TACV e o Governo do improviso
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TACV e o Governo do improviso

Loas aos novos ATR’s, dois, e mais dois anunciados para chegar quando chegarem. Mas há delícias políticas que merecem um olhar clínico. O recente episódio em torno do Conselho de Administração da TACV é um exemplo emblemático da descoordenação e da improvisação que infelizmente continuam a caracterizar parte do governo cabo-verdiano. O Ministro dos Transportes, José Luís Sá Nogueira, anunciou de forma categórica a queda do conselho da companhia aérea nacional, apenas para ser desmentido pelo próprio governo horas depois, em comunicado oficial. A explicação era simples: qualquer alteração só poderia ocorrer na Assembleia Geral da empresa, marcada para  esta segunda-feira, 22. Resultado: não há mudanças porque o ministro ter-se-á esquecido de convidar alguém para os cargos vacantes, e pior, fez uma ilegal ultrapassagem pela direita quando anunciou a queda de um colectivo que não pôde, por si só, derrubar.

Apesar do esclarecimento do Governo em comunicado oficial, o ministro manteve-se firme na sua posição, insistindo que estava correto. O que deveria ser uma comunicação institucional clara transformou-se num espectáculo de declarações contraditórias, revelando fragilidades profundas na coordenação interna do Executivo.

A própria Assembleia Geral da TACV mostrou a gravidade do problema: o assunto foi adiado para 22 de outubro porque o governo não apresentou nenhum nome para substituir o Conselho de Administração existente. Ou seja, o anúncio inicial de mudança, tão enfático e seguro como o ministro José Luis Sá Nogueira fez transparecer, não passava de um teatro de improviso — uma promessa sem suporte prático, que, no fundo, eleva o gestor Pedro Barros diminuindo o papel político do governante.

Dito de outro modo, um ministro não pode anunciar decisões sem respaldo, nem o Governo pode permitir que contradições internas se transformem em espetáculo público. O país precisa de processos claros, responsabilidades bem definidas e decisões alinhadas entre ministérios e órgãos executivos.

Este tipo de descoordenação tem efeitos concretos e prejudiciais. Para a empresa, mina a credibilidade da TACV e seus actuais gestores que, bem ou mal trouxeram dois novos ATR’s para servir o país na sua totalidade (Brava e Santo Antão não têm aeroporto, por isso fora dessa equação), já fragilizada por problemas financeiros e de gestão.

Em facto disso, obviamente que o Governo, que administra o Estado, detentor de 90% das acções da TACV, se expôs, quiçá involuntariamente, à falta de planeamento e capacidade de execução, tornando públicas divergências internas que deveriam ser resolvidas antes de qualquer anúncio.

Ora bem, quem paga? A sociedade cabo-verdiana, que aumenta a sua desconfiança e frustração, por decisões importantes dependerem de declarações precipitadas em vez de processos organizados e transparentes.

Há uma lição pedagógica clara neste episódio: a governação exige planeamento, comunicação coerente e responsabilidade institucional. Um ministro não pode anunciar medidas disruptivas sem que estas tenham base legal e real, e o Governo não pode permitir que essas contradições se transformem em espetáculo público, como, de resto, testemunhamos com vergonha.

O caso da TACV deveria servir como alerta: improviso e descoordenação não são apenas falhas administrativas, são atentados à confiança do cidadão e à estabilidade de instituições estratégicas. Cabo Verde merece ministros e governantes que planeiem, comuniquem e executem com seriedade, não um Governo que anuncia e desmente a si mesmo, com toda a cara-de-lata. Creio que esta descoordenação e desarticulação transforma procedimentos administrativos em confusão pública e deixa o país expectante de uma nova liderança.

A meu ver, é urgente que o Executivo assuma responsabilidade, calcule com antecedência e comunique com clareza. Cabo Verde quer mais do que anúncios contraditórios e adiamentos sucessivos. O país precisa de líderes que combinem visão, coerência e capacidade de execução — não um governo que transforma decisões estratégicas em teatro de improviso e deixa o futuro de empresas e cidadãos à mercê da desorganização.

O incidente com a TACV, repito, não é apenas uma falha administrativa: é um alerta sobre como a falta de coordenação e de seriedade na tomada de decisões estratégicas pode comprometer empresas, instituições e confiança pública, dentro e fora. 

Esta confusão, com o ministro dos Transportes no topo da descrença, era evitável. No fim das contas, o improviso, a descoordenação e declarações precipitadas não são apenas erros de gestão – são sinais de que o Executivo perdeu os trilhos. Não tem capitão, nem treinador que ponha ordem na casa.

A situação culminou na Assembleia Geral da TACV: o assunto foi adiado para 22 de outubro, porque o governo não apresentou qualquer nome para substituir o Conselho de Administração vigente. Esta ausência de nomes não é trivial; revela que o anúncio inicial de mudança era, na prática, um teatro de marionetes.

Uma promessa sem base real não apenas constrange a empresa, como descrediliza o Governo, os accionistas, funcionários e cidadãos (10% da TACV pertence a privados, sendo Victor Fidalgo o accionista particular com mais acções).

A TACV, companhia aérea histórica de Cabo Verde, enfrenta, sabemos, desafios estruturais há décadas. Crises financeiras, gestão deficitária, atrasos em operações e dificuldades na modernização tornaram-na vulnerável a decisões precipitadas. Cada falha do Governo tem consequências diretas na imagem e operação da companhia. A descoordenação atual é, portanto, mais um capítulo de uma história de problemas crónicos, agravando a instabilidade de uma companhia que é a maior embaixadora de Cabo Verde.

Em resumo, Cabo Verde necessita de governantes que saibam planear, comunicar e executar com competência os programas pré-identificados. O problema é essa mania do cabo-verdiano de ver um país, o nosso pequeno arquipélago feito de gente simples, de forma maniqueísta: ou preto ou branco, ou MpD ou PAICV, esquecendo, esses estetas digitais, do mundo arco-iris.

Adiante, a falta de nomes para dirigir a TACV, o adiamento de decisões e o embate público entre ministros e governo não é apenas um desacerto operacional: é uma demonstração clara de incapacidade institucional e fricção no seio no Governo de UCS. Quando o improviso prevalece sobre a seriedade e o planeamento, empresas estratégicas e instituições públicas sofrem, e a confiança do cidadão se derrete.

O caso da TACV não pode ser normalizado. E quem tem respinsabilidade política, no caso o ministro José Luis Sá Nogueira, não tem, por N motivos e mais este imbróglio que revela a sua fraqueza politica, condições para se manter no cargo depois de duas chicotadas psicológicas: primeiro, o comunicado do Governo que o desmentiiu, e agora os sócios, onde o Estado é maioria absoluta com 90% das acções, a não permitir a queda do CA da TACV porque não apresentou ninguém para o substituir. Houvesse um tantinho de dignidade, Sá Nogueira deitava a toalha ao chão e pederia para sair. Houvesse pulso do PM bateria a mão na mesa, em respeito pelos cabo-verdianos, e corria com o atabalhoado ministro. Ou então ele, UCS, admitia mea culpa. E tchau!

 

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SOBRE O AUTOR

Hermínio Silves

Jornalista, repórter, diretor de Santiago Magazine

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