Com apenas 4 anos de idade viajou do Fogo, onde nasceu no dia 28 de setembro de 1965, para a cidade da Praia. Pouco tempo depois, mudou-se para Santa Cruz, concretamente para a cidade de Pedra Badejo, onde cresceu entre homens do mar, agricultores, vendedores, comerciantes e cultores da arte. Sobretudo cultores da música, cujos sons, acordes e melodias o acompanham até o dia de hoje. Estamos a falar de Zé Galvão, o rockeiro de Santa Cruz. O único músico cabo-verdiano que gravou um disco de Rock Kriolu.
Começou cedo na música. Com os garotos da sua infância fez guitarras de lata e compôs a sua primeira música aos 15 anos.
É cantor, compositor e instrumentista. Homem livre, humanista, tributário de uma cultura de djunta mon e partilha que vem dos seus ascentrais, e que seria alavancada pela vida humilde da cidade ribeirinha que é Pedra Badejo, Galvão é um músico eclético, para quem a arte musical na sua universalidade não tem fronteiras e muito menos uma linguagem identitária, fala aos corações com a mesma força e dimensão que uma onda afaga as areias de uma praia de mar e acaricia as rochas que sobem pelas colinas da vida, em qualquer parte do mundo.
Galvão é um filho de Santa Cruz, embora tenha nascido na ilha do Fogo, no concelho de São Filipe. Carrega na alma e na arte os sons das ondas do mar a bater no ancoradouro de pesca do Bulimundo, o chilrear das passarinhas nos coqueiros da Ribeira dos Picos, o repicar de txabetas nos terreiros de Cutelinho, quando, nas noites quentes de julho, mês di Nhu Santiago, os caminhos dos famosos tocadores e batucadeiras de Santiago iam impreterivelmente dar a Pedra Badejo.
É esse ambiente que combina o urbano e o rural numa sinfonia quase celestial, que formataram Galvão, cuja produção musical é o espelho dessa ambivalência e pluralidade, e caldeamento entre o ser e o estar. Como dizia o filosofo espanhol Gasset, “eu sou eu e a minha circunstância”. As circunstâncias de Santa Cruz, as suas influências económicas e culturais – terra de Katxás, do Bulimundo, de Antão Barreto, de Sema Lopi, de Nasia Gomi – medreram o Rockeiro, o cantor, o compositor e o guitarrista, Zé Galvão, assumindo-se eterno cultor do funaná, batuku, finason, morna, coladeira e demais géneros musicais do arquipélago.
Faz hoje 60 anos. Nas palavras de Calú di Guida, Galvão é um músico enorme. E é verdade. Ama a música e os instrumentos musicais, com a inocência de uma criança. Não consegue resistir a um instrumento musical nas montras das lojas, e como uma criança mimada, entra e compra. Só pelo prazer de comprar, de acariciar com as mãos cada instrumento, com o mesmo amor e entrega que um criador de cavalo afaga os macios pelos do seu potro ou égua. Diz que é por vicio, eu diria que é por amor à música, aos instrumentos musicais, esses que fazem milagres em forma de sons, de melodias, de embalos e de mensagens. Porque a música fala sem usar uma única palavra. Fala com a alma, com o coração, com os sentimentos.
E Galvão sabe disso e vive esta experiência todos os dias da sua existência.
Emigrou para os EUA em 1988. Vive nas terras do Tio Sam até hoje. E fez um percurso na música que hoje marca a sua arte e identidade cultural com um impacto e dimensão particularmente respeitosos na comunidade cabo-verdiana na América.
Tendo começado em Pedra Badejo, no conjunto Strong, então constituído por jovens que queriam seguir as pisadas do Katxás, o eterno líder da música tradicional de Santiago e de Cabo Verde, Galvão nunca mais parou, embora não vivendo da música, porém, não vivendo sem ela.
Atuando sempre como vocalista e baixista, Galvão conta com uma participação ativa em vários grupos musicais nos EUA, destacando-se Cave Band (1989-1990), Eco Tropical (1990-1991), Nha Terra(1991), La Tour (1991-1994), Uprising (1994-1997) e os Pecos Band (1995).
Inicia a partir de 2015 uma participação no grupo Narkotx, um conjunto de rock no qual atua como baixista, vocalista e compositor.
Dono de um reportório bastante eclético, Galvão navega com tranquilidade em todos os géneros musicais cabo-verdianos – de funaná a mazurka – sem desprezar o rock e outros estilos e géneros que campeiam por este vasto mundo.
Iniciou nas gravações a solo em 1997, com album Sensual, produzido por Calú di Guida, seu amigo de todos os momentos. 13 anos depois, em 2010, lançaria o álbum In love. Ambos os albuns contam com as suas composições, e de outros criadores como Calú di Guida, Chandinho Dedé, entre outros compositores.
Sempre disponível quando o assunto é música, Zé Calvão tem ao longo dos anos acompanhado vários artistas, percorrendo diferentes Estados Norte Americanos e diversos países.
Sensível e fino observador das realidades que o cercam, Galvão tem feito um percurso musical marcado pela rica herança musical do país, pelos estilos tradicionais e influências modernas que o acompanham nas suas criações e produções artísticas.
Este texto é um modesto reconhecimento e uma homenagem para este cabo-verdiano que tem honrado o nosso país e a nossa cultura ao longo da sua vida, com a simplicidade, dedicação e obediência de um Monge.
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