Terceira carta aos Jovens. Não existimos para propaganda!
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Terceira carta aos Jovens. Não existimos para propaganda!

As ações devem suplantar as promessas, os discursos. A dureza dos dias recomenda solidariedade e respeito para connosco. Não basta bancar a “juventude do futuro” só para ganhar votos; a juventude é o presente, e muitos de nós estamos a viver num limbo: estudamos, trabalhamos (às vezes), mas nunca respiramos a liberdade prometida. Somos nós que investimos no país com nossas ideias, nossos sonhos, nosso suor e o que recebemos em troca muitas vezes são palavras bonitas, maquiadas de "amor", que se evaporam quando a campanha acaba. Por isso que eu digo aos meus colegas jovens: não caiam nas mesmas histórias. Não existimos para propaganda. Somos o motor deste país, a força estratégica para a mudança real, não aceitamos ser usados, aceitamos, sim, ser respeitados. Queremos políticas sérias, não anúncios eleitorais.

Como jovem cabo-verdiano, sinto no fundo do meu peito uma amargura que já não cabe em palavras vazias. Foram nove anos ouvindo promessas, discursos bonitos, “planos para a juventude” que no fim, são apenas retóricas de campanha. E agora, quando faltam poucos meses para renovar a confiança nas urnas, o senhor primeiro-ministro volta a acenar-nos com promessas de bolsas, habitação, empreendedorismo, como se estivesse a iniciar o mandato agora.

Mas eu sei bem qual é a verdade: a realidade da minha geração e da sua, senhor primeiro-ministro, não bate com as promessas que nos vendeu.

Os dados não mentem:

Ø  A taxa de desemprego entre os jovens (18-25 anos) está por volta de 28,17 % segundo dados recentes.

Ø  Mesmo com alguma melhora no emprego nacional, o INE reporta uma taxa de desemprego de 8,0% em 2024 e para nós, jovens, a dor continua. Muitos de nós não estamos apenas “desempregados”, mas fora de qualquer sistema de ensino ou formação: cerca de 25,7% dos jovens de 15 a 24 anos se encontram nessa situação.

Ø  Além disso, segundo o IMC 2023, a subutilização do trabalho e o trabalho que existe, mas que não sustenta dignamente, continua a pesar para os mais jovens.

Ø  A nossa população é maioritariamente jovem: segundo o INE, 16,3% dos cabo-verdianos têm entre 15 e 24 anos.

Mesmo que se anuncie mais moradia ou crédito com bonificação, grande parte de nós vive na informalidade, sem rede, sem segurança e muitos não vão sequer conseguir uma oportunidade para acessar a essas supostas “linhas preferenciais”.

Quando o senhor diz que vai oferecer mais 500 bolsas, ou que vai aumentar o acesso à habitação jovem, e eu me questiono: porquê só agora, tão perto das eleições? É que durante quase uma década não vimos essa sua ambição governamental, essa sua “enorme” preocupação pública com os jovens, transformada em políticas sólidas, duradoras e eficazes, quando tinha tempo e força para o fazer.

Não, senhor primeiro-ministro, o senhor já não tem tempo, nem forças para trabalhar por nós. Não trabalhou, quando há 9 anos atrás, subiu ao poder, onde jurou ter todas as contas feitas e que por isso mesmo teria solução para os problemas do país, como é que vai trabalhar agora, que está de saída, cansado, esgotado, e sem ideias?. Como?  

Prometer qualificação digital e cursos de línguas estrangeiras é bonito, mas muitos jovens já tentaram formar-se para depois bater de frente com a dura realidade de uma governação desnorteada: não há emprego decente, ou os empregos que aparecem são precários, mal pagos e instáveis. Diz que a economia cresceu, mas a vida das pessoas, sobretudo dos jovens piorou e a corrida para o exílio é hoje o maior drama social e familiar que este país já viveu desde a independência.

Prometer habitação com juro bonificado e “garantia pública de 15%” soa bem como discurso, mas para muitos jovens deslocados (que estudam fora da sua ilha de origem), a realidade é outra: num país insular e desigual, o custo de vida, o alojamento, os livros, a alimentação continuam a esmagar quem vem de longe, da periferia (uma palavra que afronta, insulta e agride o nosso povo).

O senhor fala numa “economia azul”, na agropecuária, no e-commerce, sim, ideias promissoras. Mas qual é a parte desse discurso já virou realidade concreta para jovens comuns que não têm contatos, nem influências nas instituições? Quantos negócios jovens prosperaram de verdade sem depender de favores políticos ou de indecifráveis mecanismos de “assistência técnica” escolhidos na cumplicidade dos gabinetes ministeriais?

E isto nos agride profundamente, senhor primeiro-ministro!

As ações devem suplantar as promessas, os discursos. A dureza dos dias recomenda solidariedade e respeito para connosco. Não basta bancar a “juventude do futuro” só para ganhar votos; a juventude é o presente, e muitos de nós estamos a viver num limbo: estudamos, trabalhamos (às vezes), mas nunca respiramos a liberdade prometida. Somos nós que investimos no país com nossas ideias, nossos sonhos, nosso suor e o que recebemos em troca muitas vezes são palavras bonitas, maquiadas de "amor", que se evaporam quando a campanha acaba.

Por isso que eu digo aos meus colegas jovens: não caiam nas mesmas "estórias". Não existimos para propaganda. Somos o motor deste país, a força estratégica para a mudança real, não aceitamos ser usados, aceitamos, sim, ser respeitados. Queremos políticas sérias, não anúncios eleitorais.

Se o senhor primeiro-ministro quiser realmente apoiar-nos, então que faça mais do que prometer:

Ø  transforme as bolsas em programas permanentes e estáveis;

Ø  garanta habitação acessível e sustentável para estudantes e jovens trabalhadores;

Ø  promova empregos dignos (não só “oportunidades”, mas caminhos) com remuneração justa;

Ø  invista em formações que de fato levem a uma carreira real, não cursos simbólicos para preencher o ego dos seus acólitos e gerir expetativas de uma camada que já perdeu esperança no futuro.

Eu, como jovem cabo-verdiano, recuso-me a aceitar mais promessas vazias! Eu exijo compromisso, transparência e resultados! E digo a todos os meus irmãos e irmãs jovens: não nos deixemos enganar de novo. A nossa voz é forte, a nossa esperança é real e o nosso futuro pertence a nós, não aos discursos de ocasião!

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