
O presidente do CSMJ afirmou esta quarta-feira, 8, que, apesar das deficiências, o sector da justiça está “equilibrado e funcional” e que a reflexão sobre a ineficiência da justiça tem sido feita por pessoas que pouco ou nada percebem do sector.
O presidente do Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ), Bernardino Delgado, fez estas afirmações no seu discurso de abertura do arranque do ano judicial 2021/2022, numa cerimónia realizada no Palácio da Justiça, na Cidade da Praia.
Segundo este magistrado, é hora de lançar um olhar e um novo paradigma na abordagem das questões da justiça em Cabo Verde, tendo desafiados os actores judiciais a fazerem uma análise se realmente existe uma actual e verdadeira crise no sistema da justiça.
“A retórica da crise, ou crise da justiça, tem muitos anos, muitas décadas. É uma retórica que se transmite em outras expressões a ineficiência da justiça, falência da justiça, uma retórica replicada de forma acrítica, por vezes de forma perversa e muitas vezes feita por pessoas que, com o devido respeito, pouco ou nada percebem do sector”, frisou.
O presidente do CSMJ acrescentou ainda que as declarações sobre uma possível ineficiência do sector têm sido feitas igualmente por pessoas resignadas com o desfecho de determinados pleitos nos tribunais, que não viram efectivamente satisfeitas as suas pretensões.
Ao contrário do que muitos repetem até à exaustão sem qualquer base factual no espaço público, prosseguiu, a percepção que os cabo-verdianos têm da justiça está alinhada com esta ideia de equilíbrio funcional, reconhecendo, no entanto, que a principal causa da insatisfação reinante e que constitui uma mais visível injustiça é a continuada lentidão da justiça.
Destacou o aumento da produtividade dos magistrados no ano judicial 2020/2021, que contribuiu para a redução do número de processos julgados, que, por sua vez, “superou” o número de processos que deram entrada nos tribunais, no mesmo período.
No entanto, reconheceu que os “ ganhos significativos” registados só foram possíveis porque houve aumento de produtividade dos juízes e magistrados e a implementação de um conjunto de medidas de gestão por parte do CSMJ nos vários domínios.
O presidente do CSMJ afirmou ainda que o sector da justiça não pretende afirmar-se como qualquer “reserva moral da República”, nem muito menos tem a pretensão de ser “bacteriologicamente pura”, mas sim que se olhe para ela apenas como uma instituição operante que tem as suas fraquezas e virtudes no contexto da democracia cabo-verdiana.
Bernardino Delgado apontou, por outro lado, que as instituições diplomáticas acreditadas em Cabo Verde também reconhecem o profissionalismo e a integridade do sistema judicial cabo-verdiano, integrado numa democracia “estável e funcional”.
Considerou que a justiça ainda não atingiu o patamar ideal defendido por muitas pessoas, frisando, entretanto, que a mesma surge igualmente bem posicionada em rankings internacionais nos aspectos da isenção, independência e imparcialidade.
“Se a justiça está bem posicionada nestes quesitos internacionais, como explicar este brado contínuo de que a justiça não funciona, o que poderá estar por de trás deste alegado descontentamento generalizado facilmente percepcionável por quem está minimamente atento à realidade”, questionou.
“Os problemas existentes são suficientes para sustentar a narrativa de uma crise, ou não serão antes problemas e desafios circunstâncias de uma época tão específica como a nossa, não se está a empolar a situação para legitimar pseudo-reformas, cujo objectivo é apenas e tão só controlar o sistem” e, em última instância, o sentido das decisões dos juízes”, interrogou.
O magistrado acrescentou ainda na sua intervenção que o quadro de pressão a que os tribunais têm sido sujeitos, na comunicação social e nas redes sociais, insta a reflexões de que um dos desafios da justiça cabo-verdiana é precisamente a preservação da independência do poder judicial, enquanto princípio fundamental do Estado de Direito democrático.
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