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Zé Mário, um eterno Bulimundo
Colunista

Zé Mário, um eterno Bulimundo

A rotunda do paiol, mesmo à porta de seu umbigo, que faz cruzamento com os acessos ao cais da Praia, ao aeroporto e a fazenda, está pronta para acolher a estátua de Zé Mário e assim, eternizar sua momória, à mesma medida que Pedra Badejo soube honrar Katchas. De Tarrafal vai nosso abraço a todos que com Zé Mario crescemos e aprendemos a viver mais o funaná. E isso significa dizer, Cabo Verde.

Pena, não o tivemos no Santo Amaro passado com sua banda de peito, entretanto seu "kompasu pilon" se ouviu em Ponta de Atum e ecoou nos Mosteiros, furna e em lomba Tantum.

O conheci, era eu ainda menino, quando, as festas populares eram animadas com "bailes de conjunto" e a rapaziada vinha da Praia alegrar a festa em duas sessões - O baile da noite, com os mais graúdos, namorados e candidatos a noivos a se engarfunharem e transpirar de emoções; e o baile do dia da festa, com a criançada a querer espreitar, enquanto a policia vigiava os baixos e frágeis muros dos recintos polivalentes. Cabo Verde era muito pobre, contavamos ainda com menos de dez anos de independencia e tudo estava por fazer.

Os Bulimundo eram sempre os mais esperados na festa grande de Nhu Santo Amaro e os Abel Djassi por ocasião do Sagrado Coração de Jesus, São Pedro de Achada Monte e os Tubarões que como cantou Zezé, eram mais "select". Porém, animação era sempre garantida no "Di nós".

Zé Mário, se destacava pela sua voz aguda que com seus temas, TERRA BUFA e KOMPASU PILON, anunciava a abertura dos bailes populares, convidando os mais ousados a abrirem a sala, enquanto os recém chegados, se apreçavam para adquirir os bilhetes de entrada.

Quantos amores e quantas familias hoje disfrutam de seus lares e amizade para toda eternidade, tendo ao som dos Bulimundo e ninados com a voz do nosso Zé Mário, "siridjaron o bico", enquanto susuravam compromissos de terno querer ao pézinho do ouvido. Quantos namorados, se fizeram noivos e "trado di casa" sob influência do refrão em alto e bom som, evocado pelo timbre inconfundivel e singular do Zé Mário. E quantas aves poisaram suas asas levemente em seus ninhos a aquecer suas crias, enquanto Zé Mário entoava melodias que o vento levava para acalmar as marés e consolar os nossos homens nas diversas frentes que a nassa radio nacional na sua frequancia Caboverdiana conseguia chegar na missão de construir nossa Nação. Quantos campos e quantas enxadas entre pedras e suor, chuva e sol, acompanharam o agricultor, o pastor e a menina do campo que rumo à cidade ia em busca da educação, ao som do finasom de nha Bibinha que Zé Mário soube muito bem dar voz e fazer girar o mundo nos discos de vinil, encorajando a esperança do povo e semeando o porvir que hoje chegou.

No Tarrafal, alguns amigos o chamavam "Croif's", derivado de sua paixão pelo futebol e sua devoção pelo craque holandês Johan Cruijff, segundo nos conta, Zeca nha Reinalda, seu companheiro de banda e amigo.

Pelo menos quatro décadas se passaram, várias gerações se formaram, o pais se transformou, a musica se revolucionou e o homem se preparou para novas alargadas. Nesta caminhada, a Praia e sua ilha grande contou sempre com o filho de Paiol que deixou tudo para se dedicar à tradição e fazer do funaná sua marca, sua identidade e assim, escrever com sacrifício e permanência seu nome no memorável livro dos melhores filhos de nossa terra.

A rotunda do paiol, mesmo à porta de seu umbigo, que faz cruzamento com os acessos ao cais da Praia, ao aeroporto e a fazenda, está pronta para acolher a estátua de Zé Mário e assim, eternizar sua momória, à mesma medida que Pedra Badejo soube honrar Katchas.

De Tarrafal vai nosso abraço a todos que com Zé Mario crescemos e aprendemos a viver mais o funaná. E isso significa dizer, Cabo Verde.

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