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"A Escola é nossa". Carta dos professores da Escola Secundária Napoleão Fernandes ao ME
Ponto de Vista

"A Escola é nossa". Carta dos professores da Escola Secundária Napoleão Fernandes ao ME

Os signatários da presente exposição, professores do agrupamento com sede na Escola Secundária Armando Napoleão Fernandes, vêm pela presente expor à comunicação social a denúncia de má gestão pedagógica e administrativa na Escola Secundária Armando Napoleão Fernandes feita à inspeção com o conhecimento do ministério da educação e do diretor em causa, no dia 17 de outubro deste ano até o momento sem resposta.

C/c.: Sua Excelência a Ministra da Educação, Família e Inclusão Social

         Delegado do Ministério da Educação de Santa Catarina

         Diretor do agrupamento 3 com sede na Escola Armando Napoleão Fernandes

 

Exmo. Senhor Inspetor Geral da Educação,

Cordiais saudações!

Convém, primeiramente, destacar que a nossa ação se fundamenta unicamente na procura do bem da nossa escola, no exercício de uma cidadania comprometida e na procura de soluções para um ambiente educativo saudável e proporcionador de bons resultados no quadro dos desafios largamente assumidos pelo sistema educativo cabo-verdiano. Portanto, não constitui nossa intenção atacar ninguém. Queremos o bem da nossa comunidade educativa. Defendemos a construção comprometida de soluções plurais para a mesma; a existência de um ambiente de trabalho agradável; e o respeito pelos princípios básicos do exercício da docência e da gestão educativa.

Desta forma, Excelentíssimo Senhor Inspetor-Geral, rogamos a vossa atenção para os aspetos seguintes:

  1. O Conselho Diretivo da escola, sobretudo na pessoa do seu presidente, não tem vindo a promover um bom ambiente de trabalho, contrariando as regras básicas da boa convivência e de liderança das instituições educativas, agindo em contramão com os vários dispositivos legais que regulam o exercício de funções do órgão em questão (vide, por exemplo, a alínea k) do Art. 25º, do Regime de Organização e Gestão dos Estabelecimentos de Ensino Secundário. 

Vários exemplos suportam o referido no ponto 1. Primeiramente, não nos parece normal, apesar de ser legítimo, que o Senhor Presidente do Conselho Diretivo mude 3 elementos do Conselho por ele livremente constituído em menos de um (1) ano, acrescido do fato dos membros substituídos terem tido, segundo a opinião da maioria dos docentes, um desempenho positivo e de terem estabelecido excelentes relações profissionais e humanas com os demais elementos da comunidade educativa.

Em segundo lugar, as inadequadas estratégias relacionais e comunicativas que vêm sendo utilizadas pelo Senhor Presidente do Conselho Diretivo têm criado, desde a primeira reunião de apresentação, descontentamento generalizado. Com efeito, a linguagem utilizada pelo mesmo, a falta de respeito que conscientemente ou inconscientemente as suas intervenções veiculam, têm provocado reações negativas por parte de todos os docentes. Para elucidar essas assunções, sugerimos uma leitura cuidadosa das atas das reuniões gerais ou a recolha de opiniões junto dos docentes e demais funcionários da instituição. Ousamos afirmar que o Senhor Presidente do Conselho Diretivo passa a mensagem (consciente e/ou inconscientemente) que faz aquilo que entende, aproximando-se de situações de ditadura. De certo modo, realizam-se exercícios de simulacro de audição da comunidade educativa. Dizemos isso porque depois de várias tentativas de melhoria do ambiente da comunidade educativa, volta-se ao estado de “eu posso e faço”.  Da forma como o Senhor Presidente do Conselho Diretivo age, é como se a escola fosse “coisa sua”.

2- No presente ano letivo, “erros” graves na elaboração dos horários foram cometidos. Não há elementos objetivos para se acreditar que por detrás dos mesmos encontram-se apenas interesses institucionais. Falamos de “falhas” que atropelam a boa gestão pedagógica e o desempenho do docente; que condicionam a repartição de horas de trabalho de acordo com o legalmente estabelecido pelo Estatuto do Pessoal Docente; que demostram uma certa incapacidade da direção em aproveitar adequadamente os recursos humanos disponíveis, nas áreas que supostamente estão melhor preparados. Vários exemplos podem ser apresentados neste quesito. Desde de logo, alguns professores receberam horário com seis tempos letivos diários, com 23 tempos letivos, agravado pelas deslocações aos agrupamentos de Achada Lém e Ribeira da Barca para lecionarem nas turmas do 5º e 7º anos, no mesmo dia em que lecionam na ESANF. Às professoras são-lhes negadas o horário de amamentação ou quando não, só o conseguem depois de várias tentativas de conversações, às vezes conflituosas, com o Senhor Presidente do Conselho Diretivo. Horário desumano para o professor (tempo completo ou quase, em duas escolas, 3 disciplinas, 3 níveis e misto). O professor não tem folga, porque esse tempo serve para deslocar às outras escolas. Com tudo isso, acreditamos que se está a condicionar a qualidade das aprendizagens. Criam-se situações de permanente atritos que não favorece os alunos. É igualmente de gravidade imensurável caso as mesmas “falhas” não forem cometidas pela atitude de “eu posso e mando”, mas sim pelo desconhecimento de princípios básicos da gestão pedagógica. Os desafios do nosso sistema educativo atual requerem gestores com competências técnicas, pedagógicas e relacionais adequadas.

