Ex-governador do Banco de Cabo Verde disse à Comissão Parlamentar de Inquérito ao Novo Banco que todos os rácios indicavam que a única saída era o encerramento do banco público.
A investigação parlamentar ao extinto Novo Banco continua a gerar declarações controversas. Depois do ex-administrador do NB, Carlos Moura, culpar os accionistas pela falência dessa extinta instituição financeira de capital público, foi a vez do ex-governador do Banco Central assumir que desde 2014 o NB deveria ter sido fechado porque não tinha condições para funcionar.
Carlos Burgo fez estas declarações na sexta-feira, 14, durante a audição na Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga a criação, funcionamento e encerramento, em Março, do único banco comercial de capital público que existia no país.
Ao ser questionado sobre se o NB era viável, Burgo respondeu que não, indicando que já em 2014, quatro anos após a criação do banco, todos os dados mostravam que a manutenção do Novo Banco era impraticável. O ex-governador, que foi ministro das Finanças no primeiro mandato de José Maria Neves, disse que o NB devia arrancar com um capital social de 700 mil contos, mas que só foram realizados 300 mil, dos quais 200 mil foram destinados a investimentos e os restantes 100 mil canalizados para despesas correntes num banco com salário de luxo para os gestores (mais de mil contos por mês) e que vieram a revelar-se insuportáveis para a tesouraria do banco.
Tendo começado logo no vermelho, explicou Carlos Burgo aos deputados, houve então necessidade de recapitalizar o banco em 2012. Só que, segundo o antigo governador do BCV – bateu com a porta precisamente em 2014, após desentendimentos com o Governo que acabaria por colocar João Serra, ainda em tratamento em Portugal, no seu lugar – os accionistas IFH e Caixa Económica de Cabo Verde recusaram, alegando não ter disponibilidade financeira para tal. Conta Burgo que o Tesouro, juntamente com o INPS, assumiram sozinhos as despesas aumento o capital do NB para 847 mil contos, o que fez o Estado virar accionista maioritário.
Mesmo assim, sublinhou o ex-governador do BCV, os rácios do Novo Banco continuaram a dar resultados negativos, sobretudo por causa dos salários dos gestores e outras despesas acrescidas. Entretanto, havia outro compromisso assumido pelos sócios no ano passado para nova recapitalização do banco, o que não chegou a ser feito, obrigando o BCV a adoptar uma medida de resolução que culmina com a extinção do Novo Banco sete anos após o seu nascimento.
Aliás, na semana passada, o ex-gestor do Novo Banco, Carlos Moura, referiu a esse aspecto na CPI, tendo na altura responsabilizado os accionistas pela falência do banco. Por sua vez, Atelano Fonseca, antigo PCA dos Correios de Cabo Verde, garantiu que o NB funcionava normalmente e que entrada dos Correios no capital do NB foi “transparente”. O ex-PCA da IFH, Paulo Soares, confessou que a empresa que dirigia não tinha na época dinheiro para entrar na sociedade e que, por pressão do próprio BCV, teve que ir contrair empréstimo de 75 mil contos juntos da CECV para poder fazer parte da estrutura accionista do NB.
A CPI que investiga os contornos da criação, em 2010, do Novo Banco e a sua falência e consequente extinção, em Março de 2017, já ouviu até agora os ex-PCAs do IFH, Paulo Soares, da CECV, Emanuel Miranda, dos Correios, Atelano Fonseca, os ex-gestores do NB, Carlos Moura, Marly Cruz e Péricles Silva.
Ao todo são 27 audições previstas pela CPI, liderada pelo deputado do PAICV, Manuel Inocêncio Sousa, para ajudar a esclarecer o que aconteceu com o Novo Banco, instituição financeira de capital público, que em Março deste ano viu o BCV anunciar a medida de resolução que consistiu na alienação parcial das suas actividades e da maior parte dos seus activos e passivos à Caixa Económica de Cabo Verde (CECV).
Eram accionistas do Novo Banco, o Estado de Cabo Verde que tinha uma participação de 42,33%, o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) com 28,28%, a com CECV com 11,76%, os Correios de Cabo Verde com 7,35%, a Imobiliária Fundiária e Habitat (IFH) com 7,35% e o Banco Português de Gestão com 2,94%.
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