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Impugnação ao Orçamento da CMP 2023. STJ indefere pedido e considera recurso dos eleitos do MpD ilegítimo
Política

Impugnação ao Orçamento da CMP 2023. STJ indefere pedido e considera recurso dos eleitos do MpD ilegítimo

O Supremo Tribunal de Justiça indeferiu o recurso dos vereadores e deputados municipais do MpD que pediram a suspensão e a nulidade imediata da deliberação da Assembleia Municipal da Praia que aprovou o Orçamento e o Plano de Actividades da Câmara Municipal para 2023 sem que estes instrumentos tivessem sido discutidos antes entre todos os vereadores. O STJ alega no seu acórdão que os eleitos do MpD não têm legitimidade para apresentar tal recurso e o juiz-conselheiro Anildo Martins, na sua declaração de voto, vai mais esclarecendo que, para além da ilegitimidade, o próprio pedido para a anulação do Plano de Actvidades é “Irrecorrível”.

O recurso dos vereadores e deputados municipais do MpD no concelho da Praia contestava a aprovação em Novembro do ano passado do Orçamento e o Plano de Actividades da Câmara Municipal para 2023, no valor de 3 milhões de contos (3.050.308.781$00). Estes dois instrumentos de gestão da autarquia praiense foram apreciados e aprovados pela Assembleia Municipal com 11 votos a favor da bancada do PAICV e 10 contra dos deputados do MpD.

Descontentes, os vereadores Manuel Vasconcelos  Fernandes, Maria aleluia barbosa Andrade, José Eduardo Santos e Ednalva Cardoso e os dez deputados do MpD na assembleia municipal da Praia, solicitaram então ao Supremo Tribunal de Justiça a suspensão imediata da execução da deliberação da AMP que aprovou o plano de activdades para o ano económico 2023 e o orçamento municipal para 2023, alegando que esses instrumentos de gestão foram ”aprovados sem a competente prévia aprovação por parte da Câmara Municipal”, considerando, por isso, ser nula.

A queixa sustenta a sua acção na alínea b) do nº 1 do artigo 149º do estatuto dos Municípios, sublinhando que sem a maioria legal exigível, “e por não corresponder em absoluto à forma legal” a apresentação desses dossiers à A votação na AM “está ferida de nulidade” e “feridos de nulidade os actos administrativos subsequentes e que se fundaram no acto nulo, v.g. a deliberação da Assembleia que aprovou tal orçamento e plano de actvidade”.

Os eleitos do MpD no município da Praia destacaram ainda que “esse orçamento encontra-se rubricado apenas pelo sr. Presidente da CMP, Francisco Carvalho, e mais três vereadores, quando, de acordo com o artigo 121º da Constituição da República, os órgãos colegiais, como é o caso da Câmara Municipal, apenas podem funcionar com a presença de pelo menos 1/3 dos seus membros. Sendo a CMP constituída pelo seu Presidente e mais nove vereadores, vê-se claramente que tal preceito constitucional não foi respeitado”, acrescentando que a “realização de despesas pelo presidente da CMP suportadas num orçamento dessa envergadura representará um prejuízo irreparável ao Município e a devolução de tal verba aos cofres municipais pelo sr. Presidente da CMP, enquanto responsável máximo será praticamente impossível de se efectivar”.

No seu Acórdão nº 30/STJ/2023, de 15 de Maio, que Santiago Magazine teve acesso, o Supremo Tribunal de Justiça antes mesmo de entrar na matéria para a qual foi solicitada a intervir começa logo por analisar e verificar os pressupostos processuais. Ou seja, o STJ tratou logo de avaliar se assiste aos recorrentes legitimidade para interpor esse recurso contencioso.

Fundamentação do Supremo

Na sua fundamentação, o STJ (tendo Arlindo Medina como relator e aprovação dos juízes-conselheiros Benfeito Mosso Ramos e Anildo Martins) esclarece para o caso do pedido de anulação das deliberações da Assembleia Municipal que aprovaram os orçamento e plano de actividades municipais para 2023 “a legitimidade para a interposição de recurso contencioso se ocupa, em primeira linha, o artigo 15º do decreto-lei nº 14-A/83, de 22 de Março, que no seu nº 1 estabelece que a ‘legitimidade para recorrer’ é atribuída a) ‘aos titulares do interesse directo, pessoal e legítimo no provimento do recurso’; b) ao ‘Ministério Público’; e à ‘Administração, autora de algum acto que não possa revogar’”.

