
No passado dia 15 de Outubro de 2025, completaram-se 10 anos da instalação do Tribunal Constitucional, em Cabo Verde. Desde sempre, muitas foram as vozes autorizadas que se manifestaram contra essa iniciativa, preferindo, antes, defender que muito mais proveitoso e higiénico para o sistema judicial cabo-verdiano seria a operacionalização dos Serviços de Inspecção Judicial e do Ministério Público que nunca funcionou devidamente, apesar da indesmentível falta que deixa ao sector da Justiça, alvo, amiúde, de permanentes denúncias de prevaricação de magistrados, suspeitas de inserção de falsidades nos processos, alegada denegação de justiça e fraudes processuais na barba cara de inertes inspectores.
Na altura, os defensores da ideia de criação de um Tribunal Constituicional alegavam que Cabo Verde precisava de um órgão “Guardião da nossa Constituição e dos Direitos, Liberdades e Garantias Fundamentais dos cidadãos”, na medida em que os Juízes do Supremo Tribunal, por si sós, sem uma instância Constitucional, nunca iriam defender a Constituição como seria necessário.
Uma década depois, o que temos? Sim, é verdade, há um antes e um depois do TC. Para o bem e para o mal. Se as virtudes e valências do TC, reconhecidas e exibidas pelas entidades oficiais com pompa, são grosso modo aceitáveis, é mister igualmente repudiar de forma frontal o mesmo TC quando paradoxalmente pisa a Constituição que deve defender a qualquer custo. Justifica-se esta ousada abordagem por causa do silêncio sepulcral de todos, do Parlamento ao Presidente da República, diante de situações gritantes cometidas pelo TC, contra a própria jurisprudência por si criada, a ponto de pôr em causa a liberdade do cidadão, fazer desacreditar na justiça plena.
Do lado dos Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, o balanço já foi feito e apresentado ao público através de uma entrevista concedida pelo seu Presidente, José Pina Delgado, ao jornal “Expresso das Ilhas”, do passado dia 20 de Outubro.
Só que, analisando as opiniões de quatro juristas, nomeadamente, Germano Almeida, Daniel Carvalho, José António dos Reis e o Professor Doutor Jorge Bacelar Gouveia, infelizmente, o balanço não resulta tão positivo como proclamado pelo Presidente da “Corte Constitucional”, José Pina Delgado, havendo denúncias de actos de subversão constitucional, prevaricação de magistrados, e até de “invencionismos pseudo-jurídicos” perpetuados e vertidos nas decisões prolatadas pelo Tribunal Constitucional.
O jornal Santiago Magazine decidiu republicar alguns artigos de opinião que já tinham sido dados à estampa, como também publicar alguns excertos de um Parecer Jurídico da autoria do Professor Doutor Jorge Bacelar Gouveia, num total de 6 artigos, que ajudam a elucidar a gravidade do problema.
Daí que, para que a História não seja contada somente pelos “Vencedores”, ou somente pelas “Entidades Oficiais”, durante o mês de Novembro e Dezembro deste corrente ano de 2025, este jornal tenciona dar destaque aos vários posicionamentos já assumidos por reputadas figuras públicas do nosso meio jurídico, referente ao desempenho do Tribunal Constitucional que alguns analistas já tiveram a ousadia de apelidar de Tribunal (In)Constitucional.
Esta série de artigos terá início com uma visita ao pensamento do escritor Germano Almeida, Advogado, Ex-Procurador da República, Ex- Deputado Nacional atual Prémio-Literário Camões, Mandatário da candidatura do atual Presidente da República, que decidiu publicar em livro, contendo 46 crónicas intitulado por “O Inferno da Não-Justiça”, referindo-se ao Sistema Judicial cabo-verdianp, onde é possível encontrar algumas referências muito corrosivas e demolidoras a respeito do desempenho do nosso Tribunal Constitucional.
A contundência e seriedade das críticas feitas por GA é de tamanha gravidade, de tal modo que nenhuma entidade oficial, titular de órgão de Soberania, Membros do Conselho Superior da Magistratura Judicial, Agentes do Ministério Público e da Procuradoria Geral da República, ou mesmo Sua Excelência o Senhor Presidente da República poderá alegar desconhecer denúncias tão perturbadoras sobre o “Inferno da Não-Justiça”.
