O Vice-Primeiro Ministro afirmou esta manhã, no Parlamento, que o Orçamento de Estado propõe, em 2020, converter o direito ao uso de viaturas por parte de titulares de cargos de chefia num subsídio, "o que trará mais granhos orçamentais". A proposta avançada por Olavo Correia surgiu na sequência de acusações da oposição sobre a “má utilização” das viaturas do Estado, com realce para o caso do presidente da Câmara Municipal de São Miguel acusado em plenário de utilizar o polémico BMW X5 da autarquia para mandar os filhos à escola... na Praia.
O mote da discussão foi dado pelo deputado José Maria Veiga, afirmando que um “determinado presidente” [presidente da Câmara Municipal de S. Miguel, Herménio Fernandes] manda os filhos para a escola em viaturas do Estado fazendo um percurso diário “superior a 100 quilómetros”.
“Quando um presidente de câmara adquire uma viatura…anda mais de 100 quilómetros por dia para levar os filhos à escola, com os recursos que são nossos, isto é uma questão de imoralidade”, lamentou o deputado, acrescentando que este tipo de despesas “devem ser imediatamente eliminadas”.
Para José Maria Veiga, achar “normal” tal situação é “tomar os cabo-verdianos por estúpidos”. Por isso, apelou à coragem no sentido de se propor, na casa parlamentar, “medidas efectivas” de contenção de despesas para que o país disponha de “mais recursos para investimentos”, tendo o deputado exortado a “rigorosa contenção” das despesas públicas.
O líder da UCID, António Monteiro, entrou no debate defendendo o “uso racional” dos bens públicos. “Não é aceitável que qualquer responsável das instituições do Estado estejam a utilizar os meios públicos em proveito próprio, de forma vergonhosa”, sublinhou o parlamentar da UCID, reforçando que “quem quiser levar o filho à escola, que o faça no carro dele”.
Veja mais no Santiago Magazine:
OE'2020. Impostos rendem cerca de 48 milhões de contos
Uma Soberba Dignidade — Na morte do actor português José Lopes (Por José Luiz Tavares)
Os deputados do MpD saíram em defesa do autarca visado, a começar pelo deputado João Duarte, para quem os presidentes de câmara têm “autonomia” e um conjunto de atribuições e competências que lhes são atribuídas pelos estatutos dos municípios. “Aos presidentes de câmaras, a lei atribui a faculdade de utilização de viatura do Estado para uso oficial e particular”, indicou João Duarte.
Para a deputada Joana Rosa, todos devem zelar para que os bens públicos sejam melhor utilizados, mas, na sua opinião, não acha “descabido que um presidente de câmara utilize uma viatura do Estado para mandar o seu filho para a escola”.
Lembrou que a polémica viatura BMW adquirida pela edilidade de São Miguel - e que Ulisses Correia e Silva chegou a aconselhar a sua devolução - tinha criado “celeuma no seio do PAICV”, quando, segundo ela, uma certa câmara municipal presidida pelo “partido da estrela negra” [PAICV, fazendo alusão a Felisberto Vieira] comprou um carro de “alta gama” e que custou “bem mais do que o BMW”. “Rejeitamos esta lição de moralidade, porque o PAICV não tem lições para dar”, indicou Joana Rosa.
Na perspectiva do deputado e secretário-geral do MpD, Miguel Monteiro, “a imoralidade é quando se construíram vivendas para presidentes de câmaras habitarem”. “Imoral era quando havia desvios de fundos e quando havia, a nível do Novo Banco, empréstimos que eram dados sem haver um mínimo de garantia”, precisou Miguel Monteiro.
Reagindo à questão da utilização dos meios do Estado, o vice-primeiro-ministro, Olavo Correia, disse que prefere que “alguém ande de BMW, mas que trabalhe, obtendo resultados a que alguém que anda a pé e que não faz nada”. No entanto, deixou entender que há necessidade de se regular o acesso às viaturas do Estado, contrapondo a posição dos próprios deputados da bancada ventoinha, que preferiram, antes, sair em defesa de Herménio Fernandes.
Segundo Correia, tal medida não terá a ver apenas com os titulares de cargos políticos, mas sim com todos os que “fazem parte da gestão e administração da esfera do Estado”. “Pensamos, como regra, que as pessoas não devem ter acesso às viaturas do Estado, mas devem ter acesso, de forma justificada, a um subsídio de transporte para o efeito”, enfatizou o ministro das Finanças, advogando que é “muito caro” o Governo estar a disponibilizar viaturas do que “dar benefícios para que as pessoas tenham a mobilidade”.
De acordo com o governante, quem tiver qualquer informação sobre alguma irregularidade em relação à aquisição de um bem público deve “recorrer a instâncias competentes que o Estado paga todos os meses para redimir estas questões”.
O também Ministro das Finanças, disse esta manhã, no Parlamento, que o Governo vai incentivar para que se opte para a modalidade de subsídio em vez de viaturas disponibilizadas, garantindo, aliás, que “há propostas concretas” no Orçamento do Estado para 2020 para converter o acesso a viatura num subsídio de utilização da viatura do Estado com “ganhos orçamentais evidentes”.
O governante exemplifica que, como Ministro das Finanças, “quando um Director tem acesso a viatura do Estado para utilizar, e depois tem um clube de restrições, eu prefiro que ao invés disso que ele tenha os meios financeiros no seu salário para fazer face a esta necessidade e não ser o Estado a entidade responsável a alocar viaturas, condutor, manutenção, seguro e tudo mais alguma coisa”.
O artigo 5.º do Orçamento de Estado para 2020, no capítulo que fala sobre "Transporte do pessoal dirigente e de quadro especial", está escrito que o “Governo, de acordo com as diretrizes estabelecidas para a utilização de viaturas do Estado, cria incentivos para que todos os dirigentes e chefias, bem como o pessoal do quadro especial, tenham viatura própria, nos termos a regulamentar" e o artigo 2º do mesmo diploma garante que “é criado um quadro legal que estabelece as regras e condições para as deslocações de e para o trabalho e fora do Concelho de residência ao pessoal dirigente e chefias, bem como para o pessoal do quadro especial”.
Santiago Magazine c/ Inforpress
Comentários