país. O acesso à habitação jovem em Cabo Verde tem sido uma das maiores dificuldades para a nossa juventude. Por custo de vida estar cada vez mais elevado, os custos da habitação, nomeadamente as mensalidades em caso de arredamento de uma moradia, ou o pagamento da prestação mensal ao banco em caso de compra de habitação, assumem o maior peso no orçamento familiar dos jovens casais em início de vida.
Com tudo isso, precisamos de um Governo que trabalhe em prol da juventude e que queira, efetivamente, criar políticas que visam a empoderamento da juventude cabo-verdiana. Acreditamos que a pasta da juventude não pode continuar diluída ou camuflada na orgânica do Governo. Temos reiterado isso, porque a juventude é a franja da nossa sociedade com maiores problemas. O país é constituído, na sua maioria, por jovens, pelo que, para o bem da nossa juventude, deveria existir, na atual orgânica do governo, uma entidade claramente definida e com competências de conhecimento público para tutelar o sector da juventude. Para que a ela possam ser imputadas responsabilidades e compromissos e, também, junto a esta entidade, contribuirmos positivamente em prol da juventude cabo-verdiana.
Numa escala de 0 a 10, que notas daria ao Primeiro-ministro Ulisses Correia e Silva?
Não entraria por esse caminho de dar notas ao desempenho do Sr. Primeiro-Ministro porque as vozes que vêm das ruas já fazem-se sentir. A constatação que pode ser feita é que o Sr. Primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva não tem comprido com o seu discurso eleitoral. O desempenho do Sr. Ulisses Correia e Silva está muito aquém do esperado. A desilusão é total para os cabo-verdianos aqui e na diáspora, mas principalmente para nossa juventude. Desde que tomou posse, a Juventude caiu em esquecimento e deixou de ser uma prioridade para o país. Depois da vitória nas últimas eleições, já lá vão mais de 2 anos de mandato e as promessas e os compromissos com a nossa juventude simplesmente foram esquecidos. Hoje as dificuldades para juventude cabo-verdiana são enormes e não há qualquer sinal de alento por parte do nosso Primeiro-ministro. Este Governo ainda continua a fazer promessas eleitorais.
Preocupa-nos o facto de nos últimos tempos não termos visto o Primeiro-Ministro a comparecer ao Parlamento para justificar-se perante a Nação, em especial à juventude, traduzindo-se numa falta respeito para com os cabo-verdianos. Em boa hora chega o novo regimento da Assembleia Nacional e, esperamos a sua comparência regular no parlamento para assumir este retrocesso da juventude. Esperamos que não haja manobras para não comparecer no parlamento.
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