Exibir dentes afiados não serviram para nada ao tubarão ante um adversário pastilha elástica – encolhia-se e estendia-se no relvado astutamente. E foi Cabo Verde a levar uma mordida de três pontos.
O jornalista da RTC, Benvindo Neves, avisara no facebook na noite de sábado: o Uganda e a CAF teriam passado a perna a Cabo Verde bem antes do apito inicial, com uma narrativa bem contada pelos dirigentes africanos de que o avião que trazia os Cranes à Praia a partir de Dakar tinha avariado, obrigando a que a partida fosse adiada para a tarde deste domingo, 11. Astúcia 1, se a suposta história falsa for supostamente verdadeira.
Sim, o Uganda enganou Cabo Verde, de facto. Mas dentro do campo. Poizeeee, era aqui, no relvado do estádio Nacional, em Monte Vaca, que se jogava poker numa imensa mesa verde. O mais cínico que levante o dedo! EUganda.
Os Cranes sabiam ao que vinham, conheciam o potencial de Cabo Verde, o forte apoio do público (!?) e os blá-blá todos. Tão simples como dois mais dois, foi vê-los escondendo-se, na primeira parte, atrás da linha da bola fingindo ser pera doce. Astúcia 2.
Os Tubarões Azuis, incautos sobretudo na segunda metade (biiing, spoiler alert!), agradeceram para, sedentos de sangue, iniciar o processo de abocanhamento da presa. Era bola para a direita, para a esquerda, por cima e invariavelmente pelo meio onde além do mato de pernas ugandeses que atrapalhava as investidas crioulas nos espaços que iam aparecendo, desapareciam os médios ofensivos em high heels a tentar mascar, num frenesi, pastilhas elásticas com dentes incisivos.
A maior posse de bola de Cabo Verde na etapa inicial (bem, acabou sendo durante todo o jogo) originou alguns bons ataques mas que não deram golos. Os Tubarões Azuis partiram para cima do adversário mas não causaram estragos nem ferimentos ainda que leves. Porque o Uganda decretou ser chewing gum e não carne, colava-se à parede, mas tão rápido esticava-se até à baliza de Vozinha. Ameaçava, também.
E como é que se masca pastilha elástica com dentes feitos para morder, cortar e imobilizar a presa? Não dá. Solução? Ora, basta mudar de estratégia: usar os molares, armando o jogo de trás para a frente, obrigando a presa a tirar a cabeça de fora e zás, o golpe fatal. O ataque continuado e atabalhoado (esse é o problema dos saltos altos em estradas calcetadas) urdido pelo seleccionador Lúcio Antunes esbarrava aí.
Cabo Verde demorou a perceber isso, como ficou evidente com a substituição operada no arranque da segunda parte com a entrada de Ryan Mendes e Heldon, descurando o meio-campo defensivo. Era aqui que o processo de transição falhava. Foi aqui que surgiu uma auto-estrada para os Cranes circularem a bola, enviarem para esquerda e devolverem ao meio da pequena área onde o veterano Geoffrey Sserenkuma apareceu para fazer história – marca pela segunda vez a Cabo Verde em três jogos já disputados entre os dois países. E pronto, 0-1.
Agora é sarar esta ferida de três pontos e molar os dentes para a próxima jornada que será fora de casa contra o Lesoto. O Uganda, lider do grupo L, irá então receber a Tanzânia que, a jogar em casa, não conseguiu mais do que um empate a 1-1 contra o país que faz de coração da África do Sul.
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