O 3º Juizo Cível do Tribunal da Praia deu razão à Câmara Municipal da Praia por ter recusado pagar à empresa Pilar Construções uma suposta dívida de 56 mil contos, que fora assumida pela vereadora Maria Aleluia Barbosa Andrade, na qualidade de presidente substituta de Óscar Santos, e alegadamente contraída pela autarquia junto da empresa Pilar – Construções. Além de o 3º Juizo Cível Tribunal da Praia considerar que esse documento assinado por Aleluia não ter “título executivo”, não ter sido autenticado como estipula a lei e feito depois da tomada de posse de Francisco Carvalho, salta à vista a discrepância das datas: a declaração de dívida solicitada pela Pilar à CMP é de 20 de Novembro de 2020 (dia da posse do novo presidente), mas a Declaração assinada por Maria Aleluia tem data de 21 de Outubro, ou seja, um mês antes do pedido e quatro dias antes das eleições autárquicas de 2020 e só tem reconhecimento da sua assinatura em 2022 já com Francisco Carvalho como presidente há dois anos. "Um esquema montado às pressas para se apoderarem do dinheiro público e se locupletarem sem causas justificativas", argumentou, em defesa da CMP. o advogado Silvino Fernandes no processo.
Este processo, cuja sentença foi dada a conhecer aos intervenientes no passado dia 15 de Março pelo juiz Raimundo Tavares, tem origem numa queixa da empresa Pilar Construções, do empresário Ângelo Cruz, contra a Câmara Municipal da Praia, à qual exigia o pagamento de 56.600.070$00 (cinquenta e seis milhões, seiscentos mil e setenta escudos) em dívida acumulada na autarquia até Novembro de 2020.
Com a recusa da actual equipa camarária em saldar a suposta dívida, a Pilar Construções accionou o Tribunal ajuntando documentos através dos quais a própria CMP reconhecia em Declaração autenticada (título executivo) que o município da Praia lhe devia mais 56 mil contos, por trabalhos alegadamente realizados no concelho, mas que a CMP não tem qualquer registo ou contrato celebrado.
O problema, como constatou o magistrado na sua sentença, é que essa Declaração assinada no dia 21 de Outubro de 2020 pela actual vereadora do MpD, Maria Aleluia Barbosa Andrade, feito na altura na qualidade de presidente em exercício em substituição de Óscar Santos (em campanha eleitoral), é um documento particular (“reconhecimento só da assinatura”, lê-se) que não vincula a Câmara Municipal da Praia como devedor.
Segundo a sentença, “apurou-se nos autos que a assinatura a Srª Maria Aleluia Barbosa Andrade aposta no documento dado à execução foi objecto de reconhecimento de assinatura no dia 12 de agosto de 2022”, ou seja, dois anos depois de Francisco Carvalho tomar posse. “Como acima se referiu, o devedor é o Município da Praia, ora embargante. O órgão que o representa é o presidente da Câmara, nos termos do artº 98 a) do estatuto do município. A pessoa física através do qual o Município manifesta a sua vontade é a titular do órgão Presidente a Câmara. Logo, para se concluir que ocorreu neste caso concreto o reconhecimento presencial da assinatura do devedor, terá que se concluir necessariamente que a pessoa física que está presente no momento do reconhecimento da assinatura, cujo termo foi aposto no verso do documento dado à execução, é a pessoa titular do órgão Presidente da Câmara. Apurou-se que o reconhecimento da assinatura ocorreu no dia 12 de agosto de 2022, o órgão municipal, a CMP, foi instalada no dia 20 de Novembro de 2020, e de entre os cidadãos eleitos tomou posse o cidadão Francisco Avelino Vieira de Carvalho como presidente da Câmara Municipal. Nesse sentido, na data em que ocorreu o reconhecimento da assinatura aposta no documento dado à execução o presidente da CMP erá já o Francisco Avelino Vieira de Carvalho e não a Maria Aleluia Barbosa Andrade”.
Assim, o juiz Raimundo Tavares concluiu que “se o devedor é o Município da Praia”, não foi então o município da Praia que reconheceu presencialmente a sua assinatura, pelo que “não se verifica, pois, o requisito formal – o reconhecimento presencial da assinatura do devedor por notário – para que o documento particular, cuja dívida nela reconhecida pelo município é superior à alçada da comarca, que é de 500.000$00, para que o documento particular constitua título executivo”.
Outro dado relevante é a discrepância de datas em que essas acções aconteceram: o pedido de Declaração de Dívida por parte da Pilar Construções tem data de 20 de Novembro de 2020, dia da tomada de posse de Francisco Carvalho como presidente de Câmara. Mas a Declaração assinada pela vereadora e então presidente em exercício, Maria Aleluia, foi feita no dia 21 de Outubro, ou seja, um mês antes do pedido ter sido formulado pela Pilar Construções, e quatro antes das eleições autárquicas, que foi no dia 25 de Outubro desse ano. E essa mesma declaração da vereadora Maria Aleluia só viria a ser reconhecida a assinatura pelo notário em Agosto de 2022, dois anos depois de Francisco Carvalho tomar posse.
“Legítima a indução lógica de que esse alegado documento de reconhecimento de dívida, que nem mesmo mesmo a exequente é capaz de avançar uma única folha de registo, um único contrato de empreitada, um único contrato de prestação de serviços, não passa de um esquema fraudulento montado às pressas pela exequente e sra presidente em exercício como via de se apoderarem do dinheiro público (dos munícipes) e se locupletarem, sem causas justificativas, a si mesmas, e à sociedade exequente suas (delas) representada”, argumentara o advogado de defesa da CMP, Silvino Fernandes, na sua oposição à Execução.
“Pelo exposto, o Município não reconheceu a sua assinatura presencialmente”, e em conformidade, “julga-se a falta de título com base no qual se instaurou a acção executiva ordinária acima referenciada”, concluiu então o magistrado judicial, Raimundo Tavares, antes de determinar a absolvição da CMP e a condenação da Pilar Construções ao pagamento das custas e taxas de justiça.
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