Hoje, celebra-se o Dia Internacional da Menina, uma data instituída pela ONU não apenas para celebrar o potencial infinito das nossas jovens, mas também para refletir sobre os desafios únicos que elas enfrentam e a urgência de criar um mundo mais justo e equitativo. Em Cabo Verde este dia serve como um convite para olharmos para o futuro e implementarmos políticas públicas corajosas que protejam as meninas de hoje e fortaleçam as mulheres de amanhã.
Contudo, a verdadeira celebração deve traduzir-se em ações. E uma ação concreta e inovadora recentemente veio a público: a proposta do Presidente da Câmara Municipal da Praia, Dr. Francisco Carvalho, para a introdução da licença menstrual para as funcionárias do município. Esta iniciativa, pioneira em Cabo Verde, merece ser aplaudida e seriamente considerada a nível nacional. Porém, para ser verdadeiramente eficaz, deve ser complementada com outras medidas, como, por exemplo, a distribuição gratuita de produtos de higiene menstrual nas estruturas de saúde públicas para meninas provenientes de famílias de baixa renda.
Esta dupla abordagem - licença menstrual e acesso gratuito a produtos de higiene - ataca o problema em duas frentes essenciais. Enquanto a licença reconhece e valida a dor física que muitas mulheres experienciam, a distribuição gratuita dos produtos de higiene enfrenta a chamada "pobreza menstrual" - a incapacidade de muitas meninas e mulheres de acederem a produtos básicos de higiene menstrual devido a constrangimentos financeiros. Nenhuma menina em Cabo Verde deve faltar à escola ou ver comprometido o seu desenvolvimento educacional por não ter condições de adquirir estes produtos essenciais.
Contudo, o apoio às mulheres cabo-verdianas não pode parar aí. É crucial que olhemos para outras esferas da vida onde as políticas públicas podem e devem fazer a diferença. A expansão da licença de maternidade é um desses pilares. Recorde-se que a última atualização, que passou a licença de maternidade de dois para três meses e introduziu 10 dias de licença para os pais, foi fruto de uma iniciativa nossa em 2016, através de uma petição pública que foi subscrita por 2500 pessoas. Contudo, é forçoso reconhecer que na altura faltou ousadia e ambição ao governo. Cabo Verde podia e devia ter almejado logo então os valores mínimos definidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que recomendam um mínimo de quatro meses de licença de maternidade. Um período mais longo e remunerado permite uma recuperação física e emocional mais robusta para a mãe, fortalece o vínculo fundamental com o bebé nos primeiros meses de vida - crucial para o desenvolvimento infantil - e incentiva a amamentação exclusiva, com todos os seus comprovados benefícios para a saúde. Esta não é uma medida que beneficia apenas a mulher; é um investimento de altíssimo retorno na saúde da próxima geração de cabo-verdianos.
Paralelamente, é imperativa o alargamento da licença de paternidade. Os atuais 10 dias, embora um começo, estão longe de ser suficientes. Esta medida permite que o pai participe ativamente dos cuidados parentais desde o primeiro dia, promovendo uma paternidade mais presente e responsável. Por outro, combate os estereótipos de género que sobrecarregam as mulheres com as tarefas domésticas e de cuidado. Quando os homens também tiram uma licença substancial, reduz-se o estigma profissional contra as mulheres em idade fértil e promove-se uma corresponsabilidade real no seio da família. Uma licença de paternidade robusta não é um presente para os homens; é um alicerce para a igualdade no mercado de trabalho e no lar.
A implementação destas políticas traria ganhos claros e multifacetados para a sociedade cabo-verdiana: em Saúde, através da melhoria da saúde mental e física para mães e bebés e do combate à pobreza menstrual entre as jovens; em termos económicos, com maior retenção de talento feminino, aumento da produtividade e redução do absentismo escolar e laboral; e em benefícios Sociais, promovendo famílias mais equilibradas, quebrando ciclos de desigualdade e acelerando a concretização da igualdade de género.
Celebrar o Dia Internacional da Menina é, portanto, mais do que proferir discursos. É ter a coragem de legislar para o seu futuro com políticas integradas que respondam às suas reais necessidades. Ao abraçarmos estas mudanças, estamos não apenas a honrar o potencial das nossas meninas, mas a semear as sementes de uma sociedade mais justa, solidária e verdadeiramente inclusiva. Que possamos construir, juntos, um amanhã onde nenhuma mulher fique para trás, onde cada menina possa crescer sem limitações e onde cada família tenha o apoio que merece. Para um verdadeiro CABO VERDE PARA TODOS.
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