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Abraão Vicente, ministro que é ministro presta contas!
Colunista

Abraão Vicente, ministro que é ministro presta contas!

Abraão já deixou o Governo, alguns meses após anunciar publicamente a sua candidatura à Câmara Municipal da Praia, pelo MpD. Sai pela porta dos fundos, em silêncio, mas vai ter que prestar contas. É que ministro que é ministro presta contas! O Estado de Direito ainda não morreu.

Abraão sai para concorrer às eleições autárquicas deste ano no maior município do país. Sai sem honra, nem glória. Não deixa obra, não deixa resultados. Deixa, sim, uma mão cheia de nada. Falou muito. Está há 8 anos a falar. Gosta de falar, mas raras vezes diz coisa que valha. Não fosse ele uma espécie de cartomante ambulante, deambulando entre Praia e Mindelo, com frequentes visitas à Europa nos intervalos da sua governação encenada, falsa e irresponsável. Debitando discursos, criando cenários e narrativas, gerindo expetativas e concebendo estratégias de condicionamento de artistas, de publicações e divulgação de obras de arte, de eventos...

Fica para a história como um dos piores ministros do pior governo que Cabo Verde já teve desde a independência. E agora que salta da cadeira onde esteve sentado por longos 8 anos, usufruindo das benefesses de um cargo público pago com o dinheiro de todos os cabo-verdianos, a ética republicana e as leis da democracia recomendam e impõem que preste as contas. Sim! Abraão Vicente não pode sair assim da cena, em silêncio, esquivando-se pela porta dos fundos, sem apresentar um relatório exaustivo do que fez durante esses 8 anos como ministro da Cultura e das Indústrias Criativas, que depois passou a acumular com o do Mar.

 A cultura é que nos define. É pela cultura, e só por ela, é que somos cabo-verdianos. De outro modo, o cabo-verdiano não existe. Daí a importância desse setor no processo de desenvolvimento do nosso país, que não tem recursos naturais, é territorialmente minúsculo, mas terra de um povo que é culturalmente grande no mundo, pela sua música, culinária, literatura, artesanato, pintura, tudo o que é a expressão da alma, a manifestação do espírito deste ser ilheu, telúrico, que rompe o cerco do mar para conquistar o universo através da arte, da criação, do prolongamento do eu, do outro, das ilhas, num processo de recriação constante, inovador e transcendente.

São estes homens, e mulheres, e jovens, enfim, é esta nação, este povo, é que estão a exigir que Abraão Vicente preste contas, não só por ser um direito que se lhes assiste, mas porque, e sobretudo, é um dever que este tem para com o país, enquanto servidor público que é suposto ter sido. 

Prestar contas é um dos princípios fundantes da democracia. Quando um cidadão exerce uma função no Estado ele fica vinculado ao dever de prestar contas, para ser avaliado pela nação, que tem o direito e a obrigação de, a todo o tempo, saber até que ponto o interesse público foi salvaguardado ou não pelo sujeito que andou a “gerir” a coisa pública.

Partindo dessa premissa, é necessário que o país passe a saber o que fez o Abraão Vicente no exercício das suas funções. Por exemplo, o que fez no domínio das indústrias criativas? Se existem tais indústrias, onde é que estão, quais foram as intervenções do Estado (entenda-se Ministério das Indústrias Criativas) nessas indústrias, e quais foram os investimentos em fundos públicos ali alocados?

No domínio da literatura, para além de um ou outro evento onde se cruzaram escritores do mundo lusófono para “conversarem” entre si, sem qualquer respaldo na educação, no ensino e na promoção cultural e intelectual dos jovens e da nação cabo-verdiana, o que mais fez o Abraão Vicente? Em detalhes, o que é que o ministro Abraão Vicente fez para a promoção da leitura, da criação literária, da publicação e divulgação de novos talentos na literatura e na escrita criativa de um modo geral?

No domínio da música, existe algo novo criado pelo ministro Abraão Vicente, para além dos patrocínios aos festivais, cujo critério de financiamento certamente nem os anjos conhecem? Terra de música e de músicos, alguém sabe qual tem sido a política deste ministro para estes homens e mulheres que levam Cabo Verde por todos os cantos do globo, sem visto ou autorização de seja quem for, apenas pelo poder da criação e pela força e ousadia de quebrar barreiras e silenciar preconceitos, fazendo-se ao mundo, com fato e gravata, ou tão-só de short e chinelas, porém, entrando pelas casas e afagando as almas por esta ldeia global com o seu som, mensagens e melodias…

A mesma questão deve ser feita em relação ao artesanato, à pintura, à culinária e demais expressões artisticas e culturais tipicamente cabo-verdianos.

