"Há quem ache que a manifestação de desconforto do Presidente da Câmara da capital Francisco Carvalho e do responsável do PAICV na Praia é exagerada e descabida, mas dou-lhes razão e é preciso indignar-se, sim, quando necessário e chamarmos os bois pelos nomes. Este nosso árbitro escolheu o momento em que a câmara da Praia está sob fogo cruzado, disparado por pessoas que pertenciam à Câmara cessante, quando já não tem tempo nem poder para fazer nada para se reunir com as pessoas".
No nosso sistema político, o Presidente da República não governa, no entanto, a Constituição da República concede-lhe poderes que uns consideram insuficientes, outros suficientes e há até quem os considere muitos. É um árbitro, representa a nação e jura no seu ato de posse respeitar e fazer respeitar a Constituição.
O país já teve desde 1975 quatro presidentes da República, cada um com o seu estilo de exercício do poder. Uns mais interventivos que outros, uns mais populares e até outros com mais apetência para viagens nacionais e internacionais do que influenciar o governo para a resolução de problemas candentes do país.
Isto vem a propósito de uma pequena “polémica” ou indignação na Praia por parte de alguns seguimentos da nossa sociedade, porque o Presidente da República resolveu reunir-se com os funcionários do saneamento das Câmaras de Santiago. Há quem ache que a manifestação de desconforto do Presidente da Câmara da capital Francisco Carvalho e do responsável do PAICV na Praia é exagerada e descabida, mas dou-lhes razão e é preciso indignar-se, sim, quando necessário e chamarmos os bois pelos nomes.
O nosso Presidente da República, enquanto árbitro, está a 2 (dois) meses de pendurar o apito, porque vai completar 10 anos no poder e a Constituição não lhe permite um 3º mandato.
Neste caso, o árbitro, no fim da sua carreira e às vésperas de ir para o seu repouso, solicita encontros com jogadores ou equipa técnica com o intuito se despedir ou pedir desculpas por eventuais erros cometidos durante o seu tempo de arbitragem.
Este nosso árbitro escolheu o momento em que a câmara da Praia está sob fogo cruzado, disparado por pessoas que pertenciam à Câmara cessante, quando já não tem tempo nem poder para fazer nada para se reunir com as pessoas.
Se realmente o objetivo era ajudar, porque não pediu um encontro com os presidentes das câmaras ou os diretores do saneamento? Os funcionários das restantes câmaras de Santiago só foram convocados como disfarce. O objetivo era a Câmara da Praia.
Se essa iniciativa partiu dos seus conselheiros, foi mal aconselhado e se sua, o nosso árbitro teve pouca sorte nas vésperas de pendurar o apito.
Vejamos várias oportunidades que este nosso árbitro PR teve de se reunir com pessoas e arbitrar durante 10 anos do seu mandato e o não fez:
Não se reuniu com o pai, a viúva e os filhos do cidadão nacional, Zezito dente de ouro, assassinado numa noite em plena avenida em Palmarejo. A esse cidadão não foi dado a chance de, em tribunal, defender a sua inocência ante um crime que lhe imputaram, mais, o nosso árbitro nunca se pronunciou sobre o caso que tem um ministro indiciado e que até hoje ninguém se sentou no banco dos réus para explicar as circunstâncias da execução. Infelizmente, nem a Comissão Nacional dos Direitos Humanos e Cidadania nem a Ordem dos Advogados proferiu uma única palavra, que eu tenha ouvido, até hoje.
O PR não se reuniu em 2014 com os desalojados de Chã das Caldeiras que ficaram ao Deus dará, aquando da erupção vulcânica.
As vítimas mortais do navio Vicente que se afundou no Porto de Vale dos Cavaleiros no Fogo, apesar de muitas chamadas de atenção pela UCID das imensas dificuldades que os familiares estavam a passar, não tiveram a mesma sorte que os funcionários de saneamento das Câmaras.
O Presidente da República, enquanto, Comandante Supremo das Forças Armadas, chegou a convocar os familiares dos 8 (oito) militares e 3 civis entre os quais dois espanhóis, assassinados em Monte Txota em 25 de Abril de 2016, para conhecer o seu drama?
O PR chegou a reunir-se com os familiares das crianças Nina e Filú e adultos desaparecidos na Praia em 2017 e 2018 para saber como é que têm vivido esse calvário?
Como Comandante Supremo das Forças Armadas não se reuniu com os soldados vítimas nem com seus familiares aquando do escândalo sexual e tortura tornados públicos no mês de maio, ocorridos dentro das instalações militares.
Certamente, o inquérito de urgência muito propalado na altura que foi instaurado nas FA sairá após o nosso árbitro ter passado o apito para um novo árbitro.
Alguém já viu o Presidente da República reunido com a população de Achada Grande Trás, Castelão, Coqueiros, Achada Mato, Ponta d´Água, Jamaica, Safende e outros bairros da capital que estão sitiados por causa da onda de criminalidade que vem assolando a capital do país?
Portanto, meus senhores, como vimos, ocasião e motivos para reuniões não faltaram ao nosso árbitro. Esse encontro e outros que poderão estar na calha, quando faltam dois meses para o fim do mandato, são extemporâneos e assemelham, repito, assemelham, a algo encomendado e têm outra finalidade.
Neste momento, deve aproveitar as novas tecnologias de informação e enviar mensagens de despedidas aos cabo-verdianos dentro e fora do país, a fim de poupar recursos que tanta falta fazem em tempos de pandemia e crise.
Aproveito a oportunidade para lhe formular os votos de saúde e ótimo retiro.
Praia, 15 de agosto de 2021
Elias Silva
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