O dia 5 de julho é um momento de celebração do sucesso de Cabo Verde como nação e de reflexão sobre o quão longe chegamos para nos tornarmos o país que Cabo Verde é hoje, e definitivamente ninguém pode dizer que a Independência não foi uma boa decisão dos seus fundadores, motivo de orgulho para todos os Caboverdeanos, dentro e fora do país.
A inclusão social e a justiça social para todos os seus cidadãos constituem objetivos de qualquer país independente. Porem, a história tem provado que isto não é necessariamente verdade, quando se trata de países livres do controle colonial e, portanto, a luta precisa ser continuada.
Cabo Verde tem feito progressos significativos em muitas áreas. A recente aprovação da lei de paridade mostra a continuidade da tendência em direção da equidade, justiça e inclusão sociais. Apesar de eu acho que com esta lei Cabo Verde levou a boca mais do que pode mastigar, quando se atenta para o artigo nº 4 da lei, ha um claro esforço para a inclusão social dos seus cidadaos.
Quanto a discussão racial, porém, tem sido ignorada desde o início de Cabo Verde como nação em 1975. 45 anos depois, Caboverdeanos continuam a ignorar esta problemática social, apesar do facto de Cabo Verde ter servido de ponte como um dos lugares emblemáticos onde tudo comecou, e as colónias europeias serem a raíz de todas as formas de racismo em todo o mundo.
A questão do debate sobre o racismo em Cabo Verde é uma das questões mais temidas na nossa jovem nação. Com boas razões, a questão de saber se há ou não racismo em Cabo Verde confronta muitos caboverdeanos e os dirigentes do país com o medo real do que pode vir a ser. Poderá vir a perturbar a ordem social, a tão desejada coesão das ilhas, ou mesmo ter que admitir que nós, afinal, podemos não ser o que sempre pensamos que somos ou desejamos ser? Eu adianto que o povo caboverdeano tem motivos suficientes para se definir como um povo bom, gente bonita, cheio de morabeza de uma nação pacífica. Esta é uma questão que levanta sentimentos de ansiedade, medo, raiva e ou desconfiança em relação às pessoas que fazem ou sugerem tal pergunta.
Portanto, e com razão, espero que alguns fiquem incomodados com o simples facto de eu ter levantado esta questão. As pessoas poderão reagir de uma forma crítica, mas estou muito confiante de que muitos de nós, caboverdeanos, saberemos reconhecer onde esta discussão abordará nossos próprios problemas, pessoais e coletivas, de uma forma real. A minha premissa é que se os caboverdeanos, numa nação independente, quiseram falar sobre a inclusão social e a equidade social, então se faça necessário falar a verdade sobre todos os problemas, identificar as soluções ao nosso alcance, e depois ir ao encontro de formas de ajustar e de mudá-las. Meu único propósito é trazer à tona um debate que foi adiado por muito tempo, e continua a negar certos aspetos da nossa sociedade, trazer o tratamento e reparações a certos membros de nossa sociedade. Ainda, esta discussão deve servir para encorajar outros caboverdeanos a falarem livremente sobre o tema, agir de forma assertiva, sem negar a ninguém o direito de se expressar livremente e vislumbrar oportunidades disponíveis a todos.
Raça e Racismo
Para contextualizar, e em termos simples, define-se a raça como o agrupamento de seres humanos com base em qualidades físicas ou sociais compartilhadas em categorias geralmente vistas como distintas pelas sociedades. O conceito de raça variou em termos de sua função ao longo dos tempos. Inicialmente referiu-se a pessoas com línguas comuns, mais tarde para denotar afiliações nacionais, mas no século XVII passou a se referir a traços físicos de diferentes povos (fenótipo). Apesar de todos os esforços de muitos estudiosos para encontrar razões biológicas para determinar o conceito de raça, com alguma validade científica, na metade do século XX, a raça tem sido considerada principalmente como um sistema pseudocientífico de classificação, o que leva a um uso crescente de termos menos ambíguos como populações, pessoas, grupos étnicos ou comunidades, dependendo do contexto. Os estudiosos modernos veem as categorias raciais como uma construção social. Isto é, mais uma identidade criada por grupos socialmente dominantes, para estabelecer dominação e significância em um determinado contexto social.
