1. Qual a razão para que tão poucas pessoas no mundo saibam que as três grandes cidades mundiais, Londres, Paris e Nova Iorque são governados por presidentes de câmaras filhos e netos de imigrantes? Ou, então, que Barack Obama e Donald Trump, os últimos dois presidentes da América, o chamado mais poderoso país do planeta, são também eles, filhos e netos de imigrantes? Sadiq Khan, filho de paquistaneses; Anne Hidalgo, filha de espanhóis; e, Bill de Blasio, neto de italianos, são os mais altos responsáveis pelas cidades capitais da Inglaterra, França e Estados Unidos!
2. Longe de discutir se são portadores de traços genéticos especiais ou se foram frutos dos hospitais onde nasceram, das escolas, liceus, clubes, ruas e universidades em que cresceram e por onde passaram, há um facto que é inegável em todos estes casos de governantes do topo do mundo: é a mobilidade que está associada à sua família. Quer dizer que todos eles têm nas suas vidas uma história que inclui a saída dos pais e avós de um país para outro em busca de uma vida melhor!
3. É esta a dimensão fundamental que importa reter nestes casos e na vitória da seleção francesa na "copa do mundo de 2018" - o mais recente episódio desta natureza - a marcar a história universal das relações humanas e entre países e lugares. Negar a existência deste facto indesmentível - ser filho de pelo menos um dos pais imigrante - é fazer eco das narrativas endemoniadas que servem de justificação para, precisamente, perpetuar o combate feroz à mobilidade, à circulação de pessoas, em última análise, à imigração, propriamente dita;
4. É que a partir do momento em que não houver mais demónios e fantasmas a associar à imigração, acaba o sucesso dos anúncios de construção de muros fronteiriços; desaparece um importante combustível para os partidos da extrema direita ganharem eleições com a promessa de acabar com a imigração nos seus países; e perde-se um "bode expiatório" para os problemas de desemprego com a acusação de imigrantes que roubam postos de trabalho e alimentam a criminalidade;
5. Por isso, é demasiado conveniente, todo esse esforço - ingénuo ou consciente - para retirar ao sucesso da seleção francesa a mais ínfima réstia de ligação a fenómenos associados à imigração. Há que expurgar a França!? Nem uma conotação positiva, por mais pequena que seja, à imigração? Vale tudo para que perdure para sempre a imagem de desgraça, desordens e fracasso impregnada nos imigrantes que chegam aos ricos países do Norte do mundo;
6. E qualquer tentativa simples, justa e realista de valorização do imigrante e da imigração é desviada e deturpada com a sua imediata colagem à tontice de se estar a defender "fronteiras abertas" num mundo onde a quase totalidade de países emissores de emigrantes estão estacionados a anos luz da valorização dos seus cidadãos que se espalharam pelos quatro cantos do mundo;
7. É este quadro de entendimentos e posicionamentos que impede a elaboração de uma nova abordagem mundial das migrações que seja realista e faça justiça ao contributo que os 244 milhões de migrantes têm dado ao mundo!
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