Falecido ontem, Djirga foi um dos grandes compositores de Cabo Verde, que deixa um tributo à cultura cabo-verdiana, cujo legado nunca será esquecido.
Gregório Xavier Pinto nasceu em Chã-de-Areia, cidade da Praia-ilha de Santiago, no dia 13 de Fevereiro de 1936, filho de Luís Xavier Pinto e de Paulina Pinto Osório.
Ainda em tenra idade, devido à morte do pai, foi levado para o Plateau-Centro da cidade da Praia e aos quinze anos mudou-se para Achada de Santo António, onde fixou definitivamente residência.
Djirga Paulina começou cedo a relevar a sua veia musical. Quando criança, tocava objectos sonoros, a imitar o ritmo do batimento produzido pelo bater da mãe no “Pilon de Guiné”. E a sua primeira composição, sem letra, nasceu precisamente desta cadência.
Adulto veio a aprender a tocar violão com Djonça de Farol e posteriormente descobriu cavaquinho, viola de dez cordas e violino, e obteve conhecimentos teóricos da música.
Instrumentista talentoso – guitarrista marcante do seu tempo – e conceituado compositor, Djirga trabalha com diversos estilos musicais: morna, coladeira, funaná, marcha ao tipo brasileiro, valsa, samba canções ao estilo português, hinos religiosos, etc. Diz, no entanto, ser na morna que encontra o ícone da sua inspiração.
Iniciou-se em 1962, com a coladeira, ‘Barádja mô’, seguido da morna ‘Tina Ingrata’.
Compositor de temática universal, a maior parte das suas músicas lidam, no entanto, com questões do ambiente local, desenvolvidas, na maioria das vezes, com recurso a sátira social, através de crítica humorística, apontando falhas no tecido social e cultural de uma sociedade, visando obter alguma mudança moral:
“Moças di Praia incantádu
P'alguém bem equipádu
És tâ vivi um vida enganádu
És áma rôpa pâ tolera
Si bu dás um bistidinhu di praça
Dja bu luga táxi pâ aluguer
Más bem xintádu qui bu s'tâ
Bu tem qui dâ ôtu lugar
Mi na praça s'falçádu
Cu nha sorizu na denti
Cu nha andar bem marcádu
És djunta na mi sima minhôtu
Pega um, pega quel ôtu
N' dás cu fumo nha canhotu
N' rodiás sima tchitcháru
N’ mostrás ma li qui Praia”.
Foi um compositor que ajudou a evoluir a morna, nos aspectos tanto do ponto de vista musical, quanto a nível poético mantendo, no entanto, a sua estrutura característica. As suas composições descontraídas e estilizadas, combinando elementos tradicionais com influências modernas, marcou uma evolução.
Alargou a temática deste género musical, ao desenvolver um sentimento nostálgico, ao estilo de uma alegia, com alcance expressa numa ideia em forma de lamentação, conseguindo interpretar o sentimento que caracteriza as gentes das ilhas:
“Nhâ terra, mâi piedoza
Mâi angustiadu tchora dor
Di bus fidjus, qui pêrdê bida
Na terra estránhu
Oh! cruel distinu
(...)
Tudu parcêbâ un sorrisu
Mergudjádu na profunda tristéza
Tristi mágua de desesperu
(....)
Tudu parcêba un sorrisu na bida
Mergulhadas na profunda tristeza
Oh! iternidadi bem abrí bus braçus
Bu bem recebés cu iterna alegria
Na procura um pôn ês perdê tudu
Na bida, óh! óh!
Dâs pêrdon di morti tôn cruel
Abri sipultura bistidinhu di flor
Dêxás um momento scuta voz di lamentu
E sentimentu di profundu tristeza
Qui voz di mais s’tâ brada na spáçu
Um afurtunádu stréla cu renovádu luz
Na sprêta s’tába un traidor distruido
(...)”
Embora não seja muito dado a aparecer em festas sociais, em 1975, integrou o grupo cénico “Korda Kaoberdi”, formando com Francisco Fragoso, director artistico do grupo teatral, e Tchim Tabári, a sua troika artística.
Musicou poemas de Kwame Kondé, pseudónimo de Francisco Fragoso, – ‘Sorriso de nha Cretcheu’, erigida em morna, e ‘Balentis di Pidjiguiti’, em coladeira –, e em 1992, concorreu, com letra e música, ao concurso lançado para a substituição do Hino Nacional de Cabo Verde.
Professor de artes e ofícios e de música no ex-Centro de Reabilitação de Crianças Abandonadas da Granja de São Filipe, Djirga ajudou a consagrar vários jovens.
Como professor de música, compôs lindos hinos dedicados aos aprendizes dessa instituição:
“Somos as varas de um florido
Uma verdura a ser assim tratada
Queremos juntar conhecimentos
Até ao nível mais elevado
(…)
Passa o tempo
Transformam-se as ideias
O ganhar a vida
Sem Trabalhar
Abre porta à ruína
À maldade, ao vício e ao crime
(…)”
Construtor de instrumentos musicais, Djirga Paulina foi um compositor, cuja música ficou marcada pela sensibilidade, aspecto que faz dele um dos grandes nomes da música cabo-verdiana.
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