O advogado Amadeu Oliveira requereu esta segunda-feira, 16, "a Intervenção Hierárquica do Procurador-Geral da República", no processo que intentou contra o juiz Ary Spencer Santos. Oliveira insiste em como possui provas e fortes razões para crer que Santos "é um Magistrado Judicial Abusador dos seus Poderes Funcionais de Juiz; Um Magistrado Judicial Prevaricador e que comete Fraudes e Manipulações Processuais para prejudicar cidadãos, empresas e até o próprio Estado de Cabo Verde". Razão pela qual pede a revogação desse despacho, o afastamento do procurador Osmar Santos do processo e a constituição do escrivão de direito Nelson Duarte como arguido.
Irredutível e combativo como lhe é peculiar, o advogado Amadeu Oliveira volta a acusar o juiz Ary Spencer Santos de vários crimes e manipulações de processos sob seu julgamento na ilha do Sal, infracções que teria cometido entre 2008 e 2014. Desta vez, e em jeito de reacção ao despacho de arquivamento do processo contra o magistrado judicial, Ary Santos, o advogado Amadeu Oliveira dedicou 238 páginas - "a maior peça processual que já fiz na minha careira", esclarece - para denunciar o que apelida de "maior organização criminosa que já operou na ilha do Sal, com protecção das instâncias judiciais, nomeadamente, um juiz e um procurador da República para exrtorquir dinheiro a duas empresas de investidores estrangeiros, a Ginja Pesca e a Palmeira Pesca".
Esta extensa peça processual revela, mais uma vez e com os bois a serem chamados pelos nomes, como é que a partir de "falsificações de facturas de largos melihares de contos" o tribunal do Sal decidiu pelo arresto de navios de longo curso, com mera finalidade de "os criminosos extorquirem dinheiro aos donos dessas embarcações, sob a ameaça de que se não pagassem os barcos ficariam arrestados pelo tribunal do Sal, até irem ao fundo".
Nos seus argumentos e explicações, Amadeu Oliveira e o seu advogado Óscar Rodrigues trazem de novo à baila "as actuações criminosas do juiz Ary Spencer Santos, do ex-juiz Agnelo Tavares e o seu irmão Júlio Martins, enquanto PGR", enfim, "de todos metidos nesta mega fraude pudicial", sublinha.
O pedido de Intervenção Hierárquica (Artº 316 do CPP Autos de Instrução Nº23/DCAP/2018-19) deu entrada ontem, segunda-feira, 16, no Departamento Central de Acção Penal da PGR. Nele, Oliveira e Rodrigues começam por justofocar que "tendo sido notificado do Despacho de Arquivamento Geral e Completo dos Autos de Instrução Crime em epígrafe; por não se conformar com o aludido Despacho de Arquivamento que se mostra falho e juridicamente inválido - nulo; vem requerer a Intervenção Hierárquica do Digníssimo Senhor Procuradora Geral da República".
Os fundamentos apresentados por Amadeu Oliveira são fortes e de superior gravidade, sobretudo pelo detalhe da informação e as pessoas supostamente envolvidas. Sem esconder a faca ao bode, Oliveira é taxativo quando lembra que tem "afirmado e repetido que possui provas e fortes razões para crer que o Arguido Dr. Ary Spencer Santos".
Segundo ele, o juiz Ary Santos "é um Magistrado Judicial Abusador dos seus Poderes Funcionais de Juiz; Um Magistrado Judicial Prevaricador e que comete Fraudes e Manipulações Processuais para prejudicar cidadãos, empresas e até o próprio Estado de Cabo Verde; Um Magistrado que possui comportamento digno de um Prevaricador que manipula processos judiciais, para mandar funcionários do Tribunal ir assaltarem o Escritório de Advocacia do Assistente Amadeu Oliveira, para roubar equipamentos electrónicos e uma Base de Dados – Disco Externo onde estavam guardados imensos documentos, incluindo provas de crimes que tinha sido praticados por esse mesmo juiz", lê-se no documento a que Santiago Magazine teve acesso.
Aliás, recorda Oliveira, foi com base nessas acusações que em 2018 apresentou uma Denúncia-Crime junto da PGR, contra o referido Juiz, onde também constava uma queixa contra o procurador da República, Osmar Santos, ex-colega de Ary Santos na Comarca do Sal, por prevaricação de magistrado. E explica: "O Magistrado do Ministério Público, senhor Procurador da República, Dr. Osmar Santos, foi indigitado para Instruir o Processo-Crime contra o Juiz Dr. Ary Spencer Santos, tendo o Dr. Osmar Santos aceite ser Instrutor do aludido processo, quando o mesmo era bem sabedor que tão tinha condições de isenção e de imparcialidade para desempenhar tal função com Objectividade, posto que existem graves e fortes razões que abalam a confiança que se deve ter num Instrutor de um Processo-Crime desta envergadura; Porém, mesmo sabendo que não tinha condições de isenção e imparcialidade, o Dr. Osmar Santos aceitou ser o Instrutor, e manteve-se no processo, sem dignar pedir a sua própria Escusa, o que é Ilegal, manchando, assim, todos os actos decisórios que terá praticado com o vício da Nulidade, sendo, portanto, NULO, o seu Despacho de Arquivamento, por violação da alínea a) do Nº 1 do Artigo 53º, os Nºs 3 e 4 do Artigo 53º, em conjugação com os Nºs 1 e 2 do Artigo 57º, todos do Código Processo Penal (CPP)".