No mar, é a lenga-lenga que o país conhece. O acordo de Pescas é um ato, a todos os títulos, criminoso, pelos danos que causa a Cabo Verde e aos cabo-verdianos. Os armadores nacionais já falaram sobre isso, protestando, mas ninguém ouviu a voz do ministro Abraão defendendo a classe. Um ministro é antes de tudo um funcionário público, está lá para servir, para defender os interesses das pessoas, dos operadores económicos, dos investidores e do país. No setor das Pescas, Abraão Vicente tem defendido o quê mesmo?

Os dados oficiais registam que o contributo das pescas no PIB tem estado a diminuir, o Abraão Vicente deve explicar ao país o que fez ou não fez para que isto esteja a acontecer. Não será certamente fibrando botes, que iremos desenvolver o setor das Pescas em Cabo Verde...

Nos transportes marítimos, a situação é bem mais dramática. O governo entregou a exploração marítima doméstica a um grupo estrangeiro, o ETE, e este não só não investiu em novos navios como tem utilizado os nossos barcos para navegar entre as ilhas, prejudicando a economia, os negócios e a satisfação de necessidades básicas da população cabo-verdiana.

Aliás, o que tem acontecido com a gestão dos transportes maritimos entre as ilhas pode ser tipificado como crime contra o Estado de Direito Democrático, na medida em que está-se a afrontar os direitos básicos dos cabo-verdianos, que gozam do direito constitucional de circular no seu país, fazer negócios, trabalhar, gerar rendimentos para a sua vida, a vida da sua família e o desenvolvimento do seu país.

Ora, certa vez, face aos recorrentes descasos e incapacidades da CV Interilhas em responder à demanda das populações, com custos financeiros, sentimentais e psicológicos enormes para os cabo-verdianos, Abraão Vicente prometera multar a companhia. Acontece que até este momento ele não disse se avançou com a promessa e qual foi o valor da multa e quando é que entrou nos cofres do Estado. Isto porquê? Porque governar é pôr ordem nas coisas do Estado, por um lado, e por outro ,é responsabilizar o contrafator.

Quando é que o Abraão Vicente, que agora na pele de candidato da Câmara da Praia, anda a falar a favor das pessoas, dos empresários e de tudo o que é alma vivente, irá propor ao Estado o pagamento de uma indminização aos cabo-verdianos que têm acumulado prejuizos com a falta de transporte entre a ilhas do nosso país? É que, quem efetivamente está “Pelas Pessoas”, deve antes de tudo proteger as pessoas. Não o tendo feito quando estava sentado na cadeira do ministro, pode, todavia, fazê-lo agora, assumindo-se como o porta-voz deste povo martirizado e maltratado pela CV Interilhas. Nunca é tarde, sobretudo em se tratando de alguém que tem a sua rubrica em todas as páginas da desgovernação que este país está a assistir desde 2016, ano em que o MpD ascendeu ao poder. Abraão não encontrará melhor oportunidade de se retratar das incompetências deste governo, do que neste momento assumir uma posição clara em defesa de todas as vítimas dos infortúnios e das afrontas que Ulisses Correia e Silva e seu partido, MpD, andam a impingir a este povo. Sempre se diz que mais vale tarde do que nunca!

Terá Abraão “Korpu Rixu” suficiente para efetivamente se posicionar ao lado dos menos favorecidos? Vamos a ver! Uma coisa é, porém, certa: antes de prometer seja o que for, deve é prestar contas destes 8 anos que passou no pior governo que Cabo Verde já teve desde que se achou independente.

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SOBRE O AUTOR

Domingos Cardoso

Editor, jornalista, cronista, colunista de Santiago Magazine

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    Comentários

    • Francisco Carvalho, 9 de Ago de 2024

      Sim, é preciso prestar contas da governação! Não se pode andar de enganação em enganação! Cultura, industria criativa, transportes marítimos e pescas! O que foi feito? O que foi destruido? Hora de balanço e prestação de contas!