O líder da bancada parlamentar do PAICV, Rui Semedo, disse hoje estar a parecer que nos últimos tempos se tentou mudar os contornos dos pilares essenciais da política externa cabo-verdiana e sem acautelar os ganhos já conseguidos.
Rui Semedo, que falava no parlamento na abertura da interpelação ao Governo sobre a política externa, afirmou ainda que não se está a acautelar “os enormes e complexos problemas que se colocam ao mundo mais global e com desafios de contornos imprevisíveis”.
“As consequências das mudanças encetadas parecem conduzir-nos ao que muitos já chamam de deriva diplomática, uma deriva que começou também com o estabelecido no próprio Programa do Governo”, prosseguiu o presidente do grupo parlamentar do PAICV.
Ainda nas suas declarações, Rui Semedo relembrou que no debate do Programa do Governo, o seu partido tinha chamado atenção por “alguns pormenores” que estariam a desviar o País de uma tradição cuidada de tratamento dos documentos fundamentais e estratégicos como é o programa do Governo.
“Parece detalhe, mas quando colocamos num documento desta natureza a questão do “mestiço” parece que estaríamos a dar ênfase a uma política externa baseada na raça ou quando damos destaque a questão da “civilização ocidental judaico-cristã” que indicia o cunho particular à dimensão cultural ou mesmo religiosa à nossa política externa, onde contam os valores da igualdade, dos interesses neste mundo que tende a ser global, estamos a emitir sinais que poderão não ser compreensíveis para um país que já fez algumas décadas de percurso diplomático”, disse.
Uma outra “dimensão da deriva”, referiu, é a ligeireza como as questões passaram a ser tratadas como ficou patente na condução do dossiê da nossa candidatura a CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental).
“Não se desencadeou um diálogo nacional, não se acautelou da escolha do candidato com o perfil adequado, permitiu-se a multiplicidade de candidaturas sem se preocupar com a definição de critérios claros e rigorosos (…) e não se aproveitou convenientemente os recursos humanos disponíveis para uma acção diplomática junto do País e dos seus responsáveis. Aqui mais uma vez lembramos que o próprio deputado Orlando Dias [MpD] teria dito que o processo foi mal conduzido”, completou.
Rui Semedo considerou ainda que foi uma “oportunidade perdida” a candidatura de Cabo Verde à Comissão Económica das Nações Unidas para África (UNECA), “com dissintonia e perdas para o País”.
“Uma outra deriva é a visita de Viktor Orbám, primeiro-ministro da Hungria, uma personalidade que se manifesta abertamente hostil à recepção de migrantes que diz poderem dissolver a identidade da Hungria e de toda a Europa para além de ser considerado, em certos meios, como um dos líderes europeus mais xenófobos e de extrema-direita”, completou.
Rui Semedo afirmou ainda que “uma coisa clara é a relação entre Estados” e que “outra coisa bem diferente é a relação de cumplicidade, de amizade e de confiança”.
“A mais recente deriva tornada pública é a nomeação de um casal de cônsules ligados à extrema-direita que abriu um escândalo e provocou a demissão do Ministro dos Negócios Estrangeiros”, citou.
Comentários