“Di Povo pa Povo”: Descontentamento popular saiu à rua
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“Di Povo pa Povo”: Descontentamento popular saiu à rua

Praia, São Vicente, Boa Vista e Sal saíram à rua este sábado, com centenas de pessoas manifestando o seu descontentamento sob o lema “Gossi ké hora”. Condições básicas de via, segurança, energia, água, transportes interilhas, foram críticas recorrentes, a par de problemas locais. Segundo os organizadores, esta semana os protestos irão continuar envolvendo outras ilhas e a diáspora.

Praia e São Vicente foi onde o movimento “Di Povo pa Povo” conseguiu mobilizar mais pessoas, até por serem ilhas em que os protestos têm, por norma, mais adesão, traduzindo mais expressivamente a vontade cidadã.

Na Praia, onde se juntaram centenas de manifestantes, o músico Alberto Koenig, um dos organizadores da manifestação e porta-voz do movimento “Di Povo pa Povo”, justificou o protesto e as razões do descontentamento da população que saiu à rua sob o lema “Gossi ké hora” (Agora é hora).

“Não estamos a pedir luxo, estamos a pedir o mínimo, para que, quando quisermos ir até à nossa casa, o possamos fazer em segurança; para que, ao metermos a mão no interruptor, a luz acenda; para que, ao abrirmos a torneira, a água saia; e para que, quando precisarmos visitar familiares noutras ilhas, possamos fazê-lo de barco ou avião… Isso não é exigir muito, não é?”, questionou Koenig.

Com manifestações tendo por objetivo principal a união do povo cabo-verdiano, para além da Praia, o movimento levou à rua o descontentamento popular em São Vicente, Boa Vista e Sal.

“Democracia não se esgota no voto”

Ainda segundo Alberto Koenig, as razões dos protestos refletem falta de planeamento e de atenção por parte dos governantes, ressaltando que a democracia em Cabo Verde não se esgota no voto.

“Se a democracia é o poder do povo, não estamos a sentir isso. Nosso poder, atualmente, é o voto de quatro em quatro anos, de cinco em cinco anos. Tem muitas coisas que poderiam estar melhor. Mesmo em termos de voto, poderíamos ter mais referendos, para o povo dar a sua opinião sobre decisões importantes”, disse o porta-voz do movimento.

Defendendo que a participação cidadã deve ser contínua e comunitária, lembrando que cada pessoa representa a sua família, nas ruas e nas zonas, e que a ação coletiva é essencial para o progresso do país, Koenig fez um balanço positivo desta mobilização e apelou à união e à participação ativa de todos os cidadãos para que o país avance.

São Vicente: “Ouvir o povo”

No Mindelo, centenas de sanvicentinos também corresponderam à chamada do movimento “Di Povo pa Povo”, mostrando o seu descontentamento perante os poderes local e central e exigindo mudanças.

Bento Lima, coordenador do movimento em São Vicente, mostrou-se satisfeito com a adesão, lembrando que todas as ilhas estão a sofrer dos mesmos problemas.

“É um movimento para incentivar uma cidadania mais ativa, porque os governos e as câmaras trabalham para o povo e precisam ouvir o povo”, justificou Bento Lima, para quem os governantes devem cumprir o prometido ou, então, dar uma satisfação sobre o que está a ser feito.

O jovem coordenador do movimento disse ainda que, no seu caso, sentiu necessidade de mostrar “revolta”, ainda mais depois da tempestade Erin, em que foram anunciados “mundos e fundos”, mas que “ou isto não está a ser aplicado, ou então não estão a dar a conhecer o que está a ser feito”.

Referindo-se, ainda, ao caso específico da ilha do Monte Cara, Bento Lima afirmou haver “um problema grave de urbanismo, sem planos de gestão e com pensamentos somente a curto prazo”.

Boa Vista: “Poder na mão do povo”

Embora registando fraca adesão, o protesto saiu também à rua na ilha da Boa Vista, com o porta-voz local do movimento, Jailson Barros, a explicar a motivação principal da manifestação: a devolução do “poder na mão do povo”.

Relativamente aos problemas específicos da ilha, Barros criticou a gestão no setor do turismo, que é o motor económico da Boa Vista, defendendo a necessidade de uma mudança urgente para que os benefícios sejam estendidos também às “pessoas locais”.

Por sua vez, outros participantes na manifestação avançaram críticas com enfoque nas infraestruturas e nos serviços sociais, apontando falhas na saúde, educação, a ausência de estradas em condições, a falta de transporte e problemas no saneamento básico, como a recolha de resíduos sólidos.

Sal: “Não somos uma geração perdida”

Também com reduzida adesão, a manifestação na ilha do Sal teve como objectivo consciencializar a população sobre diversas questões sociais e, apesar da baixa participação, a organização sublinhou a importância do ato enquanto o dever cívico. Falando em nome dos participantes, Dalila Lopes realçou o caráter "Di Povo pa Povo" do movimento.

“É um movimento apartidário que visa a consciencialização do povo cabo-verdiano para as situações que temos vindo a viver, não só na ilha do Sal, mas em todo o país," disse a ativista à margem da manifestação que trouxe à tona várias preocupações específicas que afetam a vida dos salenses, como sejam o estado das estradas, a prostituição infantil, problemas na saúde e no fornecimento de eletricidade.

A activista fez questão de destacar que a iniciativa vai além da crítica, tendo uma forte componente pedagógica: "Queremos sempre lembrar a importância do dever cívico," disse Dalila Lopes, remetendo para o elevado número de abstenções nas últimas eleições.

"Queremos mostrar às pessoas o quão importante essa luta é, não apenas para criticar. É para ensinar também aos nossos filhos o quão importante é o dever de votar, o quão importante é não ficarmos calados”, sublinhou.

Apesar da fraca adesão, Dalila Lopes considerou a primeira manifestação na ilha um passo “importante”, reiterando o caráter construtivo do movimento: "Simplesmente queremos mais transparência e lembrar às pessoas que não somos uma geração perdida e que queremos dar o nosso contributo para a nossa terra".

Na semana que hoje se inicia, os protestos, segundo o movimento “Di Povo pa Povo”, irão continuar envolvendo outras ilhas e a diáspora cabo-verdiana.

C/Inforpress
Fotos: manifestação na Praia, cedidas por um participante

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SOBRE O AUTOR

Redação

    Comentários

    • Casimiro Centeio, 12 de Out de 2025

      Iniciativa plausível, mas muita gente ainda com MEDO ! MEDO !!!!! Esse grande FANTASMA que escraviza muita gente !!! Até quando essa gente se liberta dessa corrente invisível que a prende, tortura, escraviza até á alma ? " Um povo dominado pelo medo nunca se pode chamar- se de povo " - disse alguém.

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    • Fannon Bantu, 12 de Out de 2025

      Amanhã, concretamente, todos estes "revoluconários", a partir das 15h, esquecerão todos os problemas do país.

      Responder


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