Para se ter uma ideia de quão sérias e preocupantes são as afirmações que foram vertidas em cada página deste livro, convinha reproduzir aqui três excertos que não deixarão nenhum Cidadão Cabo-Verdiano dormir sossegado, enquanto não houver uma verdadeira reforma desse “Inferno da Não-Justiça”.
I. “É que o processo criminoso inventado contra o Deputado Amadeu Oliveira é emblemático desse divórcio entre lei aprovada e a prática. Tendo sido preso ilegalmente, o Juiz que o mandou prender e manteve a sua prisão (Dr. Simão Santos) cometeu o Crime de Prevaricação punido pelo Código Penal. Os Juízes que o condenaram aceitaram a inserção de falsidade no processo. O Supremo Tribunal não hesitou em confirmar a escandalosa sentença que o condenou a sete anos de cadeia por um hipotético Crime de Atentado Contra o Estado de Direito”;
II. “Já não será mais possível confiar e acreditar na boa-fé de qualquer decisão que os Juízes do Tribunal Constitucional, (José Pina Delgado, Aristides Raimundo Lima e João Pinto Semedo) venham a tomar, porque chegam à partida inquinadas de gravíssima suspeita de poderem estar ao serviço de qualquer um, menos da justiça que são chamados a defender”;
III. Os Juízes do Tribunal Constitucional são homens-juristas como os outros. Não são deuses!! Mas ainda que fossem! Estão sujeitos a paixões e interesses corporativos que bem mostraram nesse malfadado acórdão. Podem ter vencido, porém, ficam longe de convencer. E é pena porque essa absurda e perigosa posição destrói a confiança que a sociedade precisa ter num Tribunal Constitucional.
Ora, convenhamos que denunciar Magistrados Judiciais de cometerem Crime de Prevaricação (punido com uma pena de até 8 anos de prisão), afirmar que o Supremo Tribunal aceitou a inserção de falsidades no processo, insinuar que o Tribunal Constitucional pode estar ao serviço de qualquer um, mas não da justiça, são enfim denúncias que não podem ficar sem serem averiguadas, exigindo uma clarificação das entidades e órgãos competentes, a começar pelo próprio Tribunal Constitucional, Conselho Superior da Magistratura Judicial, Procuradoria Geral da República e do próprio Presidente da República, na qualidade de garante do regular e legal funcionamento das instituições e vigia do cumprimento dos ditames constitucionais.
Quando o Tribunal Constitucional é assim destratado por um jurista e autor mundialmente reconhecido como é o caso de Germano Almeida, é forçoso uma tomada de posição do Mais Alto Magistrado da Nação, o Presidente da República. José Maria Neves deve sim agir em conformidade, no sentido de realizar alguma averiguação sobre a defesa ou a morte da Constituição da República, nesse país onde todos os responsáveis por essa situação parecem mudos e cegos e paralíticos, ou, fazendo alegoria da estória biblica, como "Novos Pôncios Pilatos, esse que virou a cara e lavou as mãos, enquanto Jesus Cristo (Constituição da República) estava sendo vilipendiado e crucificado, ao bgel-prazer dos Sumos-Sacerdotes, dos “Venerandos Juízes Conselheiros”, dos “Guardiões do Templo” que se assemelhavam aos actuais “Membros do Conselho Superior da Magistratura Judicial” e outras autoridades e demais entidades graúdas daquele tempo.
Pelo acima exposto, não obstante o Venerando Presidente do Tribunal Constitucional já ter declarado que o balanço é positivo, parece que o Dr. Germano Almeida (e muitos outros cidadãos habilitados e com autoridade moral para tanto) possuem uma opinião fundamentada diametralmente diferente.
Este texto-chapéu antecede os próximos artigos do jurista Daniel Carvalho, antes do de José António dos Reis e do Professor Doutor Jorge Bacelar Gouveia, a publicar aqui, no Santiago Magazine, semanalmente.
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