Corre entre nós um grande “sururu” à volta do casamento entre pessoas do mesmo sexo. O homossexualismo foi sempre um assunto tabu em Cabo Verde. Todavia, nos últimos dias, a conversa tornou-se mais aberta sobre esta questão, que tem estado de algum modo a mexer com a sociedade cabo-verdiana.
Com efeito, nos últimos dias as conversas aumentaram de volume, com um evento organizado pelos LGBTs, onde, entre muitas queixas e reivindicações, também se aventou reclamações sobre direitos ao casamento homossexual, alastrando-se exponencialmente para o espaço público com o impulso dado pelo deputado e secretário-geral do MpD, Miguel Monteiro, ao publicar um post na sua página do facebook, onde declarou ser 200 por cento contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Como base para sustentar a sua posição, Monteiro usou a Bíblia Sagrada.
Não é preciso dizer que caíram o Carmo e a Trindade sobre este jovem político, com acusações de que desconhece a Constituição da República, sendo Cabo Verde um Estado Laico, entre outros mimos próprios de sociedades hipócritas e alienadas.
Ora, uma breve visita ao Google, serviu para se entender que o Estado Laico significa um país ou nação com uma posição neutra no campo religioso. Também conhecido como Estado Secular, o Estado Laico tem como princípio a imparcialidade em assuntos religiosos, não apoiando ou discriminando nenhuma religião.
Um Estado Laico defende a liberdade religiosa a todos os seus cidadãos e não permite a interferência de correntes religiosas em matérias sociopolíticas e culturais. Um país laico é aquele que segue o caminho do laicismo, uma doutrina que defende que a religião não deve ter influência nos assuntos do Estado. O laicismo foi responsável pela separação entre a Igreja e o Estado e ganhou força com a Revolução Francesa.
Muito bem! Do que acima fica registado, o Miguel Monteiro poderá ter cometido o erro de basear os seus argumentos apenas em ensinamentos bíblicos. E, assim de chofre e por entrelinhas, fica-se com a sensação de que ele foi ligeiro na sua explanação e nos seus argumentos.
No entanto, estes “sururus” todos exigem respostas para questões básicas como estas: i) Os LGBTs são minorias ou maiorias entre nós? Se são minorias entre nós, a última palavra ficará por conta de quem? Da maioria ou da minoria? Porque, as decisões sobre esta questão têm que ser tomadas em meio a posições antagónicas violentas, uma vez que jamais serão consensuais. ii) É o Estado que existe para as famílias ou as famílias é que existem para o Estado? Se for o primeiro caso, então o Estado deve submeter-se à vontade das famílias ou estas é que devem submeter-se aos caprichos do Estado? iii) A família é anterior ao Estado ou o Estado é anterior à família? Se o primeiro caso for verdadeiro, certamente nenhum Estado poderá ou sequer terá forças para funcionar e tão pouco decidir em contramão da família. iv) Autorizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo é uma medida a ser tomada pelo Estado ou pelas religiões? Se for pelo Estado, então o que é que as religiões têm a ver com isso? v) Qual é a religião existente em Cabo Verde que defende o casamento entre pessoas do mesmo sexo? Caso não exista nenhuma religião em Cabo Verde a defender casamento entre pessoas do mesmo sexo, então a laicidade do Estado não deve ser para aqui chamada, porque nenhuma religião estará sendo privilegiada em detrimento da outra.
Em que ficamos, então? Devemos ficar com um Estado que toma decisões que vinculem as famílias, que o dão forma, conteúdo e valor, ou um Estado que decide ao sabor do vento, dos momentos e das circunstâncias. Um Estado que decide com base na opinião da maioria ou da minoria?
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