O conceito de racismo surgiu durante o período da revolução científica e do estudo dos tipos naturais e como produto de empreendimentos coloniais de potências europeias do século XVI ao XVIII. Nessa época, os estudos identificaram a raça como sendo a cor da pele e as diferenças físicas. Isto foi reforçada pelo imperialismo europeu durante os períodos de colonização na sua relação política com pessoas de distintas raízes culturais, físicas e políticas para justificar a brutalidade e a opressão. Apesar do fato de a maioria se identificar como filhos de Deus e por isso a esta brutalidade chamou de civilização, não há nada civilizado e piedoso em matar pessoas ou forçá-las à escravidão. No estágio atual da evolução científica, o conceito de raça não tem ninhuma base científica ou genética. Como exemplo, certos indivíduos foram pesquisar seus agrupamentos genéticos, apesar de se considerarem brancos, descobriram que seus genes tinham uma base genética de outras raças, como o negro, por exemplo, apesar de sua classificação ser branca, e vice-versa.
Dinâmica racial em Cabo Verde
Cabo Verde se enquadra na categoria dos países que foram colonizados por europeus que tinham experiência anterior de interação com outras raças, ou seja, Portugal e Espanha. Seu legado e significativamente diferente do dos colonos mais ao norte da Europa. É fácil denotar que as colónias portuguesas e espanholas tiveram mais misturas inter-raciais do que o francês, inglês e alemão, por exemplo. Os europeus das colônias de Portugal e Espanha deixaram um legado de categorias multirraciais, enquanto os europeus de países do Norte da Europa mantiveram uma linha racial mais separada entre eles e as pessoas que oprimiram. Um exemplo é a ilha de São Domingo e do Haiti, uma pequena ilha no Caribe colonizada por dois colonos europeus (franceses e espanhóis). Seu legado num lado da ilha – o lado espanhol - deixou uma população totalmente mestiça, igual a mestiçagem caboverdeana, e a outra metade da ilha, o lado francês, deixou uma população com uma menor grau de mestiçagem entre o homem e a mulher branca e o homem e a mulher negra. As colónias francesas e inglesas exerciam uma repressão mais dura para impedir a mestiçagem.
Alguém pode perguntar, mas porque discutir isso?
A importância das diferentes dinâmicas nalguns destes paises nos ajudará a entender os conceitos que iremos discutir em breve. Enquanto em países onde a divisão étnica ou racial é clara, isto é Inglesas e francesas, a tensão e a dinâmica são um pouco diferentes do que nos países onde a população se tornou mestiça, Portuguesas e Espanholas, onde há um contínuo caleidoscópico em termos do grau de cor em que uma pessoa está mais ou menos próxima da raça original, no caso de Cabo Verde, raça negra e branca.
Branquitude
Branquitude é um fenômeno social que acontece na maioria dos países anteriormente colonizados por brancos europeus. A pessoas de raca branca se tomam como norma, e portanto tendem a classificar outras raças ou grupos em diferentes categorias. Esta noção é reforçada através da mídia e dos sistemas de educação ou publicações científicas. É como se outros grupos têm identidade racial, mas os brancos geralmente se classificam como a raça normal, ou não têm categoria racial. As abordagem científicas utilizam a raça branca e os padrões brancos como norma e como amostra para a maioria dos estudos científicos. Portanto, os resultados cientificos são universalizados e aplicados a quaisquer outras raças, incluindo outros países, sem se questionar. O padrão de beleza também vem dos padrões da raça branca, o corpo, o cabelo, a cor, a cultura, a arte, etc. Parece-se inteligente ou civilizado se você possui qualidades, traços, características da raça branca, fala como eles ou fala suas línguas. As revistas, Holywood, história e a ciência branca reforçam esta noção.
O evento da morte de George Floyd nos EUA e a crise social que começou nos EUA após sua morte, como um homem negro nas mãos de uma polícia branca, resultou em “Black Lives Matter”, uma organização ativista nos EUA a contribuir para uma espiral de conversas sobre raça, racismo e reformas. Enquanto antes este debate tinha lugar principalmente para exercícios intelectuais em Instituições educacionais e artigos de pesquisa, de repente há cada vez mais o reconhecimento dos políticos e da mídia o que afetou o discurso público sobre o racismo sistêmico como sistema de opressão, que na maioria das vezes é invisível para o público em geral. Esta forma de exclusão e opressão por parte dos brancos e das instituições brancas tem um impacto significativo na vida de indivíduos que não são da mesma raça. Portanto, o racismo sistemico não é apenas piadas de mau gosto contra um indivíduo de cor de pele negra ou escura, ou insultos raciais, mas sim um sistema de discriminação que é apoiado por instituições, projetado para oprimir outras raças que não são brancas, como nos sistemas educacionais, no estado, na polícia e nas instituições culturais etc. Portanto, esta nova abordagem para enfrentar o racismo no mundo inteiro tem de lidar com esta forma de opressão, isto é, o racismo sistémico, onde muitas vezes não é vista, e que, no entanto, está presente. Como Sarah Ahmed, professora Australiana e teórica feminista, aponta: "A branquitude só é invisível para aqueles que a habitam. Para quem não é, é difícil não ver branquitude. Até parece que está em todos os lugares.”
