Aviso: para quem tem preguiça de ler, faça um esforço, não é tão longo.
Esta pandemia proporcionou a todos, a chave que comanda tudo, o tempo. Não que é que não o tínhamos, simplesmente não usufruímos dele como deve ser.
Falo por experiência própria. Eu, Benisia, usei este tempo para pensar em várias coisas, e fiquei triste e preocupada com aspetos extremamente importantes. Um dos aspetos foi do quanto preguiçosa, e passiva a minha geração e as vindouras estão sendo. Porquê que eu digo isto. Nós das gerações dos anos 90 até 2010, estamos a ter ferramentas e tecnologias que pessoas das gerações anteriores nunca tiveram.
Mas infelizmente não estamos a dar bom uso delas, usando-as na maioria das vezes em coisas fúteis, superficiais e momentâneas (desculpem a redundância). Fico a pensar, as outras gerações fizeram tanto com tão pouco, e nós com tudo o que estamos a fazer?
Isto é por toda a parte, mas falando concretamente de Cabo Verde, todos já ouviram a frase “os jovens são o futuro de Cabo Verde”. Esta frase soa-me no mínimo preocupante, pois a maioria está a ser levada pela lei do comodismo, “passivismo”, do seguir a moda de fazer algum post quando acontece algo, do “as coisas não estão bem, mas vai aparecer alguém para as resolver”. Do “mandar bocas nas redes sociais” e depois não fazer absolutamente nada. Porque agora a moda é acontecer algo, e nem é preciso assistir o jornal “pode se ver de vez enquanto”, pois é só entrar no Facebook e ver alguns posts, juntar as peças e tem-se a notícia montada.
Eu acho muito bem as pessoas darem suas opiniões, criticarem o sistema educacional de Cabo Verde, principalmente o ensino superior, falarem sobre o sistema de saúde, sobre os transportes tanto marítimo como aéreo, sobre a economia do país e o desenvolvimento de cada ilha (em todos as áreas), e outros aspetos.
Mas pergunto, quantos jovens na faixa etária dos 18 aos 30 anos se preocupam? Se preocupares as pessoas pensam logo que essa preocupação está a ser movida por interesse, que andas na política, como se fosse algo negativo. Nem queria tocar neste ponto, mas tem de ser, pois a política em si é a força motriz para resolver os vários desafios que existem em Cabo Verde. Mas não vou debruçar sobre isto, hoje não.
Voltando aos jovens, a “nós”. Quantos jovens pensam em tentar construir um Cabo Verde melhor, quantos jovens querem dar o seu contributo para o desenvolvimento do país? Este processo começa com uma grande decisão, na maioria das vezes tomada sem um planeamento.
Aos que decidem ingressar numa universidade, a escolha do curso é baseada em quê? Este curso dá dinheiro? Pessoas com este curso têm “status” na sociedade? Uma terceira pessoa influenciou a decisão? O meu país está a precisar desenvolver esta área? Talvez porque não se conseguiu fazer o que se preferia, mas “ao menos estou a fazer um curso” e por aí. Digo isto porque há vários estudantes que ainda na fase final, não sabem a finalidade do que estão a fazer.
Em Cabo Verde há áreas que já saturaram à anos, enquanto noutras há falta de pessoas. Mas continuam abrindo os cursos, iludindo os jovens com um diploma que depois não será utilizado. Mas reflito de novo, será que nós não temos capacidade suficiente para analisar algo e tomar uma decisão que influenciará a nossa vida por completo? De que vale, desperdiçar tempo, dinheiro, paciência e saúde mental em algo que não trará frutos. E depois o que acontece, temos várias pessoas “certificadas”, sem serem qualificadas. Com pensamentos assim, todo o percurso académico será condicionado.
Temos estudantes universitários que não criam, não criticam, não aceitam críticas, não oferecem nada ao meio universitário. Apenas absorvem tudo, e depois libertam... Isto está a se transformar numa bola de neve, que cresce com o passar dos anos. Bola de neve influenciada também pela política de algumas universidades que vêm o ensino superior como uma “extensão do secundário”.
Há cursos que primam mais pela quantidade do que a qualidade, ou seja há toda uma rede complexa, que se o jovem for ativo e não tiver medo de falar, de criticar, pode ser quebrada. Se não for, o resultado será visível, profissionais insatisfeitos, serviços mal prestados, governantes incapacitados, uma sociedade fracassada.
Digo isto num país onde a propina mínima a ser paga equivale a mais de 50% do salário mínimo, onde os transportes que ligam as ilhas estão cada vez mais caras que viajar dentro da Europa. Onde és julgado pela cor política (alguns já devem estar a pensar, a qual devo pertencer), pela tua ilha, por seres filho de sicrano e fulana, etc. E ainda quando o grupo da minoria começa a fazer críticas, começam os pensamentos “já quer aparecer”.
Eu escolhi falar, criticar, e quero desenvolver o meus país. Quero que os meus filhos, sobrinhos, netos, e bisnetos tenham a escolha de viver ou não em Cabo Verde, de estudar ou não em Cabo Verde. Quero que as gerações vindouras tenham a opção de escolha, não que sejam forçados devido as condições do país. Quero e vou fazer o possível para tal, porque sou cabo-verdiana, tenho capacidades, tenho ferramentas, força de vontade e tenho a certeza que não sou a única.
*Estudante de Engenharia Química e Biológica
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