A defesa de Alex Saab, considerado pelos Estados Unidos testa-de-ferro de Nicolás Maduro, escreveu ao Presidente cabo-verdiano pedindo a sua libertação, afirmando que Cabo Verde está a afastar-se de África com as decisões sobre este caso.
A posição consta de uma carta conjunta assinada por quatro advogados de defesa, incluindo o juiz espanhol Baltasar Garzón, daquele empresário colombiano, detido em Cabo Verde desde junho e que a Venezuela afirma ter imunidade diplomática por ser seu “Enviado Especial”, a qual foi entregue hoje na Presidência da República, dirigida a Jorge Carlos Fonseca.
“Com todo o respeito, pedimos a V. Exa. que tenha em devida consideração as consequências do desafio contínuo de Cabo Verde face à União Africana e à CEDEAO [Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental]. A detenção de Alex Saab é ilegal, pelo que ele deve ser imediatamente libertado para retomar as suas funções diplomáticas. Em nome da Justiça, exortamo-lo mais uma vez: liberte Alex Saab”, lê-se na missiva dirigida ao chefe de Estado.
Alex Saab, de 49 anos, foi detido em 12 de junho pela Interpol e pelas autoridades cabo-verdianas, durante uma escala técnica no Aeroporto Internacional Amílcar Cabral, na ilha do Sal, ao regressar do Irão, com base num mandado de captura internacional emitido pelos Estados Unidos da América (EUA).
Segunda a defesa, tinha imunidade diplomática quando foi detido, posição reiterada pelo Governo da Venezuela, liderado por Nicolás Maduro.
Na missiva de hoje, a defesa informa o chefe de Estado que além dessa condição, Alex Saab foi ainda nomeado, em 24 de dezembro de 2020, como representante permanente suplente da República Bolivariana da Venezuela na União Africana (UA).
“A nomeação representa uma continuação ininterrupta de Alex Saab como pessoa internacionalmente protegida, com direito à imunidade e inviolabilidade”, afirma a defesa.
Nesta carta, os advogados de defesa recordam a Jorge Carlos Fonseca que Alex Saab “exercia funções oficiais como Enviado Especial da Venezuela quando foi ilegalmente detido e preso em Cabo Verde”.
“Posteriormente, apesar de informado do seu estatuto, bem como de ter visto a correspondência que Saab transportava para o Irão, Cabo Verde interferiu conscientemente nos assuntos da Venezuela. Trata-se de um facto incontestável, e nenhuma dissimulação oficial o tornará menos verdadeiro. Alex Saab tinha então, e tem agora, direito à proteção de séculos de direito internacional que regulamentam a conduta da diplomacia e a liberdade dos diplomatas de desempenhar as suas funções sem prisão ou detenção”, acusam.
Para os advogados, esta nomeação para a UA “reforça” o seu estatuto: “No momento em que se adquire o estatuto diplomático, não pode estar sujeito a qualquer tipo de investigação, acusação ou extradição”.
A carta enviada ao Presidente cabo-verdiano surge numa altura em que a defesa de Alex Saab tem mais dois dias (até 09 de janeiro) para apresentar o anunciado recurso para o Supremo Tribunal de Justiça da decisão de 04 de janeiro, do Tribunal da Relação do Barlavento, favorável à extradição de Alex Saab para os EUA.
A defesa acusa ainda o Estado cabo-verdiano de não cumprir “responsabilidades ao abrigo do direito internacional”, esperando “que a União Africana dê o exemplo correto”.
“De igual modo, continuaremos a recorrer ao Tribunal de Justiça da Comunidade da CEDEAO, que, como sabem, ordenou a Cabo Verde, numa decisão unânime e vinculativa, que colocasse imediatamente o senhor Saab sob prisão domiciliária supervisionada por razões de saúde. Os esforços de Cabo Verde em negar a jurisdição do Tribunal representam uma nova violação do direito internacional”, acusam, a propósito da decisão daquele órgão judicial regional, de dezembro.
A defesa de Alex Saab vai mais longe e escreve ao Presidente cabo-verdiano afirmando que o país, como Estado-membro da UA e da CEDEAO, “está a seguir um caminho sem precedentes e prejudicial em parceria com um Estado que já incentivou os Estados da África Ocidental a aderirem aos direitos humanos e à jurisdição do Tribunal da CEDEAO”.
“Com efeito, o Departamento de Estado dos EUA considera a subscrição da jurisdição do Tribunal da CEDEAO como indicador positivo da adesão dos países da África Ocidental ao Estado de direito e aos direitos humanos”, acrescentam.
Daí que a defesa questione se Cabo Verde, que “passou décadas a construir uma fachada como bastião da democracia e do Estado de direito, pretende mesmo destruir esta reputação” e que, posicionando-se "à parte”, demonstra que “parece um Estado falhado no referente à Justiça”.
“As ações de Cabo Verde ao longo dos últimos meses criaram uma impressão distinta de que pretende afastar-se da África. De facto, parece que se consegue esse resultado ao mostrar-se ao mundo que o Estado de Direito em Cabo Verde é pior do que em muitos Estados membros da União Africana e da CEDEAO. Esses membros têm a decência de respeito pelo direito internacional e pelas decisões do Tribunal de Justiça da CEDEAO”, apontam.
Neste processo, os EUA, que pedem a extradição do colombiano, acusam Alex Saab de ter branqueado 350 milhões de dólares (295 milhões de euros) para pagar atos de corrupção do Presidente venezuelano, Nicolás Maduro, através do sistema financeiro norte-americano.
Com Lusa
Comentários