Diz-se que quando Deus criou o mundo e ordenou que a Luz se fizesse, fez também uma Criatura, um Anjo, que o baptizou com o nome de “Anjo de Luz” ou “Luz da Fé”. Que depois fez Adão, mais tarde, a Eva e as restantes Criaturas povoadoras do universo. Que o “Anjo de Luz” ou “Luz da Fé” fora engendrado para que viesse iluminar o Mundo, espalhar a Fé, a Paz, a Esperança e a Felicidade entre os Homens que haveriam de povoar o Mundo, fruindo-se da Santa Imortalidade.
Entrementes, um certo dia, esse primogénito do Criador se rebelou, tendo recebido, em consequência, a maldição e a substituição do nome. Passou-se a chamar “Satanás” e foi-lhe ofertado um exílio num sítio denominado “Purgatório”.
Mas como no princípio Deus perdoava tudo, e tinha-nos inculcado em como deveríamos perdoar até aos nossos inimigos. Nessora, ele resolveu dar mais uma oportunidade ao seu filho concebido e o rebaptizou com o nome de “São Tanás”. Mas conforme dizia Amílcar Cabral, «Uma Serpente, mesmo que mude de pele continua Serpente». Pois, reabilitado o filho, Deus colocou no quarto dele uma mala com a tampa fechada, mas não à chave, e o advertiu a não abri-la em caso algum. Mas São Tanás, sem forças para resistir à tentação da curiosidade, foi espreitar o que havia confinado dentro da caixa. Imediatamente saíram de lá de dentro, todos os males que até hoje enfermam o Mundo. Saíram a Ganância, a Inveja, o Ódio, a Dor, a Doença, a Fome, a Pobreza, a Guerra, o Corrupto, o Ditador e a Morte. São Tanás ficou despeitado, desnorteado e deixou a tampa do baú cair. DE imediato São Tanás começou assentir-se perturbado. Sentia frio de um lado, calor do outro. O corpo todo ficou-lhe cheio de coceirinha e o cabelo cheio de piolhos e lêndeas. Todas as Criaturas começaram a sentir os efeitos nefastos das pandemias. São Tanás deitado no cão a «labilabir-se» [contorcer-se, esfregar o corpo no chão], ouviu uma voz do interior da caixa:
- Me tire também. Fiquei aqui sozinha. Eu posso vos ajudar.
Como São Tanás, efetivamente, precisava de ajuda, voltou a abrir a caixa e a última a sair foi a Esperança, e o curou. É nesta ótica que se diz: «A Esperança é última a morrer».
Permitam-me, depois deste intróito, entrar no essencial. Ora, passei hoje o dia todo a pesquisar e a cogitar sobre a democracia cabo-verdiana que me cheira à ditadura, sem máscara para proteger a boca e o nariz, nem álcool gel para untar nas mãos e fazer embebedar o COVID-19. Consequentemente, essa pandémica democracia empesta e infesta toda a casta. Há mais casos diários de corrupção em Cabo Verde de que os infetados pela Coronavírus.
Fiquei impressionado com a inércia das autoridades e com o silêncio cúmplice dos que são, ou que pelo menos, deveriam ser, por obrigação legal, responsáveis pela fiscalização da legalidade e da constitucionalidade, como sejam: os digníssimos senhores Procurador-geral e Presidente da República. Constatei-me, nessas incursões Webianas, «Ns» irregularidades que só não se consubstanciam em róis de crimes hediondos, num país de democracia padronizada. E o que vou reproduzir aqui não são afirmações minhas, nem sou o primeiro a proferi-los. Há anos que vêm sendo propalados e as autoridades, os Partidos Políticos, até as Comunidades Internacionais ficam quedos nos seus recantos dourados, donde criminosos recebem galardões. Que patifaria!
Não vos vou falar de crimes como assassinatos aparentemente encomendados e encobertos; da médica legista que não faz autópsia aos cadáveres desconhecidos ou que sejam manjacos e estejam a cheirar fedi; de misteriosos raptos de pessoas, mormente crianças, sem qualquer preocupação das autoridades; das graves denúncias do Vieira Lopes, o deão que pereceu em circunstâncias dúbias; de Praia Leeks com suas bombásticas revelações, indiciando altos dignitários do país; nem do Amadeu Oliveira quando chama pelo nome e de viva voz, aos Juízes do Supremo Tribunal de Justiça; Presidente do Conselho Superior da Magistratura; Bastonário da Ordem dos Advogados; Procurador-Geral da República e mais alguns Juízes das Comarcas, de «gatuno, falsificador de processos, prevaricador, corrupto, Aldrabãozeco, despreparado e sem postura para o cargo que tão imerecidamente ostenta.
Vou sim, falar-vos de corrupção para justificar a minha convicção de que o sistema Político cabo-verdiano não é democrático, mas sim, uma ditadura moderna, implacável e feroz. Uma ditadura que mata, sorrindo; e toma, fingindo-se dar. É como quem dá esmola a um sego, deixa cair uma moeda de dez escudos no chapeuzinho no chão, mete a mão e sobe com uma outra de 50, e o cego, rindo-se de contente, até agradece.
Já alguém dizia, e constatei-o nas minhas pesquisas, que há uma cultura política do escândalo quanto às práticas ilícitas de governantes sem probidade. Os escândalos da Embaixada de Portugal e o da privatização da ENACOL, são dois casos pragmáticos e evidenciam uma cultura política de “atividades ocultas”, numa franca improbidade.
