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Aylin Pires. O basquetebol é para mim um estilo de vida
Entrevista

Aylin Pires. O basquetebol é para mim um estilo de vida

 

Aylin Pires, 29 anos, é uma das figuras de destaque do actual basquetebol feminino cabo-verdiano. Atleta e treinadora, a jovem, que é formada em Relações Internacionais e Diplomacia, actua em outras frentes de batalha, nomeadamente na promoção de acções de formação, buscando contribuir para a afirmação definitiva do basquetebol feminino em Cabo Verde.

Santiago Magazine - Aylin, estás a fazer a Formação de Treinadora, nível 2, e neste momento estagias na AmiBasket. O que te levou a tomar a decisão de fazer uma formação nesta área? 

Aylin Pires - Nunca pensei que seria treinadora de basquetebol, porque antes sentia que não tinha paciência para ensinar aos mais jovens. Mas depois percebi que as meninas precisam de uma referência, de alguém para lhes ensinar e incentivar a não abandonar o basquetebol. Além disso, se queremos ter selecções sub-16, sub-18, entre outros, e ir longe nas competições internacionais temos que apostar na formação dos nossos atletas e treinadores. 

Como sabes, há muitos treinadores de basquetebol em Cabo Verde, e não só, que não têm formação nesta área, e são bons no que fazem. No teu caso, o que a formação acrescentou ao teu trabalho de treinadora? 

A formação é importante, todos devam aderir. Aprendes sempre um pouco mais ou aprofundas os teus conhecimentos. Recentemente, por exemplo, estivemos com quatro treinadores que vieram de Portugal, que estão na modalidade há muitos anos e ensinaram-nos coisas novas e mostraram-nos como explorar mais e melhor coisas que já sabíamos como fazer. É claro que podemos treinar uma equipa sem ter formação. Mas, sem dúvida, a formação é sempre uma mais valia. 

Como está a ser experiência de treinar uma equipa feminina sub 18 quando, segundo estudo do INE, as mulheres/meninas dedicam 9 horas diárias ao trabalho doméstico (os homens cinco horas e meia), o que lhes deixa pouco tempo para se dedicarem a outras actividades, nomeadamente o desporto, e isso faz com muitas desistam? 

Esta é a terceira época que treino uma equipa feminina no Amibasket. A associação sempre teve meninas entre os seus atletas, mas sempre foram em menor número. Neste momento, felizmente, temos 18 atletas no escalão sub-18, o que é muito bom. É muito importante que sejam treinadas por uma mulher, isso incentiva-as a ir treinar, a não desistir, a crer que ser mulher não é um impedimento para a prática do basquetebol ou de qualquer outro desporto. E há outros incentivos para as meninas. A Bety Costa, por exemplo, que é uma referência para nós basquetebolistas cabo-verdianas, faz agora parte da equipa técnica da FCBB. Em São Vicente, a Dalila, também está a trabalhar bem. Outras atletas também estão a contribuir. Recentemente, um grupo de meninas que jogam nos Estados Unidos fez um clinicem Cabo Verde, o que ajudou bastante a motivar as atletas que jogam cá. Porque as suas referências não devem ser apenas as jogadoras da WNBA. Há atletas cabo-verdianas que jogam no estrangeiro e quando vêm ao país é possível aprender com elas. 

E tu sentes que já és uma referência para as atletas mais novas, nomeadamente as que treinas? 

Acho que sim. As meninas que eu treino dizem-me muitas vezes que querem ser como eu! Ora, eu quero que elas consigam ir mais longe do que eu fui, que façam mais do que já fiz. O basquetebol feminino está a viver um bom momento. Participamos no CPLP sub – 16 feminino, em São Tomé e Príncipe, a selecção sub-18 foi para o Afrobasket, temos campeonato sénior feminino. Acho que não vamos cair no marasmo outra vez. Com a ajuda de todas, tanto das que jogam como das que já não jogam, conseguiremos ir mais longe. 

Tens 29 anos agora. Quando e como começou a tua relação com o basquetebol?

Uma tia minha, que achava que eu era muito pequena em tamanho, incentivou-me a jogar basquetebol para poder crescer um pouco mais. Assim, joguei no ABC, dos 9 aos 18 anos, depois fui para as Canárias, onde joguei durante uma época. Entretanto, regressei a Cabo Verde, onde agora jogo e treino. Não penso parar tão cedo. O basquetebol é para mim um estilo de vida. 

E além de treinadora, és jogadora da Lady Rebels. Como está a ser esta nova experiência? 

Sim, agora jogo no Lady Rebels, é mais uma equipa para o campeonato feminino, o que é muito bom para a modalidade. 

Como avalias o campeonato actual? 

