O Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca, termina o seu mandato com a promulgação de dezenas de diplomas, mas tem “algumas reservas” em relação a certos artigos do Acordo Militar (SOFA) assinado com os Estados Unidos de América.
Segundo uma fonte da Presidência da República, o Chefe de Estado cabo-verdiano manifestou, em alguns círculos de relação da sua amizade, que ainda hoje tem “algumas reservas” em relação a determinados artigos do SOFA que ractificou.
“Há acordos que ractifiquei e tenho algumas dúvidas se as devia ter ractificado”, apontou, Jorge Carlos Fonseca, numa recente entrevista/balanço dos dez anos do seu mandato, reconhecendo, porém que é “normal” isto acontecer para qualquer titular de um cargo político durante dez anos.
“Há sempre coisas que faríamos de modo diferente… a vida não se faz de ‘ses’. O que está feito está feito”, concluiu, a propósito.
Perguntado como gostaria que fosse recordado pelos cabo-verdianos, depois dos seus dois mandatos, disse que exerceu “verdadeiramente uma presidência junto das pessoas”, tendo contactado várias vezes os cabo-verdianos em todos os municípios do País.
Afirmou, ainda, que estimaria que os cabo-verdianos ligassem a sua presidência a valores, como o combate pela liberdade, pela cultura da Constituição e democracia, sobretudo.
À Brava, conforme revelou, foi 13 vezes e aponta esta ilha como o exemplo, tendo em conta que é a parte do território nacional que menos os políticos visitam.
Regozija-se de deixar a Presidência da República com “conforto e felicidade” pelo facto de a taxa mais baixa da avaliação ‘Muito Boa’ e ‘Boa’ do seu desempenho ser de 86,8 por cento (%).
Nos 46 anos da independência de Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca vai ficar na história como o único Chefe de Estado que não comutou penas e nem indultou nenhum presidiário.
Explicou que uma das razões da sua atitude tem a ver com o facto de os poucos pedidos de indultos [dois ou três em dez anos] que recebeu “não estavam devidamente bem instruídos”.
Uma outra explicação, segundo ele, tem a ver com a sua visão das chamadas medidas de graça, que o leva a ter “muita relutância” em relação à aplicação de medidas de comutação, indulto e mesmo das amnistas.
“O problema da justiça penal deve resolver-se através do procedimento normal da justiça penal”, concluiu.
Na hora de despedida, o Presidente da Republica, que cessa as funções a partir de hoje 09 de Novembro, deixou uma palavra de apreço aos profissionais de comunicação social, em particular os jornalistas com quem disse ter tido uma “boa relação”.
“O futuro da democracia em Cabo Verde depende muito de vocês [os jornalistas]. Que continuem a ter uma postura reivindicativa e crítica em relação aos poderes e evitar qualquer tipo de enfeudamento ao poder político, qualquer que seja”, destacou Jorge Carlos Fonseca, para quem a função dos jornalistas é “crucial e decisiva para a democracia”.
A menos de 24 horas de terminar o seu mandato, foi condecorado, pelo Presidente da República Portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa, com a medalha da Ordem de Camões, que é a mais recente ordem honorífica portuguesa, criada em Junho, e a primeira foi atribuída ao reaberto Museu da Língua Portuguesa de São Paulo, no Brasil.
Nascido na cidade de Mindelo, São Vicente, em Outubro de 1950, Jorge Carlos Fonseca completou o ensino primário e secundário em Cabo Verde. Lisboa foi o destino que se seguiu, onde terminou uma licenciatura em Direito e um mestrado em Ciências Jurídicas, ambos pela Faculdade de Direito de Lisboa.
Além do seu trajecto enquanto académico, Jorge Carlos Fonseca está intimamente ligado ao processo de independência de Cabo Verde. Militou desde os 17 anos nas estruturas clandestinas do PAIGC e participou na fundação do Movimento para a Democracia (MpD), por quem foi o primeiro Ministro dos Negócios Estrangeiros, entre 1991 e 1993. Durante esse período conseguiu que Cabo Verde fosse eleito para o Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Jorge Carlos Fonseca é também poeta, com dois livros publicados, ensaísta literário e cronista.
Candidatou-se à presidência de Cabo Verde em 2001 e novamente em 2011, desta feita com sucesso. Apoiado pelo MpD, foi eleito à segunda-volta com 54,16% dos votos. Em 2016 foi reeleito para um segundo mandato, numa única volta, alcançando 74% dos votos.
É casado e pai de três filhas.
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