A associação SOS Boa Vista é uma organização da sociedade civil que tem procurado assumir como a voz reivindicativa das populações e dos desafios da ilha. Porque, entende esta ONG, que as instituições locais não têm sabido defender a ilha, neste momento a braços com graves problemas ao nível da saúde, da educação, do alcoolismo e do consumo de drogas.
“Agora é corriqueiro sair à rua e dar de caras com jovens de 12, 13 anos a beber e a fumar sem qualquer escrúpulo”, observa o porta-voz do grupo em conversa com Santiago Magazine, constitúido por Delício Ferreira, presidente e pelos membros, Domingas Varela e Jorge Harison Livramento, para acrescentar que a lei do álcool é bonita, mas, sem aplicação pratica e sem fiscalização, não terá qualquer efeito.
O grupo defende que a ilha precisa de uma mudança de liderança, uma vez que, no seu entendimento, os sucessivos poderes locais instituídos fizeram muito pouco, quando comparado com as receitas geradas na ilha.
“Boa Vista está parada no tempo”, afirmam os ativistas que conversaram com Santiago Magazine, ao mesmo tempo que acusam o governo de não ter criado espaços de diálogo com a ilha, de modo a perceber a sua dinâmica e assim trabalhar em prol da sua demanda económica e social.
Para a SOS Boa Vista, o governo é o grande responsável pela situação de marasmo por que tem passado a ilha.
Por exemplo, ao nível da saúde, a ONG é de opinião que o Centro de Saúde não reúne as mínimas condições para assegurar os cuidados sanitários que a ilha demanda. Não se trata, reconhecem, de um problema de profissionais de saúde, mas sim de requisitos do Centro de Saúde. Esta infraestrutura, na opinião do grupo, não possui as mínimas condições físicas e materiais para trabalhar.
“Aqui não há condições para uma simples cesariana”, denunciam. Aliás, a associação surgiu a partir de um escândalo relacionado com a saúde. Foi quando uma parturiente perdeu a vida a caminho da ilha do Sal, num bote, para onde havia sido evacuada para ser atendida em serviço de parto, que o grupo resolveu organizar-se em associação, para reclamar e ajudar lá onde for possível.
A morte daquela parturiente empurrou alguns elementos do grupo a organizar uma manifestação para sensibilizar as autoridades sobre a situação de saúde e evacuação na ilha. Foi tudo muito rápido, e em menos de uma semana, o grupo conseguiu fazer uma marcha com a mobilização de mais de um milhar de pessoas.
“Aqui na ilha, quem tem dinheiro procura a Praia ou Sal para tratar o seu familiar, e quem não tem fica por cá a padecer”, afirmam, e acrescentam que o Centro de Saúde “não tem condições para realizar pequenas cirurgias, ecografias, as chapas aqui aparecem mais uma fotografia a preto e branco, coisas básicas”.
E como se isso não bastasse, nota-se uma grande resistência do INPS em relação às evacuações. É um vai e vem entre o médico e o INPS, que o paciente acaba por desistir, podendo morrer à mingua. “Há pessoas, como por exemplo as mulheres que sofrem com problemas de mama, que estão há 2, 3 anos à espera de uma evacuação para a cidade da Praia”, remarcam.
O grupo entende que o governo está a matar a galinha de ovos de ouro, porque Boa Vista tem que ter trabalho, tem que ter política social, tem que ter visão. Por exemplo, a nível da educação, tem havido insuficiência de salas de aula no ensino básio, todos os anos, e nunca há solução.
Na última década, anualmente, a ilha recebe centenas de famílias que chegam de outras ilhas à procura de trabalho. Perante um quadro desses, dever-se-ia trabalhar para que os serviços públicos da ilha, como a saúde e a educação, tivessem as condições de prestar um serviço mínimo necessário para satisfazer a demanda.
Mas isso não tem acontecido. “Os membros do governo chegam à ilha, falam e vão se embora, não ouvem as pessoas, as suas reclamações e frustrações”, lamentam.
O poder local é o que se sabe. O desempenho da Câmara Municipal, de ontem e de hoje, tem deixado muito a desejar.
Paralelamente ao fraco desempenho do poder local ao longo dos últimos anos, o grupo traz à baila as acusações que têm vindo a público, nas últimas semanas, sobre eventuais práticas de corrupção na gestão de terrenos municipais. Essas acusações apontam que o antigo autarca, José Pinto Almeida - que perdeu as eleições em 2016 a favor do ex-correligionário, José Luís Santos, - andou a distribuir terrenos entre amigos, familiares, esposa, e a si próprio, sem qualquer critério ou transparência, disseminando especulação imobiliária a partir dos Paços do Concelho.
Face à gravidade das acusações, a SOS Boa Vista pede que as autoridades nacionais investiguem o caso e tomem as medidas que se impõem. Para o grupo, a ser verdade as acusações vindo agora a público, torna-se evidente que o país está perante um saque, um saque que não é apenas local, mas sim um saque a Cabo Verde.
“Notamos que, salvo o PP, nenhum outro partido político se pronunciou ainda sobre este assunto. Nós, como SOS, e como população da Boa Vista, exigimos um esclarecimento e intervenção das autoridades para responsabilizar os potenciais implicados”, remarcam.
São, enfim, situações que, pontuam, explicam de algum modo o atraso em que Boa Vista vivido nos últimos anos.
A respeito do atraso, e em jeito de elucidação, o grupo recorda que a cidade de Sal Rei não tem sequer uma rede de esgotos. “Enfim, Boa Vista reclama por uma liderança”, concluem.
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