O emigrante cabo-verdiano nos Estados Unidos, Romão Barros, comprou o navio porta-contentores dado como perdido a favor do Estado de Cabo Verde após a maior apreensão de droga no arquipélago, conforme proposta de concurso público hoje aberta.
O concurso público foi lançado pelo Ministério das Finanças, através da Direção Geral do Património e da Contratação Pública (DGPCP), e a venda foi feita mediante apresentação de proposta fechada, com base de licitação de 70 milhões de escudos (635 mil euros).
O concurso contou com duas propostas, sendo uma excluída por identificação incorreta, e o emigrante cabo-verdiano nos Estados Unidos da América Romão Veiga Barros foi o vencedor, com uma proposta de 75,5 milhões de escudos (684 mil euros), rendendo ao Estado mais cerca de 50 mil euros do que a base de licitação.
Após a abertura da proposta no Ministério das Finanças, o adjudicatário tem 24 horas para fazer a transferência de 25% do valor, sob pena de anulação do concurso, e os restantes 75% serão pagos no prazo de 10 dias, conforme condições do concurso público.
Romão Veiga Barros, natural da ilha do Fogo, vive há muitos anos nos Estados Unidos da América, onde já foi empresário na aérea de navegação marítima, tendo sido armador, primeiro transportando cargas dos emigrantes em navio alugado e posteriormente do próprio.
Em declarações à agência Lusa, o seu representante no ato público, Jorge Alberto da Conceição Bettencourt, disse que o “sonho” deste emigrante é ligar os dois países, desenvolvendo o comércio e investir em Cabo Verde.
Por isso, depois de todos os restantes trâmites para readaptação, o barco vai ser colocado na rota Cabo Verde – Estados Unidos, numa operação que o vencedor espera ser concretizada “o mais rapidamente possível”, esperando para isso também contar com o apoio do Estado cabo-verdiano.
Construído na Alemanha em 1984, o navio cargueiro “Eser” encontra-se ancorado no porto da Praia desde 31 de janeiro de 2019, após ter sido apreendido com mais de 9,5 toneladas de cocaína em 260 fardos, navegando então com bandeira do Panamá.
A venda do navio pelo Estado cabo-verdiano acontece depois de o tribunal da Praia ter condenado, em 20 de fevereiro deste ano, a penas de 12 e 10 anos de prisão os 11 tripulantes russos daquele cargueiro, na sequência daquela que ainda é considerada a maior apreensão de cocaína em Cabo Verde.
Aquando da leitura do acórdão, a juíza presidente do coletivo que julgou este caso, sob fortes medidas de segurança, afirmou, para justificar a decisão, que os 11 arguidos em julgamento agiram em conjunto e de livre vontade, atuando como “correios de droga”, mas as penas foram graduadas face às funções de cada um no navio.
O comandante do navio cargueiro “Eser” foi condenado a 12 anos de prisão efetiva.
Os restantes 10 tripulantes, também pelo crime de tráfico de estupefacientes agravado, em coautoria material, foram condenados a 10 anos de prisão efetiva, enquanto o processo em relação a um outro tripulante russo, que também foi detido em janeiro de 2019, foi extinto, porque, entretanto, este morreu.
O comandante do navio seria o elo de ligação com os traficantes - o tribunal não deu como provado que os marinheiros integrassem a rede criminosa -, ao receber as comunicações via e-mail e ao ter feito o recrutamento dos restantes, “pese embora” os tripulantes, durante o julgamento, segundo o acórdão, “tentassem esconder” que tinham conhecimento dos estupefacientes que o navio transportava.
Conforme era pretensão do Ministério Público, o tribunal deu ainda como perdido a favor do Estado cabo-verdiano o navio cargueiro utilizado para o transporte da droga, com 100 metros de comprimento e peso total de 3.800 toneladas, que era então propriedade da empresa Ecolive Panamá, e do seu recheio.
Segundo o tribunal, o navio partiu do porto de Colón, no Panamá, apenas com os tripulantes russos e sem qualquer carga, em 04 de janeiro de 2019. O objetivo seria transportar carga do mar das Caraíbas para o porto de Tânger, em Marrocos, percurso que o tribunal também considerou como suspeito, por estar dentro das rotas internacionais de droga da América do Sul para o continente europeu.
A investigação das autoridades, em colaboração internacional, permitiu concluir, segundo o tribunal, que durante os 26 dias de viagem, até atracar no porto da Praia, o navio apresentou movimentos suspeitos, nomeadamente ao longo de 10 dias, ao largo da Colômbia, Venezuela e Aruba, com várias paragens em alto mar.
Para o tribunal, o transbordo da cocaína foi feito precisamente nesse período, tendo todos os tripulantes operado em conjunto no sentido de levar a "carga ilícita ao seu destino".
Foi a morte de outro dos tripulantes (13 no total), ainda em alto mar, que levou o navio a seguir para Cabo Verde, onde atracou em 31 de janeiro de 2019, na Praia, onde permanece ancorado desde então.
Após uma revista da Polícia Judiciária no dia seguinte, a droga, segundo o tribunal, foi encontrada dissimulada num compartimento que apenas se destina a dar estabilidade ao navio.
Oficialmente, o cargueiro fez uma escala no porto da Praia para cumprir os procedimentos legais relacionados com a morte de um dos tripulantes, mas a PJ afirmou na altura que já tinha informações que se tratava de uma embarcação suspeita.
A operação foi desenvolvida na sequência de um processo de instrução resultante da troca de informação operacional com o Maritime Analysis and Operations Centre - Narcotics (MAOC-N), com sede em Lisboa.
Com Lusa
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