É aqui que s juízes-conselheiros seguram para sustentar a ilegitimidade da acção judicial dos vereadores e deputados municipais do MpD. “É, como efeito, na qualidade de eleitos municipais – deputados municipais ou vereadores – que eles se apresentam a recorrer. Mas a qualidade de eleitos municipais não os legitima a interpor o recurso contencioso com a configuração apresentada nos autos. Não à luz da norma da alínea a) do nº1 do artigo 15º do decreto-lei nº14-A/83”, diz o Acórdão do STJ, que, acrescenta a seguinte observação: “Outra coisa será a legitimidade processual para impugnar decisões (destacáveis do procedimento) lesivas de direitos estatutários dos membros dos órgãos – para as quais a alínea a) no nº1 do artigo 15º do decreto-lei nº 14-A/83 parece constituir base necessária”.

E continua: “só com fundamento em previsão normativa especial pode um órgão administrativo de uma determinada pessoa coletiva pública impugnar acto praticado por outro órgão da mesma pessoa coletiva e, do mesmo modo, só com fundamento em previsão normativa especial podem membros de órgãos administrativos impugnar decisões dos respectivos órgãos. No caso, coo se vu os deputados municipais e os vereadores requerem a intervenção judicial, não em tutela de uma posição substantiva sua, mas com vista à tutela da legalidade administrativa. Como também já se disse, tal não é possível. Na forma de ‘acção pública’, a legitimidade é genericamente conferida ao Ministério Público, fiscal privilegiado da legalidade, e em casos muito específicos, de que se deixou brevíssima menção, a órgãos e entes administrativos”.

Os juízes-conselheiros admitem, em última instância, que os vereadores e deputados do MpD poderiam apresentar o recurso por via da ‘acção popular local’ contra os órgãos que integram, prevista no Estatuto dos Municípios. “Mas (…) a questão que se coloca é a de se saber se o membro de um órgão colegial pode despir a veste de ‘eleito’ e, vestindo a pele de ‘eleitor’ lançar mão de uma ‘acção popular correctiva’ contra os actos do próprio órgão que integra”.

“Ademais, dizer que os recorrentes se apresentam a recorrer como ‘autores populares’ seria puro artificialismo, pois que fundam a sua legitimidade na qualidade de membros do órgão deliberativo ou do órgão executivo colegial do município. E, como se disse, a legitimidade afere-se pela configuração dada ao recurso”, remata o STJ, antes de declarar “que se conclui inelutavelmente pela ilegitimidade dos recorrentes.”.

Declaração de voto

O juiz-conselheiro Anildo subscreveu inteiramente o texto do juiz-relator, Arlindo Medina, mas fez questão de partilhar a seguinte observação contra o pedido dos eleitos do MpD na Praia na sua Declaração de voto.

“Atendendo que a que’in casu’ huve acumulação de duas impugnações, nos termos do disposto no artigo 21º, nº5, do DL 14-A/83, de um lado, da aprovação do orçamento municipal, e do outro da aprovação do plano de actvidades, consideraria em separado as duas impugnações”.

No caso do orçamento municipal, Martins considera que o texto do Acórdão está conforme, isto é, a petição é improcedente dada a ilegitimidade dos recorrentes. Mas no caso do Plano de Actividades, o juiz-conselheiro entende que o Acórdão deveria afirmar, em separado, que o mesmo não é contenciosamente recorrível, quer dizer, sequer dá direito a um recurso contencioso. “Considerando que o requisito da recorribilidade contenciosa, emquanto pressuposto processual, precede a apreciação da legitimidade, indeferiria liminarmente a pi. nos termos seguintes: quanto ao plano de actividades dada a sua irrecorribilidade contenciosa; quanto ao orçamento dada a ilegitimidade dos recorrenes”

 

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SOBRE O AUTOR

Hermínio Silves

Jornalista, repórter, diretor de Santiago Magazine