A história parece estar mal contada, ou, no mínimo, tem versões contraditórias. Numa carta dirigida ao então presidente da Câmara Municipal da Praia, Óscar Santos, pelo então diretor geral do Património e da Contratação Pública, João Tomar, é pedido que a autarquia faça a doação do terreno do Babilónia. Mais recentemente, o secretário de Estado das Finanças, Alcindo Mota, veio dizer que o Estado adquiriu o terreno em 2020, “reforçando a titularidade dos terrenos” por parte do Estado. Quer dizer, em 2019 é solicitada doação, no ano seguinte o terreno é comprado (já não é doado) para “reforçar a titularidade”?! Mais, há uma incongruência de datas da assinatura do contrato.
Numa missiva dirigida a Óscar Santos, assinada por João Tomar e datada de 04 de fevereiro de 2019, a Direção Geral do Património e da Contratação Pública (DGPCP), tutelada pelo Ministério das Finanças, alegando que o terreno onde se encontram edificadas as 29 moradias do Babilónia “pertence à Câmara Municipal da Praia”, solicita os “bons ofícios” de Óscar Santos para “ordenar a desanexação, transferência gratuita do referido terreno para o Estado de Cabo Verde, a sua inscrição na matriz predial, bem como a remessa da respetiva certidão matricial e planta de localização”.
A certidão matricial e, ao que se sabe, os restantes documentos nunca foram disponibilizados pelo então presidente da Câmara Municipal da Praia (CMP), tão-pouco após a transferência da propriedade do terreno, alegadamente ocorrida a 30 de janeiro de 2020, numa altura em que o então edil ainda se encontrava em funções. E, aqui, ocorre logo a primeira dúvida: por qual razão Óscar Santos não disponibilizou os referidos documentos, incluindo a certidão matricial, que o atual presidente da Câmara, Francisco Carvalho, alega provar que o terreno pertence ao município? Mais adiante se irá perceber como.
Contradições
E, a nada provar (segundo as alegações do Governo), por qual razão se queixam agora de a Câmara não disponibilizar a referida certidão? É uma interrogação pertinente.
Ademais, não faz muito sentido que, o Governo venha solicitar a doação de um terreno que considera como seu, apesar de, contraditoriamente, ter anunciado que o adquiriu em 2020, gratuitamente, supostamente para liquidar dívidas da CMP, embora não referindo de quais dívidas se trata, o que torna o contrato não transparente e, por essa via, poder ser contestado judicialmente.
Data do contrato foi falseada?
A suscitar dúvidas sobre a opacidade do contrato entre a Direção Geral do Património e da Contratação Pública e a Câmara Municipal da Praia, está ainda o número de registo do mesmo (484), porquanto, no mês de janeiro de 2020, o registo de contratos celebrados não excedeu o número máximo de 62. O que faz supor, salvo melhor opinião, que o número 484 foi escolhido aleatoriamente só para constar no meio dos contratos assinados no mês de janeiro. A questão que se coloca é esta: por qual razão, com que propósito? E, para adensar o mistério, o número de registo 484 está próximo do número de contratos assinados no mês de dezembro de 2020, que é, precisamente, 400.
Ainda segundo a nossa fonte na autarquia da capital, “o contrato existente foi elaborado e assinado, de facto, no mês de dezembro (por isso tem número de registo deste mês) e foi inserido no sistema no dia 28 de dezembro”. Ou seja, a fazer fé na referida fonte, o contrato não foi assinado em 30 de janeiro de 2020, mas sim no último mês desse ano. O que, como se percebe, torna nulo o contrato entre a DGPCP e a CMP.
A razão é simples: Francisco Carvalho tomou posse a 20 de dezembro de 2020, sendo que só ele estaria habilitado a assinar este e demais eventuais contratos.
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A equipa do Santiago Magazine