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Produtividade vs Ociosidade na Administração Pública Cabo-verdiana. Um caso de estudo
Ponto de Vista

Produtividade vs Ociosidade na Administração Pública Cabo-verdiana. Um caso de estudo

Efetivamente, a ociosidade na Administração Pública Cabo-verdiana é uma realidade que não deve ser escamoteada, antes pelo contrário, deveria ser objeto de estudo e de decisão, porque tem afetado, sobremaneira, a saúde mental dos funcionários.Embora desconhecendo estudos relacionados com essa matéria, arrisco dizer que a ociosidade na Administração Pública tem incidência em todas as categorias profissionais, todavia, o nível de afetação psicológica parece que tem estado a atingir com maior intensidade as categorias profissionais mais qualificadas.

Os més de dezembro é para os cristãos, e não só, o tempo de esperança e de renovação de espírito e sinaliza, simultaneamente, o fecho de um ciclo e o inicio de um novo ciclo, tanto na vida pessoal como na vertente profissional. Falar do fecho e de inicio de um ciclo implica, necessariamente refletir sobre as nossas produtividades e dos tempos desperdiçados.

Em jeito de síntese pode-se afirmar que a produtividade expressa o produto gerado por cada hora de trabalho, enquanto que o tempo desperdiçado, ou ociosidade, resume-se ao período de tempo improdutivo.

Imaginemos uma noite e quem alguém vai para a cama, mas não consegue dormir. É evidente que a insónia iria provocar sérios aborrecimentos na pessoa, uma vez que ali é o único lugar onde pode e deve desfrutar do descanso merecido, e na ausência do sono, tem que inventar algo para preencher o tempo, podendo deitar mão em opções interessantes como a leitura de um bom livro, ou simplesmente afogar o stress, fazendo o recurso a determinadas alternativas menos saudáveis e ao mesmo tempo, mais oneroso para o orçamento familiar. Não raras vezes, ausentar-se do aconchego familiar, por algumas horas, surge como anedótico adequado para preencher o vácuo criado pela ausência do sono.

Este exemplo ilustra, de certa forma, a situação que um numero significativo dos funcionários da Administração pública vem atravessando aos longo dos anos.

Partindo da premissa, de que a produtividade consiste no produto gerado por cada hora de trabalho, existe legitimidade para se lançar as seguintes questões:

Quantas horas diárias um funcionário da Administração Pública produz?

O que faz com o remanescente de horas improdutivas?

Perante esses fatos, que ilações podemos tirar?

De entre as várias, a primeira e quiçá a mais evidente, é que durante o tempo improdutivo, o individuo fica no seu posto de trabalho aborrecido, e por conta desse aborrecimento, consome mais recursos postos à sua disposição, designadamente, mais descarga de água na sanita, porque aumenta o numero de vezes em que vai casa de banho, logo, mais lâmpadas acesas, mais consumo de eletricidade, papeis, internet, telefonemas, e mais, constantemente atrapalha o colega ao lado que está a trabalhar; e por conseguinte gera mais despesas mensais na instituição.

A segunda ilação, quiçá a menos evidente, é que alguns colaboradores aproveitam o tempo do ócio para a sua autoformação, e no meio desse período, naturalmente que tanto um, como o outro, aproveita-se de uma escapatória, para tratar de assuntos de natureza pessoal em vez de estar a executar as tarefas que integram o seu job description.

Esses assuntos que os colaboradores tratam, também fazem parte da rotina dos nossos dirigentes da Administração Pública, entretanto, quando se trata dos subordinados, as coisas mudam de figura e caem no ridículo de controlo cerrado de assiduidade e pontualidade em jeito de castigo, quando deveriam estar focados no essencial, que é trabalhar o conteúdo funcional dos seus colaboradores; monitorizando-os por forma a garantir um Serviço Público de qualidade.

Quando observo ou alguém comenta comigo dos dirigentes com esse estilo de liderança, que não são poucos, faz-me a lembrar da celebre frase, que diz o seguinte:

“O bêbado estava procurando a chave debaixo do poste, e quando alguém perguntou se ele havia perdido naquele lugar: Ele disse que não, mas estava procurando ali porque era onde estava mais claro”:

“Moral da estória: há sempre uma tentação de buscar as respostas onde está mais clara e não onde elas realmente se encontram”.

Efetivamente, a ociosidade na Administração Pública Cabo-verdiana é uma realidade que não deve ser escamoteada, antes pelo contrário, deveria ser objeto de estudo e de decisão, porque tem afetado, sobremaneira, a saúde mental dos funcionários.

Embora desconhecendo estudos relacionados com essa matéria, arrisco dizer que a ociosidade na Administração Pública tem incidência em todas as categorias profissionais, todavia, o nível de afetação psicológica parece que tem estado a atingir com maior intensidade as categorias profissionais mais qualificadas.

E tais situações de ociosidade, com impacto fundamentalmente negativos tanto a nível da produtividade, como na saúde mental de percentagem significativa dos servidores públicos, não estaria a acontecer na Administração pública se os seus dirigentes dessem ao trabalho de usar os instrumentos legais postos a sua disposição.

Basta, por exemplo, fazerse o uso das prerrogativas do Decretos-lei nº 54º/2009, de 7 de dezembro, que estabelece o regime de Mobilidade Territorial e Profissional dos funcionários, do Decret-legislativo nº 20/2013, de 11 de novembro, que estabelece o regime jurídico da duração e horário de trabalho na administração pública, que abre a possibilidade da aplicação de regime de não sujeição ao horário de trabalho  e do  Decreto-Legislativo nº 11/2018, de 5 de dezembro, que regula o exercício de atividade laboral em regime de Teletrabalho, para fazer da gestão de pessoas algo com maior sentido de equilíbrio, por forma a  estimular um ambiente mais  saudável,  propicio à produtividade no trabalho e  conciliável a vida profissional e pessoal.

Portanto, fica o desafio para uma reflexão profunda, em torno do tema em pauta.

A todos um feliz Natal e que no ano de 2023 tenhamos um inicio de ciclo com menos ociosidade, mais produtividade, menos arrogância e mais humildade, para Administração Publica e toda a família Cabo-verdiana.

 

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