Bem, ainda não começou a competição (o presidente anunciou que vai começar dentro de duas semanas), três equipas já estão inscritas, e espero que também haja campeonato nas outras ilhas para podermos ter campeonato nacional, não só em seniores como também nos outros escalões, nomeadamente sub 18 e sub-18. Acredito que se fizermos campeonato em vários escolares, apostando sobretudo nos escalões de formação, teremos no futuro um campeonato sénior mais forte e teremos mais atletas para a selecção nacional. 

Além de treinares a equipa sub-18 feminino da AmiBasket e de jogares na Lady Rebels, estás envolvida também na promoção do basquetebol através da Associação Seeds of the Revolution. Fale-nos um pouco do vosso trabalho? 

A Associação foi criada em 2011 por Edmar Gomes, que é o nosso treinador sénior feminino. Todos os anos fazemos clinics para meninas dos 9 aos 18 anos, com Jade Leitão, que faz parte da selecção. Já fizemos clinics na Praia, no Sal e em S. Vicente. No ao passado não conseguimos fazer nenhum porque a Jade não conseguiu vir a Cabo Verde, além disso aconteceram várias competições e o tempo acabou por se tornar escasso para isso. A Seeds of the Revolutio também promove jogos 3x3, tanto femininos como masculinos para que os atletas estejam sempre a praticar basquetebol, evitando assim que esmoreçam e percam ânimo de jogar e desviem-se para caminhos menos saudáveis. 

Jogaste por duas épocas na equipa La Caja, nas Canárias, que é um arquipélago que, em termos de riquezas naturais, é quase como nós, mas é região autónoma de Espanha e, por isso, goza de vantagens em relação aos vizinhos cabo-verdianos da Macaronésia. O facto financeiro, pois é disso que estamos a falar, acaba por ser a principal diferença entre o campeonato das Canárias e o de Cabo Verde? 

Sim, o factor financeiro muda tudo. Para organizar qualquer competição, formação ou outra coisa qualquer precisamos de patrocínios, de empresas que acreditem nos projectos que fazemos. Sem patrocínios é complicado avançar com os projectos. Aqui em Cabo Verde só agora, finalmente, começa-se a acreditar no basquetebol feminino. A Direção Geral do Desporto (DGD) está sempre a ajudar, junto com o Ministério do Desporto. Mas nós também temos que criar bons projectos e fazer com que todos acreditem e apostem em nós. 

A Amibsket e a Seeds of Revolution, bem como outras que promovem o basquetebol em Cabo Verde, são entidades privadas. Mas isso também deve ser tarefa/missão das instituições públicas, nomeadamente do Ministério da Educação. Que avaliação faz da promoção do basquetebol a nível escolar? 

Felizmente, as escolas secundárias estão a realizar torneios inter-liceus, que são um meio importante para os atletas descobrirem se têm aptidão para o basquetebol e para se identificar atletas que podem ir para os clubes e disputar campeonatos regionais e nacionais. 

És formada em Relações Internacionais e Diplomacia, mas sei que ainda não exerces a profissão. Estás envolvida em outros negócios e na promoção do basquetebol. Gostaria de te dedicar exclusivamente à carreira de treinadora de basquetebol? É uma carreira viável em Cabo Verde’ 

Em Cabo Verde, tendo em conta que temos falta de meios financeiros, a carreira de treinadora de basquetebol não é viável. Sou treinadora por amor ao basquetebol. 

A ONU Mulher, o Comité Olímpico Cabo-Verdiano e várias atletas confirmam que a nível do desporto a política de igualdade e equidade do género ainda não faz escola, e há discriminação entre homens e mulheres, em termos de atribuição de condições financeiras ou outras. É esta a sua experiência? 

Sim, há discriminação. Mas se quisermos, podemos, todos juntos, acabar com a discriminação. Felizmente, com a nova equipa directiva da FCBB as coisas estão a mudar, tanto apostam no basquetebol masculino como no feminino, estão a dar as mesmas condições a todos. Mas em Cabo Verde muita gente pensa que o desporto é só ou quase só para rapazes e, por isso, apoiam mais os rapazes. Mas acredito que juntos podemos fazer mais, homens e mulheres. 

Quando teremos uma mulher a dirigir uma associação de basquetebol ou a FCBB? 

Basta uma mulher candidatar-se. Acredito que será uma forte candidata. Mas, na minha opinião, não importa se és homem ou mulher, importa que ames o basquetebol e, nesse caso, farás o melhor pelo basquetebol. 

Estarias disponível para uma candidatura a presidente da associação de basquetebol ou da FCBB? 

Não, não. Eu gosto é de estar dentro do campo, jogando ou treinando. Não gosto de trabalho de escritório. 

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SOBRE O AUTOR

Teresa Fortes