Elas são mulheres adultas, chefes de família, da ilha do Maio. Viraram ferrenhas defensoras do ambiente, recolhendo as escórias nas ruas e nas praias para metamorfoseá-las em peças únicas de arte. Conheça os desafios socioeconómicos, o activismo na preservação da identidade cultural cabo-verdiana, e, ainda força do “SprituDjuntaMó”, do grupo ‘Bem di Djarmai’, da ilha do Maio, liderado pela espanhola Patricia Hernandez, que se dedica à reciclagem de lixo como forma de arte e de auto-rendimento.
Para elas a arte e o lixo se relacionam hoje como o compasso e o tempo. A arte pode virar lixo, assim como o lixo pode ganhar npva voda através da arte. Esta é a mantra do ‘Bem di Djarmai’, que nasceu de uma parceria com a Fundação Maio Biodiversidade (FMB), durante o período da pandemia. O propósito é a preservação da biodiversidade da ilha do Maio, e ao mesmo tempo busca a criatividade, ética, responsabilidade, sustentabilidade, empreendedorismo e o respeito pela identidade cultural.
A organização é fruto de um processo de luta social, uma forma de protesto: mobilizar, consciencializar, e acima de tudo, proteger a sustentabilidade ambiental, que está diretamente vinculada à reciclagem de resíduos que geramos diariamente. “A ideia surgiu durante a pandemia da Covid -19. Tínhamos um financiamento da Critical Partneship Ecosystem Fund (CPEF) para fazer um desfile de carnaval. Entretanto, como estávamos em pleno Lock-down e não podíamos fazer o carnaval então decidimos fazer uma formação de costura e reciclagem para as mulheres”, revela a bióloga espanhola Patrícia del Peso Hernández, que andou de porta em porta a recrutar interessadas.
O curso “Eu e a minha Mala: Empoderamento, Identidade Através de Reciclagem” (2022), como garante a bióloga e educadora ambiental Patrícia Hernández, que também é técnica florestal, guia de caminhadas ambientais e trabalha como técnica de equipa da Educação e DesenvolvimentoSustentável (EDS) da FMB, visava ensinar sobre os problemas e o impacto das embalagens de plásticos nos mares, e nos ecossistemas, e assim, contribuir com soluções para este problema através da costura e da reciclagem.
“Temos um problema grande e grave que são as embalagens de plásticos. A lista dos resíduos como os sacos de plásticos, sacos de arroz, redes de batatas e calças de ganga, entre outros têxteis. na sua maioria são queimados, mas o resto normalmente para nas ribeiras e no mar. Com todos estas matérias e através da costura do upciclyng criamos alternativas aos problemas e reduzimos os seus impactos nos ecossistemas. E queremos continuar com esta produção criativa e artesanal que pode gerar soluções ambientais e futuramente alguns rendimentos económicos”, salienta a nossa entrevistada que faz questão de lembrar que "em todo o mundo, quase uma quarta parte (22%) acaba em terrenos abertos, ou seja, na natureza".
"Estamos capacitando as mulheres que têm habilidades artísticas em noção de costura através de diversos cursos de formação. Eramos treze, mas agora surgiu um outro grupodentro do mesmogrupo e somos sete mulheres. Todas as nossas mulheres são chefes de família, com menores sob seus cuidados, mulheres de meia-idade e desempregadas, além de aposentadas, avós, mulheres com dificuldades de ingressar no mercado de trabalho. Ter este espaço permite-lhes conceber arte, costurar e reciclar lixo como empreendimento com retorno económico, além de comungarem o espaço como seu lugar de convivência. Ai tambem, é um local que acolhe as filhas e os filhos dos participantes", disse entre um sorriso de satisfação.
"E para apoiar a economia local criamospontoslocais de recolhas de plásticos, sacos e embalagens. As roupassãocompradasemdiferentespontoscomo forma de apoiar a economia local. As matériassãolavadas (voce sabia que para se produzirumacalça Jean usa-se cerca de 100 litros de água, todavia, para reciclagemapenas um litro) e preparadas para o processo de reciclagem", e, depoistornando-as emastoninshing (esplêndidas), soberbas e atrativosprodutos de arte. São purasobras de aptitud. Com esta ciência a ‘Bem di Djarmai’ desafia os nossos valores estéticos e artísticos, já que, os resultados não deixam ninguém indiferente."Maio é uma ilha que tem pouco produto artesanal por isso, pensamos que num artesanato com base na cultura e reciclagem podem ter um rendimento. Consideramos que o turismo pode ser uma boa via de entrada no mercado", aposta.
“Os cabo-verdianos precisam tomar a consciência sobre a poluição e o perigo que o plástico representa para o meio ambiente frágil como o nosso. A falta de respeito pela natureza, a falta da consciência, a ignorância já atingiu níveis alarmantes. É tão simples e óbvio que muitos não enxergam ou não percebem a gravidade do problema. Elas simplesmente não querem saber ou falar do problema ecológico”,lamenta Patrícia.
"É vital alfabetizar a população sobre a importância de proteger o ecossistema. É preciso também ter uma certa responsabilidade e vontade politica porque a população no fundo, não é a culpada de tudo. Sim, elanão é culpada. Daí, que e precisocriar um programa de alfabetização. Podia-se incluir nas escolas um curriculum educativofocadonaproblemática e gerência dos resíduossólido", propõe.
Para valorizar a identidade cultural cabo-verdiana essas mulheres do Maio criaram a marca Kriola. “Fizemos bolsas de senhora, carteiras, e mochilas a partir de ‘panu di terra’ e plásticos reutilizados. Depois de um tempo a escola António Cruz Lopes da Silva emprestou-nos o seu espaço para fazer os nossos trabalhos. Tínhamos também um financiamento do projeto Biotur que usamos para comprar uma máquina de costura entre outros materiais. Para ter-mos mais visibilidade começamos também a fazer e a participar nas feiras culturais de modo a gerar receita, valorizar e expor os nossos trabalhos. O objetivo é criar uma associação mas por enquanto funcionamos como uma cooperativa”, revela.
A seguir a formaçãoemcostura e reciclagem, emparceria com a Fundação Maio Biodiversidade&Sphera Mundi e o Programa Maio2025 “elas aprenderam técnicas de costura de bonecas e bonecos de trapo típicos de cultura cabo-verdiana e desmistificar que as bonecas dos povos africanos têm de ser negras, pois a gama de cores de pele dos cabo-verdianos e os africanos é muito diversificada”, esclarece.
Além da reciclagem pela arte e costura, as mulheres do ‘Bem di Djarmai’ confeccionam sabonetes de carvão vegetal, sal, óleo de purgueira, argila e aloe vera (babosa).
Em Novembro do ano passado, foram selecionadas para o projeto “Ilhas com Encantamento”, que é apoiado pela ProCultura, que é financiado pela União Europeia (UE) em Cabo Verde, e co-financiado e gerido pelo Instituto Camões, do qual receberam 3 mil euros.
Ainda, no mesmo ano, juntamente com o Programa Maio2025, que pertence também a UE, em parceria com três organizações, a Associação de Defesa do Património de Mértola, o Instituto Marques de Valle Flor, a FMB, e a Câmara Municipal do Maio, receberam um espaço para formação válido por dois anos, sem nenhum custo para com a eletricidade, água e renda.
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