3- Não menos importante são as irregularidades na avaliação do desempenho dos professores do ano letivo que ora terminou. Efetivamente, o presente Conselho Diretivo tentou edificar uma “nova” estratégia de avaliação, marcando reuniões presenciais nas quais a equipa diretiva e os coordenadores disciplinares opinariam, com base nos elementos recolhidos durante o ano letivo, sobre as propostas de autoavaliação feitas pelos professores. Com efeito, depois de preenchidas as fichas de avaliação, discutidas e acertadas as notas entre os coordenadores e o diretor, este, sem dar cavaco aos demais elementos do Conselho Diretivo, alterou as mesmas. No último Conselho Pedagógico alguns coordenadores colocaram sobre a mesa a referida questão tendo recebido como respostas do Senhor Diretor de agrupamento palavras no mínimo ofensivas (ex. “banana”), que roçam a leviandade e que em nada dignificam o exercício do cargo e a nossa comunidade educativa em geral. Acreditamos que só não tem surgido mais situações conflituosas relativamente à avaliação porque alguns docentes têm optado por não discutir as mesmas avaliações com o Senhor Diretor. Em resumo, as situações aqui relatadas retratam uma tremenda falta de jeito do responsável da instituição na procura de caminhos para uma boa convivência e salvaguarda dos interesses da instituição;

  1. A direção exerce constantemente intimidação moral e abuso de poder. Nos ameaça e intimida, quando reclamamos do horário, ironicamente nos pede para entregar o mesmo e ir para casa, afirmando que nos faz um favor ao facultar o horário de trabalho. Isso mostra que o Senhor Diretor é um ilustre desconhecedor das leis e normas que regulam a função docente. O Senhor Diretor chega a pensar que o poder de decidir sobre a vida profissional de um docente é uma prerrogativa sua;
  1. Não há o respeito por algumas orientações do Ministério da Educação. No corrente ano letivo tirou do EIO e do Gabinete de Orientação Educativa o único psicólogo da escola, deixando a comunidade educativa sem o serviço de psicologia. Dito de outra forma: por capricho próprio e quiçá pela dificuldade de aceitar perspetivas outras, o Senhor Diretor acha normal desfazer-se de um docente e técnico que tem recebido inúmeras formações de capacitação visando materializar os desafios assumidos pelo ministério de educação. Não se entende tal medida. Não se compreende tal estratégia de gestão de recursos humanos disponíveis na escola;
  1. O início do ano letivo enfrentou dificuldades fora do normal. É certo que as medidas introduzidas pelo Ministério da Educação concorreram para tal. Contudo, não é menos certo que o avolumar das dificuldades iniciais é fruto evidente de uma fraca capacidade organizativa, de gestão e sobretudo de promoção de um ambiente laboral de comprometimento de todos os atores em presença.  Aclaramos isso com exemplos simples e básicos: a escola não desenvolveu atividades na semana cívica. A escola não demonstrou capacidade de persuadir os alunos (sobretudos os do ensino secundário) a aparecerem na primeira semana de aulas. Os professores ficaram de mãos atadas pois os livros de pontos foram disponibilizados tardiamente. 

 

Excelentíssimo Senhor Inspetor-Geral,

Muitas outras situações poderiam ser apresentadas. Sugerimos uma leitura atenciosa das atas das reuniões realizadas por vários órgãos internos da escola. É nossa convicção que da leitura sugerida várias conclusões poderão ser extraídas. Primeiramente, concluirá que as modalidades de comunicação que vêm sendo utilizadas pelo Senhor Diretor não dignificam o cargo, os docentes, a comunidade educativa e o sistema educativo nacional em geral. Em segundo lugar, as mesmas atas evidenciarão as várias propostas que os vários órgãos da escola têm sugerido e que, entretanto, são por e simplesmente marginalizadas.

Portanto, não se pode queixar-se da falta de abertura dos professores em participar, sobretudo inicialmente. Em terceiro lugar, não podíamos deixar de dizer que a gestão educativa, hoje em dia mais do que nunca, faz-se com know-how específico da área. Ou seja, não nos parece conveniente termos gestores que as suas atuações ameaçam seriamente o próprio estádio do desenvolvimento da educação enquanto ciência e, particularmente os conhecimentos acumulados pelo país no seu fazer educativo. Como se não bastasse, indícios de arrogância, de falta de humildade, de prepotência são adicionados à tal debilidade científica da área de gestão pedagógica.

Em razão dessas reclamações, solicitamos da inspeção-geral e da ministra da educação o máximo empenho e urgência em averiguar a situação do agrupamento com sede em ESANF e tomar as medidas legalmente previstas. Repetimos: não nos interessa beliscar a ninguém. Contudo, não podemos fugir das nossas responsabilidades profissionais.  A escola é nossa. Ela deve ser gerida com perspetivas plurais. Estas, não podem ser encaradas como inconveniências. Muito pelo contrário, constituem mais-valia que devem ser sabiamente geridas e potencializadas. O nosso complexo educativo precisa de sinergias visando vencer as várias dificuldades e desafios que enfrenta. Assumimos as situações aqui descritas com toda frontalidade, sentido de responsabilidade e os superiores interesses da comunidade educativa afetada.

Melhores cumprimentos,

Os professores

ESCOLA SECUNDÁRIA

ARMANDO NAPOLEÃO FERNANDES

Achada Falcão, Santa Catarina, 10 de outubro de 2017.

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Redação