Em 1993 eclodiu a denúncia de corrupção na embaixada de Cabo Verde em Portugal. Um funcionário daquela missão Diplomática terá denunciado que o Embaixador havia comprado, num único mês, 609 contos de whisky, cerca de oito mil dólares. Um funcionário do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Daniel Benoni R. Costa, foi designado como inspetor para ir averiguar o caso. Mas antes de partir para Portugal, o Inspetor terá recebido «insinuações de que a averiguação das irregularidades praticadas pelo embaixador em Portugal deveria, na verdade, ser apenas uma visita de performance». Por conseguinte, quando o Inspetor regressou de Portugal, e apresentou o relatório das averiguações, recebeu ordens implícitas de seus superiores hierárquicos de que deveria «abafar» tais irregularidades. Que tudo deveria ficar bóka-bóka. Daniel Benoni, o inspetor encarregado de averiguar a diplomacia cabo-verdiana em Lisboa, não acatou as ordens de um Partido que se auto-intitula de democrático, foi despeticamente demitido, sob a alegação de que era funcionário aposentado da administração pública Portuguesa. Passou-se a bode expiatório e vítima de persecução do próprio governo que lhe encarregou da tarefa. E posteriormente o governo teve o desplante de mover-lhe um processo e os membros do governo passaram a contra-atacá-lo na mídia local. E 4 ministros foram demitidos, inclusive o atual Chefe do Estado.
Tudo isto vem imprimido em dois livros que, entre 1996 e 2000 Benoni escreveu denunciando as irregularidades da embaixada e a perseguição de que foi vítima. Um dos livros é: «Escândalo e benção, Praia, Edição do autor, 1996».
Transformado essas denúncias de corrupção em formato livro, Benoni passou-se «a enfrentar a força de enunciação do Chefe do Executivo do país que mobiliza um conjunto de instâncias institucionais como a Procuradoria, os Tribunais, a Televisão Estatal e a Polícia para desqualificar o autor da denúncia e reforçar a autoridade do governo. Sic».
Entretanto, «se do lado do ex-Inspetor toda uma rede se instala para tornar possível desde a publicação de um livro de divulgação do escândalo e a designação do denunciante como candidato e sua eleição como edil na capital do país, em contraposição, do lado do Chefe de Estado e do Embaixador, aliam-se o Tribunal de Contas que retém o processo por três anos, o Procurador Regional da República que acusa o ex-Inspetor de desvio de documentos da Embaixada, a Polícia mobilizada para procurar os referidos documentos em casa do ex-Inspetor que passa a se ver, de certo modo, em regime de vigilância. Sic».
Daniel Benoni teria transladado da administração colonial para a Função pública da República dos Combatentes, depois de convidado para integrar os quadros do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Mas a sua carreira pouco evoluiu ao longo dos 15 anos de regime monopartidário, por que não era combatente, nem doutorado. Imperava, nos primórdios de 1975, uma clara e despudorada monopolização dos principais postos do Estado pelos ex-guerrilheiros, intelectuais, militantes do PAIGC/CV e seus próximos. Mesmo sendo autor, nessa altura, de 3 livros, o nome de Daniel Benoni continuou à sombra de um combatente ou de um doutor, que, tendo escrito apenas um poema, já é conhecido largamente e considerado exímio «poeta».
Só depois de ter inserto nas suas obras, o escândalo do Embaixador e a dimensão da corrupção em Cabo Verde, é que Benoni se extrapolou a projeção nacional, ganhando visibilidade, notoriedade e reconhecimento até da «Amnistia Internacional que o premeia com distinção em Cambridge e seu nome passa a constar do 26° volume do Dicionário de Biografias Internacionais daquela entidade».
Por todas essas escabrosas evidências, e Benoni a sacrificar-se, o governo engendra um outro escândalo, mais ainda caricato e surreal, tão cómico quanto trágico, quando dez anos depois da denúncia, esse ex-Embaixador é colocado como um dos maiores acionista do maior investimento empresarial no país. A construção do maior complexo turístico que contou com participação de Cabo Verde, o Santiago Golf Resort, assegurada por uma companhia portuguesa e o novo homem de negócios, o ex-Embaixador.
Conjuntamente, a multinacional portuguesa e o ex-Embaixador asseguraram um projeto de 550 milhões de euros, o equivalente ao orçamento geral do Estado Cabo-Verdiano por dois anos. E o ex-homem político comparticipou com 25% dos 550 milhões de euros.
É prudente lembrar-se que esse Embaixador, depois de todos os escândalos, foi nomeado Presidente do Conselho de Administração aquando da privatização da empresa cabo-verdiana de telecomunicações.
Porém, um blog do jornalista português Leston Bandeira faz lembrar que esse Embaixador, quando estava exilado em Lisboa, na década de 1980, lhe fora apresentado solicitando emprego, «como alguém que não já não tinha sequer para comer» http://o-romeiro.blogspot.com/2005_07_01_archive.html.
E é hoje, uma das pessoas mais rica de Cabo Verde. Todavia, alguém dizia e verdade é, que é sistemático o processo de conversão de bens estatais em riquezas pessoais dos políticos cabo-verdianos.
Fico por aqui desta feita, prometo voltar com os casos da ENACOL e os 13 milhões e euros; com o Fundo do Ambiente e os 500 mil contos; o Novo Banco e o salário de quase 900 contos por mês ao seu Presidente do Conselho de Administração, um português e da privatização do TACV.
Comentários