Privilégios brancos
Privilégios brancos referem-se a privilégios sociais, não merecidos, que beneficiam pessoas de raça branca em relação às não-brancas em algumas sociedades, quando estão sob as mesmas circunstâncias sociais, políticas e económicas. O privilégio branco é suportado pela noção da supremacia cultural branca, a superioridade da cor da pele branca. Peggy Mcintosh, em seu ensaio de 1987, descreveu o privilégio branco como uma mochila invisível e leve de garantias, ferramentas, mapas, guias, códigos, passaportes, vistos, roupas, bússola, equipamentos de emergência e cheques em branco. A famosa canção de Zeca de Nha Reinalda " djam branco dja" ilustra como os caboverdeanos estão cientes da diferença de ser branco e ser negro, e que ser branco é um sinal de progresso. A brancura vem junto com outros privilégios, como status, classe, um familiar próximo do poder político e económico. O privilégio branco, no entanto, não é geralmente reconhecido por membros da raça branca, mas muito claro por membros de raças não branca.
Racismo cultural e racismo internalizado
O racismo cultural existe quando há uma ampla aceitação de estereótipos em relação aos diferentes grupos étnicos ou populacionais, crença de que uma cultura é inerentemente superior a outra. No racismo internalizado, tanto o racista quanto suas vítimas internalizam certos valores e atributos, e ambos se esforçam para manter a norma. Esses valores podem ser vistos, por exemplo, em atributos de cabelo liso versus cabelo duro, tom de pele mais branco considerado mais bonito do que tom de pele mais escuro, ou o tom de pele mais branco é o padrão de beleza, um indivíduo que fala língua portuguesa com dificuldade é considerado menos inteligente do que um individuo com bom sotaque português, e isto é o bastante para determinar seu potencial de sucesso.
Este fenómeno não significa que os indivíduos do outro lado do espectro, os da pele mais escura, os mais pobres, os impotentes, estarão necessariamente em oposição a esta forma de branquitude ou superioridade cultural branca, ou mesmo reconhecer suas falácias. Pelo contrário, os indivíduos mais afetados, frequentemente se engajam na luta para manter esta norma. Esse fenómeno é chamado de racismo internalizado. Aprendemos a não questionar. Geralmente nos esforçamos para estar o mais próximo possível desta "norma" como um sinal de força, aceitação e poder. As pessoas agem principalmente no nível do inconsciente, ou mesmo quando estão conscientes disso, aceitam porque é a norma que é mantida por ser constantemente modelada pelas autoridades institucionais e políticas, pelas instituições de ensino, pelas instituições culturais e muitas vezes apoiada por tentativas de justificação científica.
Cabo Verde, país racista ou não racista?
O caso de Cabo Verde, como muitos outros países de origem colonial semelhantes, adiciona-se a branquitude, outras variáveis incluindo variantes linguísticas, estatuto económico e social, e região ou ilha de onde o individuo é originário. Lembro-me de quando alguns caboverdeanos costumavam reclamar-se de serem discriminados por outros indivíduos, geralmente de outra ilha em Santiago, um membro de alto escalão do governo declarou que não há racismo em Cabo Verde, mas há regionalismo. Acho que esse membro do governo, naquela época, estava certo. Na verdade, pode-se defender uma tese de que há outras formas de discriminação, além do racismo. Era como se isso significasse: ok, isso não é racismo, então nós estamos bem, é apenas regionalismo, nada para se preocupar. Mas, no entanto, o elefante está tão presente na sala e continua tão presente como sempre, ainda hoje.
Como eu mencionei anteriormente, Cabo Verde se enquadra na categoria de países que foram colonizados por europeus que deixaram linhas raciais menos rigorosas a separar a raça branca da raça negra. Portanto, o povo caboverdeano borrou as linhas raciais entre negros e brancos apesar de ainda termos indivíduos que se sentem alienados e ofendidos se se disser que eles são de raça negra. O que existe em Cabo Verde é um contínuo caleidoscópico de cores da pele, a mestiça.
