“Objetivo da Universidade Verão é formar jovens, mas nunca formatar ninguém”
Entrevista

“Objetivo da Universidade Verão é formar jovens, mas nunca formatar ninguém”

Palavras de Euclides Silva, presidente da Juventude para Democracia (JpD) neste exclusivo ao Santiago Magazine, onde aborda uma série de questões relacionadas com a juventude cabo-verdiana, a política governamental para esta importante camada da população, defendendo que o desemprego jovem, embora ainda elevado, tem estado a baixar, ao mesmo tempo que aconselha os jovens se manterem activos para influenciar a governação do país.

Santiago Magazine - Estão nas vésperas de mais uma Universidade de Verão. O que é que esta atividade política significa na prática?

Euclides Silva - A Universidade de Verão é uma escola de formação política de curta duração direcionada aos jovens dos 18 aos 35 anos de todas as ilhas de Cabo Verde. É um evento que já vai na segunda edição, conta com cerca de 60 participantes. Vão ser abordados vários temas ligados à economia, história e ciências políticas, relações internacionais, comunicação política, entre outros. Temos um leque de oradores com percurso político e profissional de reconhecido mérito e que vão partilhar connosco as suas experiencias.

O significado na prática é que estes jovens quadros, com elevado potencial, que foram selecionados, de entre centenas de candidatos, irão ter mais conhecimentos sobre a política, sobre os valores que comungamos e vão estar mais preparados para nos representar nas suas ilhas e nos seus concelhos.

A nossa aposta na formação política advém do facto de observarmos que é uma lacuna que existe. Nas nossas escolas os alunos aprendem muito pouco sobre a cultura política. E como é sabido, ninguém pode gostar e interessar por aquilo que não se conhece. Nós na JpD queremos que haja cada vez mais jovens interessados pela política, mas sobretudo, interessados em servir a sua comunidade. Por isso, acreditamos que, na prática, a Universidade Verão irá dar este contributo, tendo em conta que este ano abrimos a candidatura aos jovens independentes e da sociedade civil para participarem na formação e as aulas irão ser transmitidas em direto na nossa pagina de facebook.

Este ano convidaram o Felisberto Vieira, um alto dirigente do PAICV para participar convosco neste certame político. Como pensam conciliar as mensagens de um homem da oposição, da esquerda democrática, com as premissas defendidas pelo vosso partido, no caso o MpD, centro-direita?

O convite ao Dr. Felisberto Vieira surge no âmbito da nossa estratégia de abrir a JpD a pessoas de outros quadrantes políticos. Ele é um político moderado, com um percurso interessante, marcado pela combatividade e persistência. Acreditamos que temos muito a aprender com ele sobre a política, a liderança, tendo em conta que ele entrou na política com a idade de muitos dos formandos que estarão na sala.

O Objetivo da Universidade Verão é formar jovens, mas nunca formatar ninguém. A JpD é uma organização aberta ao pensamento livre. Por isso vamos ter muito gosto em ouvir o Deputado Felisberto Vieira que convidamos para este ano e no próximo convidaremos outras figuras de outros partidos com o mesmo espírito.

Que trunfos a JpD tem na manga com esta participação do Felisberto Vieira, um dos maiores opositores da actual líder do PAICV, Janira Hopffer Almada?

Nós não temos nenhum triunfo na manga e nem estamos preocupados com a vida interna de outras organizações políticas. Convidamos o Dr. Felisberto Vieira pelo seu percurso e por aquilo que ele representa enquanto Homem e enquanto político que já desempenhou vário cargos de responsabilidade neste país desde presidente da Camara Municipal da Praia, Deputado, Governante.

Há muito que vem se verificando críticas sobre o funcionamento das juventudes partidárias, onde muitos dizem que as J são meras caixas de ressonância dos partidos. É verdade? O que tem a dizer sobre as recorrentes críticas dirigidas às juventudes partidárias por diferentes entidades da sociedade civil e política também?

As críticas às Juventudes partidárias são tão antigas quanto as próprias Jotas. Em democracia temos que saber lidar com as criticas, mesmos que muitas delas não têm razão de ser. As críticas muitas vezes estão ligadas ao desprestigio da própria atividade política que não é por culpa dos jovens que estão a dar os primeiros passos na política.

A JpD, ao longo da sua história, nunca foi caixa de ressonância do MpD e é fácil de ser comprovado.

Quanto aos críticos, lembro-me que já houve tempo em que diziam que as Jotas não faziam nada e que não tinham utilidade. Agora estão a dizer que as suas atividades são “arquitetadas” e na “lógica partidária”. Pelo menos na JpD isso é uma falácia. Nossos associados também fazem parte de outras organizações da sociedade civil, como ordens profissionais, associações académicas, associações juvenis, para citar alguns exemplos. Quando estes mesmos jovens se destacam nestas organizações, realizando atividades de excelência, são muito elogiados e parabenizados, mas já quando fazem as mesmas atividades na JpD, estas atividades já não têm relevâncias ou são arquitetadas pelos partidos, ou são jovens que estão a procura de alguma coisa. Não pode ser assim.

Bons e maus existem em todas as atividades. Ninguém vira bom ou mau só porque, para além das suas atividades profissionais, estudantis, etc. resolveu, também, participar e dar o seu contributo numa juventude partidária.

Na JpD nós entendemos que a política é uma atividade nobre e que os partidos são os pilares fundamentais do nosso sistema democrático. Optamos, como já disse outras vezes, por fazer política às claras e dando a cara pelas nossas causas. Encaramos as críticas com naturalidade.