"Para agravar as razões da sua Suspeição (que sempre existiram), verifica-se que, em sede de Instrução, o Instrutor Suspeito, Dr. Osmar Santos, mostrando ser pouco diligente e pouco zeloso no cumprimento dos seus deveres profissionais, optou por realizar somente algumas insuficientes diligências de prova, posto que, deixou por realizar muitas e essenciais diligências de prova, donde resultou uma Instrução omissa, não objectiva, não isenta, coxa, manca e insuficiente para a descoberta de toda a verdade material subjacente; Ora, como é do conhecimento de qualquer Procurador da República, a insuficiência de investigação durante a fase de Instrução é determinante de Nulidade, estatuída na alínea c) do Nº2 do Artigo 152º do CPP, nulidade essa que é de conhecimento oficioso do Digníssimo Senhor Procurador Geral da República".
Amadeu Oliveira conta ainda que, como a Instrução estava em fase de “Segredo de Justiça”, só depois de ser notificado do Arquivamento Geral e completo da Instrução (que aconteceu a 13 de Novembro último, sendo que o despacho tem data de 30 de Abril de 2019, ou seja, seis meses depois), identificaria as diligências em falta, acrescentando que tudo foi feito "sem que tivesse tido a oportunidade de requerer mais diligências complementares de prova, ou oportunidade de se pronunciar sobre as “meias-verdades”, as “manipulações”, as “omissões” e as “falácias” que o Arguido, Dr. Ary Spencer Santos, tinha trazido para o processo, "o que violou o Princípio do Contraditório, estatuído nos Artigos 5º, Nº 3 do Artigo 220º do CPP, e Nº 6 do Artigo 35º da Constituição da República".
"Para agravar ainda mais as razões de suspeição, no final (que deveria ser o começo), o Suspeito Instrutor decidiu decretar, prematuramente, o Arquivamento geral e completo da Instrução, alegando, falaciosamente, a PRESCRIÇÃO dos crimes de Inserção de Falsidades em Processos e de eventuais Crimes de Denegação de Justiça, acrescentando que, no que se reporta a eventuais crimes de Prevaricação de Magistrados, o Instrutor alegou, falaciosamente, que não ocorrendo ainda prescrição, contudo, não se vislumbraram factos praticados pelo Juiz Dr. Ary Spencer Santos que pudessem configurar o cometimento do aludido crime". Crimes esses que, assegura Amadeu Oliveira "ainda não prescreveram".
Ora, diante desses factos e mantendo-se fiel e inamovível na sua luta por uma justiça mais justa e transparente em Cabo Verde, Amadeu Oliveira, ao abrigo do disposto no Artigo 316º do CPP, já requereu a Intervenção Hierárquica do Digníssimo Senhor Procurador Geral da República, no sentido de determinar que: "Seja o Instrutor deste Processo, o Senhor Procurador da República, Dr. Osmar Santos, afastado dos subsequentes termos deste processo, em virtude do mesmo ser Suspeito, não tendo ele pedido a sua própria Escusa do processo, como era seu dever; Seja revogado o Despacho de Arquivamento por padecer de várias ilegalidades, resultando uma evidente nulidade; Seja nomeado um outro Procurador da República para assumir as funções de Instrutor destes Autos de Instrução, dando continuidade às diligências de prova".
No mesmo texto, Oliveira pede que seja constituído como arguido "o Sr. Nelson Duarte, funcionário judicial, Escrivão de Direito, antes colocado no Tribunal do Sal, actualmente colocado no Tribunal de Ribeira Grande de Santo Antão, pelo cometimento de três Crimes de Inserção de Falsidade em Documento Público; Seja deduzida a Acusação Pública, contra o Arguido Juiz Dr. Ary Santos pelo cometimentos de: (i) Crimes de Inserção de Falsidade em Processos e (ii) crimes de Prevaricação de Magistrado".
Um elemento essencial para se perceber esta história é o facto de a contenda entre Amadeu Oliveira e o juiz Ary Santos e o procurador Osmar Santos vier de há mais tempo, quando estes dois magistrados interditaram o advogado santantonense de exercer a sua profissão na ilha do Sal, o que, no entender de Oliveira, mostra como os dois já comungavam da mesma ideia em relação à sua pessoa.
Esta postura, que levou o advogado a agir judicialmente contra a decisão da OACV e da PGR, teriam levado à falência o Escritório de Advocacia que Oliveira detinha na Ilhado do Sal e "que foi forçado a fechar portas no início do ano de 2012, despedindo os colaboradores e devolvendo o imóvel que vinha ocupando desde o ano 2000, precisamente porque a actuação conjunta desses dois Magistrados impediram e bloquearam qualquer actividade profissional do Assistente, na Ilha do Sal".
Amadeu não esconde a inimizade que tem por Ary Santos e Osmar Santos, mas explica que a denuncia-crime que apresentou, foi "somente contra o Juiz Dr. Ary Santos e não também contra o Dr. Osmar Santos, em virtude de ser evidente que este terá actuado sem consciência da ilicitude da sua conduta, posto que terá se limitado a seguir instruções recebidas do então Sr. Procurador Geral da República, Dr. Júlio Martins, esse sim, um grande criminoso. Por outro lado, ao contrário do Dr. Ary Santos que insistiu e permaneceu no crime, mesmo depois de ter tido várias oportunidade de repor a legalidade, posto que o Assistente Amadeu Oliveira terá remetido vários requerimentos, recursos e reclamações, no caso do Dr. Osmar Santos, o assistente foi interditado uma vez e, com medo de ser preso, já não insistiu com esse Magistrado, pelo que ele não teve oportunidade de ponderar os argumentos contrários. Daí que não tenha tido a consciência da ilicitude do seu acto; Todavia, não há como esconder os impactos negativos e os prejuízos que o Dr. Osmar Santos provocou na vida do Assistente Amadeu Oliveira".
Comentários