Colorismo, micro agressão e insultos raciais
Colorismo é um conceito que foi cunhado por uma ativista Americana Alice Walkers, em 1983. A noção descreve o tratamento preconceituoso ou preferencial de indivíduos da mesma raça, com base apenas no tom de cor da pele. Nos EUA, o tratamento preferencial aos negros de pele mais clara, como Walker se referiu em seu livro, era um mal que precisava ser parado se os negros quisessem progredir como um grupo coeso. No esforço para produzir "filhos melhores", subir a escada social, os negros estavam se engajando em encontros e casamentos inter-raciais. O problema era que mais irmãos negros se casavam com irmãs brancas enquanto as irmãs negras ficavam solteiras, desproporcionalmente. Grandes preocupações foram levantadas na comunidade negra para trazer os irmãos negros de volta para casa para se casarem com as irmãs negras porque os irmãos brancos não procediam da mesma forma, e isso deixava um problema de casamento das negras. Posteriormente, um movimento surgiu para enfatizar a negritude e a beleza negra para combater essa tendência.
Este fenômeno também é visto na América Latina, Ásia, Ilhas Caribenhas e África, e Cabo Verde não é uma exceção. Um repórter do Washington Post, Shankar Vedantam, o autor do livro " O cérebro escondido", explica como nossas mentes inconscientes elegem presidentes, controlam o mercado, travam guerras e salvam nossas vidas. Ele explicou sobre como os “bias” inconscientes afetam nossas decisões e nossos comportamentos diários. Estes fatores determinam quem é contratado, quem é condenado e quem é eleito.
A micro agressão é um conceito que foi cunhado por Dr. Sue, um psicólogo de um país do Oriente Médio, e aparece como estes exemplos. "menina la e preta mas e bonita" referindo-se a uma mulher de cor negra, "Odja, bu ka ta parce ku badiu" referindo-se a um indivíduo da ilha de Santiago. A micro agressão parece benigna porque a declaração é feita para elogiar, mas vem carregada de preconceito contra o grupo a que supostament o sujeito pertence, e para alguns é um insulto. Piadas de mau gosto se parece com o seguinte: O exemplo de uma que ficou famosa na Praia duas ou três décadas atrás. Certa vez, um funcionário da TACV da Praia perguntou se havia passageiros no aeroporto do Sal para Praia, e alguém respondeu nestes termos: "Hoje ka tem ninhum passageiro no aeroporto do Sal, tem so badios".
Insultos raciais são comentários, ou declarações, destinados a difamar, menosprezar e insultar membros de um grupo racial ou étnico, geralmente por aqueles que não são membros desse grupo étnico. É difícil para qualquer caboverdeano pensar de si mesmo como membro de um grupo étnico, diferente de outro caboverdeano de qualquer ilha. Porém, um amigo meu que é bem formado nos EUA, de Santiago, me disse que uma amiga da mãe de sua esposa disse uma vez. "Oh nha fidjo, bu dexa bu fidjo ba casa ku badio!?"
Recentemente, vi indivíduos se referindo abertamente a Santiago como "Badiuland" em um suposto discurso político na plataforma de mídia social, o que é novo, pois a maioria dos políticos sempre evitou tal linguagem no discurso público, deixando-o principalmente para encontros privados.
Em Cabo Verde, esta forma de discriminação e exclusão diminuiu ao longo do tempo desde a Independência. Os insultos pessoais ainda estão presentes, como ainda outras formas de insultos contra mulheres, pessoas com deficiência, etc. Esta forma de exclusão de grupos regionais atenta a diminuir, insultar e perpetua a agressão contra o grupo, ou exclui determinado indivíduo ou grupo. Em Cabo Verde, ela é frequentemente feita de forma engraçada. O engraçado faz as coisas parecerem um pouco leves, benignas, como se estivessemos brincando. Caso alguém ou o individuo objecto do insulto reaja, o melhor que pode acontecer é uma reação de risada, para eliminar o mau gosto. E o pior que pode acontecer é tratar a vítima da discriminação como se ela tivesse defeitos, por exemplo que é irritada, "complexada" ou muito sensível, o que acaba a confirmar o que o agressor ou agressores já acreditavam, antes do insulto. Estes insultos, micro agressões, piadas de maus gosto, aparentemente benignos, podem deitar sobre a vítima pesados danos psicológicos. Ás vezes, isto tem duração pela vida toda, sobretudo para a sua saúde mental. O indivíduo é assim abandonado a sobreviver à agressão às suas próprias custas e recursos pessoais.
