
O grito ecoou estridente, ali para os lados da Achada de Santo António, mesmo em frente às instalações da Televisão de Cabo Verde. Ecoou firme e decidido pelas vozes de um punhado de jornalistas, como que a dizer não temos medo! A luta pela liberdade de imprensa está de boa saúde, recomenda-se e vai continuar em próximos episódios – assim ficou garantido. Aconteceu na quente tarde desta quarta-feira, onde a cumplicidade foi mais forte que todas as diferenças.
A vigília dos jornalistas aconteceu esta quarta-feira, frente às instalações da Televisão de Cabo Verde (TCV). Os mais céticos perguntarão: “Mas, não estavam poucos?”. Não, estavam os necessários! E se tivermos em conta que o protesto aconteceu pelas 15:00, quando a grande massa dos trabalhadores da empresa estava a trabalhar, até se poderá dizer que estavam muitos. E, como se verá mais adiante, isto é só o início porque, como garantiu o jornalista Carlos Santos, a luta só agora começou.
Cumplicidade e solidariedade
Foi um momento de grande cumplicidade que superou todas as diferenças em função de um bem maior: a luta pela liberdade de imprensa e pela democracia. E, foi ainda, um enternecedor momento de solidariedade ativa, com a presença simbólica da Plataforma Sindical, que foi levar à vigília uma mensagem fundamental nestes tempos cinzentos de diversos autoritarismos: somos todos trabalhadores e estamos unidos! Uma mensagem que nem precisou de ser dita por palavras, estava ali em cada olhar, em cada gesto, em cada toque de pele: estamos juntos.
Juntos contra a ingerência ilegal do Conselho de Administração da Rádio Televisão de Cabo Verde (RTC) nos conteúdos editoriais da TCV, juntos contra o processo disciplinar ilegal infligido à diretora da televisão pública, Dina Ferreira, apenas por ter cumprido as prerrogativas que a lei lhe garante.

A democracia é um ganho que não queremos tenha retrocesso
“Na história da comunicação social cabo-verdiana, uma conquista inegociável, com um percurso digno de registro, nós não podemos aceitar atropelos. Nós não podemos aceitar, sobretudo, algo que nos custa caro, a interferência nos conteúdos”, disse Rosana Almeida aos jornalistas”, acrescentando: “a legislação é clara, toda a legislação que regula a comunicação social é clara, a lei da televisão e a lei da rádio”.
Um dos rostos mais prestigiados da televisão pública, Rosana não tem dúvidas: “isto nunca tinha acontecido antes. A interferência nos conteúdos da rádio e da televisão, ou de outros órgãos de comunicação social, periga a democracia. E a democracia é um ganho que nós não queremos que tenha retrocesso”, sublinhou a jornalista.

Luta vai continuar
Questionado sobre o futuro, caso não se inverta a situação de condicionamento da liberdade de imprensa na RTC, Carlos Santos, uma das vozes mais respeitadas do jornalismo cabo-verdiano, foi claro: “é o início de uma luta, uma luta que não vai acabar nos próximos tempos”.
Considerando que “este Conselho de Administração ultrapassou todos os limites, todas as linhas vermelhas” e, por consequência, já não tem mais a confiança dos trabalhadores”, porque “aquilo que aconteceu é extremamente grave”, Carlos Santos espera que a tutela retire as consequências da conduta desta administração.
“Muita gente pensa que é um problema administrativo, um problema laboral, não é. Este Conselho de Administração atingiu o coração da democracia, a liberdade de imprensa, a liberdade de programação da televisão pública deste país”, disse ainda Carlos Santos.
“Nós temos o apoio da maioria, do coletivo de trabalhadores da RTC. E, portanto, a nossa luta está a começar agora e não vai terminar enquanto a tutela não tome posição em relação a este Conselho da Administração”, disse o jornalista da Rádio de Cabo Verde, deixando um aviso: “sempre que os trabalhadores da RTC se uniram, sempre que foram para a rua, sempre que se bateram em defesa dos seus direitos e interesses profissionais, houve mudanças”, salientou Carlos Santos.
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