A construção é imponente. Vai de uma rua a outra, numa área superior a 1.500 metros quadrados, e está plantada na rua principal da cidade de Sal Rei, na avenida 4 de julho, ao lado do Banco Inter-atlântico. Propriedade de um comerciante chinês, que o terá comprado por 44 mil contos no ex-autarca boa-vistense, José Pinto Almeida, este que é visto como o político que fez vários negócios fundiários em benefício próprio e dos seus familiares e amigos próximos.
Na cidade de Sal Rei as conversas giram, indecisas, à volta da imponente construção e do seu simbolismo na produção de certezas relacionadas com a corrupção, que ao longo dos anos, a população daquela ilha vinha assistindo, impotente, uma vez que as autoridades de fiscalização, e do poder judicial, não conseguiram fazer nada, ou, quem sabe, não quiseram fazer.
Na verdade, os ecos de esquartejamento fundiário da ilha, em proveito de um grupo próximo do ex-autarca Pinto Almeida e do próprio partido a que pertence, o MpD, terão chegado a todos os cantos do arquipélago e da diáspora, por obra da facilidade que as redes sociais trouxeram ao processo de comunicação, nesta era das TICs.
Entre os denunciantes, sobressai o nome do empresário e comerciante, Sergio Corra, hoje candidato independente nas listas do Partido Popular às eleições legislativas de 18 de abril. Mas também vale lembrar que mesmo o ex-presidente da CMBV, José Luís Santos, havia denunciado em certas ocasiões certas atuações dos representantes do poder local então instalados na ilha e que considerava lesivas aos interesses das suas populações, posição que inclusive o terá coagido a entrar em dissidência com a Câmara liderada por Pinto Almeida, numa altura em desempenhava as funções de presidente da Assembleia Municipal, em acumulação com as de deputado do MpD pelo círculo eleitoral da ilha das dunas.
Recorde-se que José Luís Santos fez-se eleger em 2016 com uma candidatura independente – BASTA. Aliás, logo que empossado, Santos solicitou uma auditoria externa junto da empresa PWC para averiguar a gestão do seu antigo comparsa, José Pinto Almeida. No entanto, tal auditoria, embora realizada, ficou em águas de bacalhau. Não se conhece os seus resultados, e do apuramento que se fez, ou não se fez, a ilha até ainda aguarda por um feedback.
A este propósito, muitos críticos na ilha, apontam o dedo ao próprio José Luís Santos, a quem debitam responsabilidades pelo facto dos supostos actos corruptos praticados por José Pinto Almeida nunca terem sido tratados e resolvidos no quadro da auditoria ou outros processos legais previstos no ordenamento jurídico cabo-verdiano, porque, acusam, ele mesmo terá entrado no mesmo caminho do seu antecessor no que diz respeito aos negócios dos terrenos da ilha.
Explicando, José Luís Santos não encontrou terrenos para vender – Almeida havia vendido quase tudo. Durante a campanha para as autárquicas de 2016, em que saiu vencedor, ele chegou mesmo a lamentar perante a comunicação social, que o seu então adversário já tinha vendido todos os terrenos e quem viria a seguir teria dificuldades com as receitas oriundas de vendas dos terrenos municipais.
No entanto, uma denuncia de Sergio Corra, dá como certo que José Luís Santos vendeu ao seu vereador Aristides Mosso, uma grande quantidade de terreno situada numa das zonas consideradas nobres da cidade, conhecida por Alameda. Ao que consta, a CMBV tinha uma dívida para com Aristides, gerente da empresa Oásis, e a forma encontrada para o pagamento dessa dívida foi conceder os terrenos da Alameda ao Empresário, que na altura desempenhava as funções de vereador.
Esse negócio, alegam os interlocutores deste diário digital, acabou por amarrar definitivamente José Luís Santos às práticas corruptas do seu antecessor
Em fevereiro de 2020, Santiago Magazine havia publicado um texto sobre a corrupção praticada por José Pinto Almeida, sob o título “Boa Vista. Uma ilha esquartejada pela corrupção”.
Na ocasião, o jornal havia avançado que José Pinto Almeida, com a sua esposa, Maria Ribeiro Marques Pinto, o seu irmão, Valentim Almeida Pinto, o vereador, Osvaldino Silva Évora, o diretor do Gabinete Técnico Municipal, Jorge Teixeira, e o assessor Paulo Santos, teriam lesado a ilha da Boa Vista em qualquer coisa como 304 mil contos em negócios de terrenos para benefícios próprios.
As denúncias desse negócio tinham como fonte principal o comerciante e empresário, Sergio Corra, e nesse artigo o jornal havia sugerido de que o exercício de cidadania que esse homem, pagador de impostos, vinha demonstrando, se não servisse para acordar a terceira maior ilha do país, que servisse ao menos para despertar o Governo, o Parlamento e as instâncias judiciais, sobre a necessidade de se tomar medidas, quanto mais não seja para preservar a honra das instituições democráticas e apregoar o bom nome do país junto da comunidade internacional.
Com efeito, nas denúncias de Sérgio Corra, que facultou boa parte da documentação que Santiago Magazine teve acesso, dava conta que o antigo presidente da Câmara Municipal da Boa Vista, José Pinto Almeida, teria adquirido cerca dois lotes de 1.548 metros quadrados de terreno, na cidade de Sal Rei, sendo que um desses lotes destinava-se à construção do Lar de estudantes.
Esses dois terrenos, a crer nas contas do empresário/denunciante, valem cerca de 70 mil contos, se vendidos em hasta pública, como manda a lei.
Entretanto, as denúncias de Corra, apontam que José Pinto Almeida teria pago cerca de 2 mil e 700 contos, que é o preço praticado pela Câmara Municipal. Feitas as contas, esse antigo autarca terá lesado a sua ilha em mais de 67 mil contos.
Segundo fontes deste jornal, José Pinto Almeida terá conseguido vender o terreno onde hoje está a ser edificado o centro comercial, ao lado do Banco Interatlântico, por cerca de 44 mil contos. Pelo que, para grande parte dos boa-vistenses este centro comercial é o primeiro testemunho da corrupção do sistema MpD na ilha da Boa Vista.
As tentativas deste diário digital para ouvir os visados neste processo resultaram-se infrutíferas.
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