
Um estudo encomendado pela Provedoria de Justiça de Cabo Verde conclui que a Empresa de Mobilidade e Estacionamento da Praia (EMEP) tem actuado em várias ilegalidades, com a cumplicidade da Câmara Municipal da Praia (CMP). Bloquear viaturas com coimas em atraso; colocar guardas municipais a fiscalizar viaturas, sem poder de autoridade para o efeito; inexistência de um processo contraordenacional, aparecem entre as ilegalidades mais graves praticadas por esta empresa que conta com 50% do capital municipal.
Muita tinta já se fez correr sobre o funcionamento e actuação da EMEP. Processos judiciais, manifestações, artigos de opinião de advogados, autoridades do mundo jurídico e de cidadãos comuns perfilam por aqui aos catadupas, porém a empresa continua de pedra e cal, e quem vem assumindo os custos de tudo isso são os proprietários das viaturas que circulam na capital do país.
Todavia, o estudo a que este diário digital teve acesso mostra de forma cristalina que a EMEP e a CMP estão a agir à margem da lei, e em muitos casos, usurpando as competências de outras instituições públicas, nomeadamente, da Direcção Geral dos Transportes Rodoviários (DGTR) e da Polícia Nacional.
Por exemplo, o estudo mostra que a EMEP e a CMP não possuem competências para legais para fiscalizar o funcionamento do trânsito na cidade, uma vez que “o Regulamento Geral de Zonas de Estacionamento de Duração Limitada (RGZEDL) é inaplicável na parte que diz respeito à fiscalização, devendo prevalecer o Código de Estradas (CE)".
Neste contexto, cabe à Polícia Nacional esta incumbência. O estudo é, neste particular, claro, quando diz que “os Guardas Municipais foram equiparados a agentes de autoridades, sem razão válida e legítima e não são Polícias Municipais, pelo que não têm a competência para fiscalizar o Código de Estradas”.
O estudo põe em causa também os modelos de parquímetros instalados na cidade, porque não existe a homologação, aprovação, calibração e aferição antes da entrada em funcionamento dos mesmos, como seria, de resto, recomendável. “O Instituto de Gestão da Qualidade e da Propriedade intelectual (IGQPI) confirma a inexistência de homologação/aprovação, calibração e aferição dos modelos de parquímetros instalados e em serviço, pelo que se está diante de uma situação que consubstancia um ilícito de mera ordenação social, constituindo assim uma contraordenação nos termos do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 43/2015, de 27 de agosto”.
Tal processo, segundo o referido estudo “deverá ser instruído pela Inspeção Geral de Actividades Económicas, que é a entidade competente para fiscalizar a matéria em análise”.
EME e CMP incompetentes
No campo das multas e outras penalizações que a EMEP vem aplicando, o estudo deita por terra todas as acções desta empresa. “O aviso que é colocado nos veículos pelos guardas municipais não pode ser considerado um auto de notícia, por não conter os seus elementos obrigatórios, nomeadamente o nome e a qualidade do agente da autoridade que autua, os factos e as circunstâncias que constituem a infração, a identificação do agente da infração e, quando possível, a indicação de uma testemunha”, observa o estudo, para concluir que “o que consta dos avisos utilizados pela guarda municipal são rubricas que não permitem identificar o agente autuante”.
Por outro lado, “não há sequer o início de um processo contraordenacional”, sugere o estudo para explicar que “ainda que se considere que o processo se inicia com o simples aviso, continua a não existir um processo contraordenacional por não se respeitarem as imposições legais referentes ao direito de defesa e por não existir uma decisão de aplicação de coima”.
Para agravar ainda mais a situação, o estudo conclui que nem a EMP e nem a CMP têm e nunca tiveram competências para instrução de processos de contraordenação. “Com a aprovação da Lei n.º 13/IX/2017, de 4 de julho, a foi reconfirmada competência exclusiva da DGTR, prevista já no Código de Estradas, para a instrução dos processos de contraordenações”, regista o documento.
Ademais, “a EMEP tem vindo a coagir ao pagamento de supostas coimas já prescritas, mas ainda que houvesse um processo de contraordenação, a EMEP não poderia cobrar coimas e muito menos bloquear viaturas se aquelas já estivessem prescritas conforme os artigos 34.º, 35.º e 36.º do regime jurídico das contraordenações e do artigo 159.º do CE”, escreve o estudo, afirmando que “quanto aos bloqueamentos por dívidas em atraso, estamos perante uma ilegalidade visto que a administração, neste caso concreto, não tem o privilégio de execução prévia pois que na legislação referente a esta matéria não existe esta possibilidade de bloqueamentos para cobrança de dívidas e por isso, caso a EMEP pretenda proceder à cobrança de eventuais dívidas deverá recorrer à ação executiva para cobrança de quantia certa”.
CMP cúmplice
A provedoria da Justiça terá encomendado este estudo, para dar respostas a diversas queixas dos utentes desta cidade que “desde 2014 vêm sendo apresentadas ao Provedor de Justiça. A EMEP conta com 50% de capital da CMP, sendo por isso esta edilidade considerada uma das principais responsáveis pela gestão desta empresa.
Neste quadro, o documento que Santiago Magazine vem citando regista que “a criação da EMEP tem a ver com as funções de uma cidade e, se é verdade que o grau de participação da Edilidade praiense (50%) em si mesma não a torna juridicamente responsável pelos actos de gestão daquela empresa, não é menos verdade que são a Câmara Municipal da Praia e a Assembleia Municipal quem tem de responder perante os Praienses pela política e orientação geral de EMEP”.
A Provedoria de Justiça entende que “nenhuma orientação prevalece sem a anuência de 50% das ações de uma empresa, até porque, neste caso, é razoável admitir-se que a EMEP prossegue interesses e objetivos do Município da Praia”, defendendo que “essa responsabilidade é acrescida pelo facto de não existir uma entidade reguladora que se ocupe das actividades da EMEP”.
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