Eu estava ausente do país quando se discutiu e se aprovou o Orçamento Geral do Estado (OGE). Segui parte dessa discussão, na medida do possível, pela internet.
À mim não espanta os valores constantes de tal orçamento, independentemente das imensas promessas eleitorais, pois acreditou quem quis levianamente acreditar, porque todos já temos o dever de conhecer o país que temos, e venham as promessas de onde vierem, o que é verdade verdadeira é que não há onde ir buscar para se distribuir abundantemente e milagreiros não existem. Aliás não estávamos em 1991, para se acreditar piamentente num novo partido que queria o poder para fazer todo o mundo feliz. Nessa altura até se podia entender. Mas em 2016 já se conhecia o MpD e as suas habilidades demagógicas. Porém, dá para criticar sim o tratamento desigual das diversas regiões nesse mesmo orçamento, mas sobretudo as manobras, à moda da década de noventa, para favorecer a clientela do MpD, à custa de sacrifícios do surrado Povo destas ilhas.
Sim, porque este orçamento veio deixar bem claro que a preocupação dos homens do novel Poder é a farta alimentação dos abutres.
Cabo Verde não produz frutas para satisfazer o consumo em fresco, mormente para ser industrializado. Igualmente na produção de leite e seus derivados. E mais do que isso, não existem estímulos dos poderes públicos para aumentar a produção nacional desses bens tão importantes para a dieta alimentar e a preservação de uma boa saúde.
Mesmo assim não coíbiu o atual governo de fazer aparecer nesse famigerado orçamento a penalização da importação do leite e das frutas e seus derivados, em nome da proteção de uma indústria nacional, que de facto não existe, senão umas máquinas montadas por uma empresa onde Ulisses Correia e Silva foi buscar o atual vice-primeiro-ministro e ministro das finanças, esperando silenciosamente a penalização da importação dos produtos lácteos e de fruticultura na Lei do Orçamento do Estado, para lançar o seu negócio com esses produtos. Pois que, em matéria de produção de leite, não havendo uma produção nacional de meteria prima, só pode essa empresa importar esse produto e fazer simplesmente o seu empacotamento e colocar no mercado, ou obter a base e mistura-lo aqui, diminuindo drasticamente a sua qualidade, como aliás parece estar a acontecer e já foi denunciado.
No início da década de 90, pouco depois do MpD tomar o Poder, utilizando a sua maioria no Parlamento, fez o mesmo. Um familiar do então primeiro-ministro montou às pressas uma empresa, importou cimento e com o barco já no porto da Praia, foi aprovado a liberalização da importação do cimento, e do mesmo modo a do açúcar.
A empresa donde veio Olavo Correia preparou uma fábrica de mistura de leite em pó e embalagem de sumos e outros derivados, o governo preparou o agravamento dos direitos alfandegários sobre esses produtos, tratataram de embrulhar a oposição para partilhar o ónus político da medida, e marcharam para nos lixar enquanto consumidores e aumentarem a riqueza dos maiorais do MpD.
Não precisamos ser especialistas em produtos alimentares ou em controlo de qualidade para termos a ideia de que estamos sendo imposto um produto de baixa qualidade, enquanto se encarece extraordinariamente os produtos de qualidade, embora de primeira necessidade, retirando-os da boca dos que detêm menos posses e que são a maioria esmagadora, máxime as crianças, o que significa a promoção da má nutrição.
Curioso é que tudo isso acontece num ano em que a seca está dando cabo dos poucos animais que existem, maugrado as promessas do governo em rapidamente montar um programa de urgência para salvamento do gado e passados longos Cinco meses depois dessa promessa é ténue a existência desse programa, porque ineficaz e ineficiente, como vem sendo denunciado pelos próprios criadores, não faltando quem diga que os vales de 300$00 não são senão mera propaganda política, para passar a ideia de que o governo está ajudando os criadores.
Do ponto de vista pessoal, entristece-me mais do que tudo ainda saber que o maior partido de oposição - o meu PAICV - votou à favor dessa medida, o que representa, em nosso humilde entender, um “poema” à ingenuidade política do Grupo Parlamentar, salvo o devido respeito que tenho pelos nossos deputados. Grupo Parlamentar esse que deve ter a humildade de fazer pública mea-culpa, embora se saiba que o seu voto contra seria meramente simbólica, já que o MpD, com a sua maioria, aprovaria sempre essa medida, pois creio que não exigiria a maioria qualificada. Mas a política e sobretudo a oposicionista, faz-se também de simbolismos. Pois os cidadãos leem os símbolos e tiram ilações.
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