O escritor cabo-verdiano José Luiz Tavares anunciou hoje que vai interpor uma acção judicial para suspender o manual do 10.º ano de Língua Cabo-verdiana por ser “um crime contra a língua cabo-verdiana, atentado grave e uma aberração linguística”.
"Foi feito e criado uma norma que viola toda a legislação que existe sobre a língua cabo-verdiana, viola o decreto que institui o alfabeto cabo-verdiano de 2009 (…), é uma fraude científica, linguística e jurídica”, considerou o escritor.
José Luiz Tavares falava aos jornalistas durante a apresentação do seu novo livro "Sonoru Tenpestadi di Fumu i Flexa" na segunda edição da Grande Feira do Livro 2025, encerrada hoje no Largo do Memorial Amílcar Cabral, na cidade da Praia.
Segundo o autor, o manual em causa viola a legislação nacional em vigor, nomeadamente o decreto que institui o alfabeto cabo-verdiano, aprovado em 2009, e o decreto-lei que introduz a língua cabo-verdiana no sistema educativo.
“Anúncio aqui que não vim a Cabo Verde só para tratar dessa questão de lançar o livro, mas vim efetivamente para entrarmos no tribunal com uma acção, portanto pode ser com uma providência cautelar, com uma denúncia ao Ministério Público, ou com acção popular para travar esse crime contra a língua cabo-verdiana”, avançou.
No seu entender, para além de ser “uma aberração linguística” é tudo ilegal porque “foi a destruição de um processo de consenso” feito há muitos anos.
O autor acusa ainda as autoridades competentes de não fazerem nada, afirmando que “todos os órgãos de soberania, líderes parlamentares, Presidente e responsáveis políticos foram informados".
José Luís Tavares sublinhou que a língua cabo-verdiana deve reflectir a sua riqueza e pluralidade, “de Santo Antão à Brava”.
“Queremos que essa língua se mantém viva na sua pluralidade de Santo Antão a Brava com todas as variedades porque língua viva é língua de alguém (…), temos que ir ao tribunal, para nos dizer se está certo ou está errado e se o tribunal não nos der a razão teremos que aceitar, porque a lei da nossa terra é soberana”, apontou.
Assegurou que solicitou em Portugal um parecer jurídico e que a partir de segunda-feira, 14, todos aqueles que queriam podem se juntar a esta “causa nobre que é do povo”.
"Eu gostaria de saber falar de todas as variedades, mas não sei (…), a questão da padronização é algo que vem de longe e ainda não podemos pensar nela, porque é um processo que não sei se pode ser feito artificialmente, mas acredito que pode acontecer de forma natural”, sublinhou.
Segundo disse, com a mobilidade entre as ilhas, com pessoas da Praia que vão para a Boa Vista, de São Vicente que vêm para a Praia, de Santa Cruz que vão para o Sal, pode surgir, de forma natural, uma norma comum, “sem ser imposta por nenhuma engenharia de laboratório."
“Isso aceitamos porque nasceu do dono da língua de povo e da sua alma, porque quando matas uma língua viva está a matar um povo, que apesar de ter a barriga cheia, mas se a sua língua que é o seu principal elemento espiritual morrer, ele está morto”, apontou.
Neste sentido, disse que vão avançar com esta acção que tem como objectivo primeiro suspender os efeitos da norma imposta para evitar maiores danos sendo que o momento é oportuno, já que o ano lectivo está em pausa devido às férias
O escritor considera ainda que a forma como esta norma foi introduzida revela má-fé porque foi apresentada no dia 21 de fevereiro, Dia Internacional da Língua Materna, no Palácio da Presidência da República, entrou em vigor no meio do ano lectivo e foi incluída até nas provas do 11.º ano, mesmo sem haver manual.
Avançou ainda que todos os artigos e pareceres publicados apontam que se trata de um atentado grave, não tem a ver com São Vicente, nem com a Praia, nem com Santa Luzia ou qualquer outra ilha, o problema está na norma, “criada ilegalmente e sem qualquer base científica”.
"Para isso temos que combater, não é contra as pessoas, na verdade as pessoas tomam como pessoalmente, e no meio dessa guerra, pode ter outra consequência também, jurídica, (...) mas as pessoas que estão a me ouvir sabem o que fizeram e estão a espera, e até podem destruir provas mas tem meios para chegar nas provas sobre o que fizeram", concluiu.
Comentários
Alexandre Honrado, 14 de Jul de 2025
É uma vergonha para Cabo Verde que ninguém tenha tomado qualquer providência sobre esta questão e tenha sido um cidadão que vive no estrangeiro a vir acordar as consciências e a tomar as providências que este grave atentado civilizacional impõe. Bem haja, bendito filho desta terra!
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