País equivocado ou país de equívocos!
Colunista

País equivocado ou país de equívocos!

Tudo está normalizado nesta terra que se diz de brandos costumes, de morabeza e de pasa sabi! Nem mesmo os apagões da Eletra, condicionando negócios, investimentos, aldrabando os cidadãos, incomadam a nação! Porém, um problema pontual como a recolha do lixo na capital de todos nós, já é bastante para mobilizar vozes de lamúrias, num país sem saúde, sem habitação, sem justiça, sem segurança, sem alternativas para os jovens, sem esperança. Que dizer?... Indignação seletiva ou inconsequente comportamento de um país de equivocos ou equivocado?... Cada um que tire a sua conclusão...

Cabo Verde é um país equivocado. Ou então, um país de equívocos. Estamos a falar de um país onde tudo, ou quase tudo, o que parece é! Estamos a falar de um país onde a semelhança, nunca, ou quase nunca, é coincidência. Não! Aqui a semelhança é sempre, ou quase sempre, a mais pura realidade!

Aqui reina um partido - o MpD - que governa com evidentes sinais de intransparência, deslealdade e desonestidade institucionais, visíveis aos olhos do cidadão mais distraído, mas poucos se mostram indignados ou preocupados com o rumo que o país está a tomar.

Estamos a falar de um partido e governo que conseguiram lesar o Estado em 31,2 milhões de euros num contrato de concessão com a CVInterilhas, uma sociedade comercial que, por ironia, ou má intenção, tem prestado o pior serviço de transporte maritimo doméstico que este povo já teve desde a independência nacional.

Estamos a falar de um partido e governo que "venderam" a única companhia aérea nacional a um grupo estrangeiro islandês, por 48 mil contos, fiado, assumindo todos os passivos e ainda servindo de avalista para empréstimos bancários em cerca de 40 milhões de euros, supostamente destinados a investimentos que nunca aconteceram, porque ninguém com olhos os viu, nem com ouvidos os ouviu, nem com o tacto os sentiu, tanto é que, num dia como este, esses "parceiros estratégicos" abandonaram a empresa e o país, deixando-nos no meio do mar atolados, e ainda com processos judiciais nas costas para o ressarcimento de eventuais prejuizos que este martirizado povo os terá alegadamente causado.

Estamos a falar de um partido e governo que organizaram e realizaram um fórum internacional de 2 dias, na ilha do Sal, por 55 milhões de escudos - este é o montante publicado no BO, mas a imprensa disse que terá atingido os 150 milhões - sem dar cavaco a ninguém, nem mesmo aos deputados nacionais, que ao que consta representam o povo, à luz da Constituição da República.

Estamos a falar de um partido e governo que, de repente, anunciam a construção de um monumento sobre "liberdade e democracia", orçado em 150 milhões de escudos, quando milhares de cidadãos e respetivas familias não têm um teto para morar, mais de 80% da sua população jovem anda para cima e para baixo á procura de uma oportunidade para partir para o exílio, os hospitais não têm um modesto aparelho de TAC, e em muitas ocasiões faltam medicamentos, até oxigénio ou reagentes para análises laboratoriais.

Estamos a falar de um partido e governo que vendem ativos do Estado sem prestar contas aos órgãos do poder instituídos, nomeadamente o parlamento. O exemplo mais emblemático é a venda de um edifício em Lisboa, cujos contornos continuam no segredo da nossa Embaixada em Portugal e nos gabinetes ministeriais na Praia. Sem falar das reservas do ouro vendidas pelo Banco de Cabo Verde, do Leilão das acções do INPS, entre outros dossiers encobertos pelas cláusulas de confidencialidade num ambiente onde o público e o privado convivem debaixo do mesmo teto e às vezes dormem na mesma cama.

Estamos a falar de um partido e governo com poucos investimentos nas infraestruturas e nos setores produtivos do país, como agricultura, pecuária e pesca, apesar de terem aumentado a dívida pública em percentagens consideráveis, não se sabe como, porquê e em quê.

Estamos a falar de um governo que não fez um único investimento no município mais populoso do país, a Praia, em 9 anos de poder, tendo surrupiado, aos olhos de todos nós, cerca de 193 milhões de escudos do PRRA, só para impedir realizações de algumas obras municipais na cidade capital do arquipélago, com o tão vergonhoso quanto indigno objetivo de tirar dividendos políticos, empurrando os interesses do povo e a satisfação das necessidades da coletividade para um plano inferior.

Estamos a falar de um partido e governo que mais do que rostos, são proprietários de um dos maiores escândalos financeiros cometidos na gestão pública nacional, que é o Mercado do Coco, onde sepultaram mais de um milhão de contos dos cabo-verdianos, sem quaisquer sinais de remorso, ou declarações de última vontade.

Mas nada disso incomoda, nada disso preocupa, nada disso indigna esta nação. Tudo está normal nesta terra que se diz de brandos costumes, de morabeza e de pasa sabi! Nem mesmo os apagões da Eletra, condicionando negócios, investimentos, aldrabando os cidadãos, incomadam a nação! Porém, um problema pontual como a recolha do lixo na capital de todos nós, já é bastante para mobilizar vozes de lamúrias, num país sem saúde, sem habitação, sem justiça, sem segurança, sem alternativas para os jovens, sem esperança. Que dizer?... Indignação seletiva ou inconsequente comportamento de um país de equivocos ou equivocado?... Cada um que tire a sua conclusão...

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SOBRE O AUTOR

Domingos Cardoso

Editor, jornalista, cronista, colunista de Santiago Magazine