
O Tribunal Constitucional não admitiu o recurso de amparo da Câmara Municipal da Praia contra a decisão do Tribunal de Contas que rejeitou o visto de aprovação para a nomeação de Joselina Carvalho como secretária municipal. O coletivo do TC, num acórdão escrito por José Pina Delgado, considera que a CMP não tem qualquer legitimidade para fazer tal pedido, por isso manda arquivar o processo, obrigando a autarquia, com isso, a ter de acatar a sentença inicial do Tribunal de Contas, rejeitando Joselina Carvalho por nomeação ilegal, e tornando nulos todos os actos praticados pela secretária municipal da Praia, desde Agosto de 2022.
“Os juízes do Tribunal Constitucional, reunidos em plenário decidem não admitir o recurso de amparo, por falta de legitimidade do recorrente, ordenando o seu arquivamento”, lê-se na decisão do Acórdão nº 123/2023 do Tribunal Constitucional, com data de 24 de Julho, mas publicado hoje, 1 de Agosto, no Boletim Oficial.
O relatório, com aprovação unânime dos três juízes-conselheiros (José Pina Delgado, relator, João Pinto e Aristides Lima), lembra desde logo que o município da Praia socorreu-se de “direitos fundamentais às pessoas colectivas” para recorrer do Acórdão do Tribunal de Contas (nº1/2023, de 2 de Junho), mantendo a posição de que o presidente da Câmara Municipal tem voto de qualidade em caso de empate nas votações do colégio, argumento que não convenceu o TC que negou antes e depois o visto à nomeação de Joselina Carvalho como secretária municipal em Agosto de 2022.
A autarquia liderada por Francisco Carvalho insistiu nesse despique jurídico e, sabe Santiago Magazine, contratou uma equipa externa à CM, encabeçada por Geraldo Almeida, para avançar com o Recurso de amparo junto do Tribunal Constitucional, no qual alega, por exemplo, que o Tribunal de Contas violou o princípio de igualdade, porquanto “o sistema jurídico cabo-verdiano reconhece a todos os presidentes de órgãos colegiais o direito ao voto de qualidade, em caso de empate na votação”, assim como o TdC teria violado artº 2º e 238º da constituição da República qe assegura a autonomia do poder local e o seu direito à ut-organização.
Só que, o Ministério Público, chamado a emtir parecer no processo, argumentou que a CMP, apesar de respeitar os prazos, “não logrou descortinar qual(ais) o(s) direitos(s), liberdade(s) e garantia(s) constitucional(s) susceptíveis de afectar directa, actual e efecivamente o recorrente, pois que não teria indicado quais os direitos violados, conforme ordena a alínea c) do artigo 8º da Lei do Amparo, referindo apenas que o órgão recorrido violou o princípio democrático consagrado nos artigos 2º e 238º da CRCV, que antes, se constitui num princípio abstrato e transversal”, observou o MP, através do procurador-geral adjunto.
O Tribunal Constitucional, por sua vez, tratou antes de explicar que o recurso de amparo é concebido como um direito fundamental de “requerer ao Tribunal (…) a tutela de (…) diretos, liberdades e garantias”, direito esse “delimitado materialmente”.
Escreve Pina Delgado no Acórdão hoje publicado no BO: “O que se tem verificado até agora é que na maior parte dos casos isso é muito deficientemente articulado, lançando-se para a peça de recurso, sem grande precisão e racionalização, uma pluralidade de condutas a que globalmente se imputam violações de um conjunto diversificado de direitos, e remetendo-os para amparos genéricos ou impossíveis”.
Então conclui, com aprovação dos restantes juízes-conselheiros: “ao integrar um segmento sobre condutas lesivas de direitos e referir-se a actos concretos perpetrados pelo TdC nas conclusões com fórmulas diferentes, o recorrente gerou dúvidas sobre o objecto concreto da sua impugnação, e não formulou de forma clara o amparo pretendido para o restabelecimento de seus direitos”.
Mais, diz o Tribunal Constitucional que a Câmara Municipal da Praia não conseguiu arrolar “um único direito, liberdade e garantia que tenha sido vulnerado pelas condutas do TdC” (…) para mais à frente citar a obra “Recurso Constitucional Alemão e o recurso de Amparo Cabo-verdiano. Uma análise comparativa”, de Aristides Lima que diz que “o argumento é que o Estado não pode ser ao mesmo tempo titular e destinatário de direitos fundamentais”, daí que essas entidades, “não poderão, em princípio, acionar o recurso Constitucional”.
“Em suma, não sendo os Municípios titulares de dreiitos, liberdades e garantias, carece de legitimidade para interpor recurso de amparo, não podendo dar esse pressuposto insuprível por preenchido”.
Joselina Carvalho, recorde-se, foi nomeada secretária municipal da CMP em Agosto do ano passado, por despacho do presidente da CM, Francisco Carvalho, em regime de substituição de José Casimiro de Pina, passando então a acumular as funções de secretária municipal e de directora de Administração Fiscal.
Só que, dois meses depois, em Outubro, o presidente da CMP produziu um outro despacho, publicado no Boletim Oficial (BO), indigitando essa técnica como secretária municipal, com competências de notária. O nome Joselina Carvalho fora, entretanto, rejeitado pelos vereadores MpD e pelo vereador do PAICV, Samilo Moreira, levando Francisco Carvalho a socorrer-se do seu voto de qualidade para fazer passar a nomeação, solicitando para tal o visto obrigatório do Tribunal de Contas, que negou validar esse processo alegando que os presidentes das câmaras municipais não têm direito a voto de qualidade.
Francisco Carvalho recorreu junto do mesmo tribunal, fundamentando que a norma que autoriza o voto de qualidade dos presidentes dos órgãos colegiais “está presente e disseminado no sistema jurídico para todos os órgãos colegiais, em termos que não deixa dúvidas de que se trata de uma norma abraçada pelo sistema e aplicável ao funcionamento de todos os órgãos colegiais”.
O TdC, ainda assim, manteve a sua posição anterior e decidiu julgar improcedente o recurso interposto pela CMP, rejeitando outra vez a nomeação de Joselina Carvalho, por sinal quadro de origem do TdC.
Agora é o Tribunal Cnstitucional a negar admssão de recurso de amparo à CMP, fazendo prevalecer a sentença do Tribunal de Contas. Ora, isso significa que todos os actos praticados por Joselina Carvalho, nomeada pelo presidente da CMP, em Agosto do ano passado, são considerados ilegais e nulos – estarão em causa todos os contratos estabelecidos entre a CMP e terceiros, durante os últimos 10 meses.
Por exemplo, o contrato para a aquisição dos contentores e camiões de lixo, as obras no mercado Sucupira, assim como o Festival da Gamboa, para além de outros, calculados em milhares de contos que terão de ser justificados.
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