Afinal, o que é isto de juventude partidária? O que é que as J partidárias fazem?

Juventude partidária, de uma forma muito simples, diria que são organizações de jovens afetos a um partido, que comunga dos mesmos princípios e valores com o partido a que pertencem. Na JpD desenvolvemos um leque diversificado de atividades que vai desde atividades desportivas, recreativas, passando por atividades de caris política como as campanhas eleitorais, atividades de caris sociais e, também, participamos ativamente na promoção de conferências, debates, mesas redondas e formações políticas para os nossos membros e não só. Todas estas atividades são amplamente divulgadas e tem despertado cada vez mais interesse dos mais jovens. Prova disso é número de novos membros que entraram na JpD no último ano, em todos os concelhos do país.

No vosso caso, a JpD possui agenda e programa próprios ou estes se emanam do MpD, que afinal é o vosso patrono?

A JpD possui uma agenda própria e tem o seu próprio programa de atuação. Aliás, isto está consagrado nos nossos estatutos. A relação com o MpD é de parceria e de cooperação, mas o Partido não interfere nas planificações das atividades da JpD. Primeiro, porque não faz sentido. Se é para ter uma organização que serve apenas de “pau mandado e menino de recado” é melhor extingui-la e o partido sozinho ou com os seus militantes e suas estruturas de base faziam as atividades que a JpD tem feito. Segundo, porque a autonomia da JpD está consagrada tanto no estatuto do MpD como no estatuto da JpD. Nós temos estado a funcionar com total autonomia e 90% das nossas atividades são programadas pensando na Juventude cabo-verdiana, independentemente se são ou não nossos militantes.

Portanto, num país onde estudos dizem que há um défice enorme de participação, em que boa parte da população nunca participou numa reunião para discutir assuntos que interessam a sua comunidade, acredito que a JpD com as suas atividades, que tem mobilizado sempre centenas de jovens, estamos a dar um grande contributo para o reforço da cidadania juvenil e criar espaços para a participação cívica.

Qualquer organização para funcionar precisa de dinheiro. Quem financia a JpD? Em termos numéricos qual é o vosso orçamento anual?

Nós funcionamos a base do voluntariado e a esmagadora maioria das nossas atividades não tem custos ou custa muito pouco. Todavia, nenhuma atividade sobrevive apenas a base do voluntariado e atividade política não foge a regra. Quando precisamos de meios para suportar os custos indispensáveis à realização de uma atividade, recorremos às pessoas amigas e aos nossos parceiros, que neste caso é o próprio MpD. Os apoios muitas vezes não são em dinheiro, mas em serviços.

A juventude é a franja mais importante da população, não só quanto ao número – somos um país jovem – mas porque os jovens são o garante do futuro de um país. Como avalia a política governamental para a juventude?

A política governamental para a Juventude, de uma maneira geral, tem sido boa. O desemprego jovem tem estado a reduzir, este ano foi anunciado o aumento de número de bolsas de estudos, o programa de apoio ao empreendedorismo já começa a funcionar, já há solução para parte das dívidas dos estudantes junto das instituições de ensino superior. Mas, ainda temos muitos desafios pela frente que precisam de uma resposta. O desemprego jovem, apesar de estar a baixar, continua muito elevado, é preciso massificar o programa de estágios profissionais, reforçar os incentivos a criação de emprego jovem por parte das empresas, facilitar e estimular a contratação dos recém-formados, bem como uma reforma mais alargada do ensino profissional e superior e direcioná-los para as necessidades reais do mercado de trabalho.

Na segurança os ganhos já são visíveis. Se antes morria, em média, um jovem a cada fim de semana, por causa dos conflitos entre grupos rivais, hoje temos um cenário completamente diferente, mas é necessário continuar a trabalhar para erradicar o sentimento de insegurança no país.

A ausência de uma entidade governamental específica só para as questões da juventude – como o Ministério da Juventude – não preocupa a JpD? Não é um sinal de descaso para com esta importante camada da sociedade cabo-verdiana?

A juventude é um sector transversal e não se resume apenas em ter uma entidade com esta nomenclatura. Já tivemos um ministério com este nome no passado e os resultados foram desastrosos. Isso para dizer que não é o nome de um ou outro ministério que resolve os problemas dos jovens, mas sim as políticas adotadas. Este governo preocupa sim com a juventude e já foi anunciado um conjunto de medidas que irá contribuir para a melhoria das condições de vida dos jovens em todos os concelhos do país. Repare que o desemprego jovem está a baixar, a economia está a crescer, a dívida pública está a baixar, a segurança está a melhorar. Tudo isto também são ganhos para a juventude.

Se fosses Primeiro-Ministro, o que é que introduzirias na política para a juventude cabo-verdiana?

Temos um primeiro ministro que está muito focado e a trabalhar arduamente para resolver os problemas da juventude e, de uma forma corajosa, tem feito um conjunto de reformas e os resultados estão a aparecer de forma natural.

Por fim, que mensagens queres deixar para os jovens em geral?

Levando em conta que cada cidadão é um agente político, a mensagem que deixo é para que os jovens continuem a ser cada vez mais ativos e participativos nas questões políticas do país, para procurarem sempre influenciar a governação do seu concelho e do nosso país com propostas, com críticas e sugestões, ser cada vez mais exigente e não esperar para que alguém faça algo por nós, quando nós mesmos podemos fazer a diferença.

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