Em todas as formas de discriminação a tática é semelhante. A culpa é da vítima. Quando uma agressão, um insulto ou abuso é contra as mulheres, por exemplo, geralmente é encarada como se esta merecesse o insulto ou a agressão. A propria sociedade ou o grupo agressor muitas vezes são apoiados pelo sistema de crença social ou de grupo, tanto homens como mulheres.
Discriminação sistémica
A outra forma de exclusão e discriminação social é o que se chama discriminação sistémica, estrutural ou institucional. O conceito de discriminação sistémica foi cunhado pela primeira vez por Stokely Standiford Churchill Carmichael, que foi um ativista do movimento pelos direitos civis nos EUA nos anos 60. Esta forma é a mais perigosa do que a do nível pessoal. Enquanto a nível pessoal, um indivíduo pode usar seus próprios recursos pessoais para defender a si mesmo e assim pode diminuir o impacto psicológico, como sua autoestima, sua influência pessoal, sua personalidade, sua educação, variáveis económicas, ou simplesmente ignorá-la, etc. A discriminação sistémica opera de forma mais subtil e invisível. Esta é perpetrada pelos chamados burocratas de rua, como banqueiros, policiais, diretores, professores, que tomam decisões dentro de uma instituição, apoiados por uma rede de indivíduos seguindo os mesmos princípios, tendo valores semelhantes dentro de um paradigma nós versus eles. Se o leitor não tem ideia do que eu falo, ou não consegue reconhecer isto como um problema, olhe para seus efeitos na sociedade. Vá olhar em qual bairro cada grupo vive, quais posições eles mantêm naquela sociedade, qual é a probabilidade de movimento de carreira quando competem diretamente no sistema, etc. Seu efeito é real e mata, marginaliza e relega indivíduos a uma extremidade inferior dessa sociedade, com toda a sua implicação.
Isso acontece através do exercício sistémico de exclusão do acesso à boa educação, apoio financeiro, contratos, favores pessoais, acesso a bolsa gratuita, oportunidades de promoção, acesso a cargos de influência, poder político, como um indivíduo se beneficia de oportunidades de programas de moradia planejados, justiça ou acesso a serviços de saúde mental e saúde física, etc. apenas para citar alguns exemplos. Nos EUA desenvolveu-se várias leis em várias instituições como bancos, programas de habitação, escolas, serviços públicos, precisamente para evitar que os indivíduos nas instituições ajam de certa forma que excluam membros de certos grupos.
A discriminação sistémica funciona para colocar todos num pedestal de sobrevivência onde aqueles que pertencem ao grupo menos influente esforçam-se para sobreviver dentro do sistema, aceitando e apoiando esse mesmo sistema. Pois, ele ou ela também será excluído das oportunidades, caso ele ou ela não aderir ao sistema. Portanto, consciente ou inconscientemente, contribui para perpetuar esta forma de discriminação, mesmo contra o grupo a que pertence - mulher, de pele escura, badia, mandjaco, deficiente, ou outra categoria qualquer. Eu podia dar dezenas de exemplos que ilustram este comportamento do caboverdeano nas nossas instituições, mas eu deixo o leitor identificar por si próprio.
Racismo, regionalismo ou colorismo, são todos males sociais que acontecem em Cabo Verde. Podemos adicionar o sexismo, o classismo, ou outra forma de discriminação, todos eles exercem efeitos prejudiciais sobre indivíduos tanto a nível pessoal como a nível de grupo, ou sistémico. A nível pessoal ou individual, eles aparecem como piadas de mau gosto, insultos raciais, micro agressões, etc.; mas sistemicamente, isto opera através de um sistema de exclusão ou preferência que nega aos indivíduos seus direitos básicos de compartilhar as oportunidades que devem estar disponíveis, em equidade e justiça como emprego, educação, oportunidades políticas, económicas e financeiras.
A Independência de um país livre do seu opressor, visa trazer autodeterminação e autogovernação do povo daquele país. Também deve trabalhar para eliminar os males que permanecem após sua independência como resultado da influência colonial, em vez de ignorá-los. Cabo Verde fez importantes progressos, incluindo abordar questões sociais relativas às suas crianças, suas mulheres, os fisicamente incapacitados, mas não abordou adequadamente outras questões de discriminação como discriminação racial. Este trabalho não é trabalho so do governo, é tambem trabalho para o povo propor ajustes e mudanças nas instituições e no estado para uma progressiva inclusão social de todos os seus cidadãos. Nenhuma solução isolada resolverá todos os problemas de uma sociedade mas deve ser um trabalho continuo de lutar pela justiça e pela inclusão social de todos os seus filhos. .
Comentários