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A fantasia da Regionalização
Colunista

A fantasia da Regionalização

1. É com respeito por todas as opiniões e abordagens que considero, para mim, que não existe a menor dúvida: neste momento, em matéria de regionalização, a única proposta séria que faz sentido discutir, é aquela que tem como meta uma tomada de decisão sobre quais os municípios que devem ser extintos – pura e simplesmente – através da sua integração numa outra câmara municipal. Aposto que – se tivessem a oportunidade de escolher – as populações de certas autarquias do país – optariam pelo fecho das suas câmaras municipais, desde que se lhes fosse apresentada a garantia da aplicação direta, no seu próprio município, do total desses recursos que hoje são gastos com os salários dos vereadores e do presidente, combustível, ajudas de custo, comunicações, etc. Verificando-se que em troca, há até municípios que arrecadam apenas 4% de receitas e, a maioria, transforma as câmaras municipais em agências de emprego!

2. É evidente que extinguir municípios é uma medida que exige uma imensa coragem! Neste caso, a exigência seria de "dar o dito por não dito" e assumir, publicamente, que se esteve a mentir - com vulgar descaramento - durante os últimos anos e, repetidamente, ao longo de toda a época de campanha eleitoral;

3. Contudo, é preciso reconhecer que esta falta de coragem não é de hoje. Vem de trás. Faltou coragem e frontalidade à governação do PAICV nestes últimos anos para dizer aos cabo-verdianos que não faz sentido nenhum pensar a regionalização de Cabo Verde nos tempos de hoje, nesta atual fase do mundo. Pecou pela ambiguidade com que tratou a questão;

4. Já o mesmo não se pode dizer do atual governo e do partido que o sustenta que é apanhado e encurralado entre dois factos. Em primeiro lugar, por ter andado a dizer aos quatro ventos que tinha uma proposta de regionalização para ser implementada logo no primeiro ano de governação, caso vencesse as eleições – proposta que agora foi divulgada, sendo um fiasco de ideia porque foge à questão dos custos, sempre fulcral num país pobre como o nosso, e, afinal, já não destaca o projeto piloto para São Vicente! Em segundo lugar, por estar manietado em relação a qualquer medida que passe pela redução do atual número de câmaras municipais. Pois, representaria a confissão de que, de facto, andaram a brincar ao marketing político com total desrespeito para com o eleitor cabo-verdiano e, pior ainda, diminuir o número de câmaras municipais, significaria o reconhecimento público do enorme fracasso que terão sido estes 26 anos de poder local em Cabo Verde;

5. O momento é de avaliação do que tem sido o municipalismo no nosso país. Avaliar sem o fantasma do "meio pequeno onde toda a gente se conhece"! Uma avaliação que não se compagina com nenhuma tentativa de fuga para a frente! Sendo que, mesmo sem querer antecipar o que seriam os resultados dessa avaliação, afigura-se-nos que a criação de regiões seria uma espécie de elevação desta enorme mediania reinante hoje ao nível das câmaras municipais até à categoria de regiões, pois, são os atuais autarcas quem seriam os "candidatos naturais" aos órgãos regionais – basta olharmos quantos presidentes de câmara anteriores que passaram "naturalmente" para deputado nacional, embaixador, etc;

6. O caminho deve ser outro: reforço do poder local, sim, mas com a devida correção de falhas identificadas. Mais do que tudo isso é urgente que se vá ao fundo da questão: a educação política do cidadão. Para que possa ter capacidade de avaliar a fundo as propostas políticas e perceber tanto o seu grau de possibilidade de concretização, como o impacto que têm na sua vida e na sociedade em geral. Afinal, um instrumento para avaliar as diferentes abordagens da própria regionalização.

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SOBRE O AUTOR

Francisco Carvalho

Político, sociólogo, pesquisador em migrações, colunista de Santiago Magazine