Fechou-se o pano sobre a assinatura do acordo que permite o exercício das Forças Armadas Norte-americanas no território nacional, conhecido por SOFA. Neste momento, o primeiro-ministro estará seguramente a empreender os últimos contactos com as autoridades daquele país amigo e com a comunidade cabo-verdiana ali residentes, antes de regressar ao arquipélago.
Antes, porém, o chefe do Governo estará lado a lado com o Presidente da República num jantar de gala com os nossos emigrantes. Será, certamente, o primeiro encontro presencial entre os dois homens, depois de Fonseca ter denunciado na comunicação social que não discutiram suficientemente o SOFA, antes da assinatura com as autoridades norte americanas. E se assim for, esta festa terá cumprido a sua missão – a promoção do cinismo e da hipocrisia, aqui encarnados por dois órgãos de soberania, o Governo e o Presidente da República.
Numa tirada simplista e desprovida dos amparos teórico-científicos, a diplomacia pode ser definida como a ciência que estuda as relações e os interesses entre as nações. Em detalhes, esta definição estende-se ao serviço dos Estados nas suas relações internacionais.
Assim, num mundo onde as fronteiras tendem a desaparecer e consequentemente as instituições são obrigadas a abordar as questões locais de forma global, para vincular outras nações, outros mercados, outras culturas e outros desejos, a diplomacia ganha um estatuto especial – passa a ser a coluna vertebral da gestão de um país, de uma nação.
Ora, perante este quadro, a ameaça de Jorge Carlos Fonseca em não ratificar o SOFA - um importante instrumento de cooperação no domínio da defesa e segurança, e que é o corolário de um aturado trabalho desenvolvido no campo diplomático entre Cabo Verde e Estados Unidos de América, desde o reinado de José Maria Neves - atingirá certamente pilares estruturantes no quadro das relações do Estado.
A ameaça de Fonseca, neste particular, é bastante clara. “Não é bom que o Governo assine um acordo, o Parlamento aprove e não haja ratificação e o acordo não vigore”, afirmou o mais Alto Magistrado da Nação perante os órgãos de comunicação social.
O que virá a seguir? Vejamos. Se Jorge Carlos Fonseca avançar com a sua posição de não ratificar o SOFA, Cabo Verde estará (i) a desferir uma valente machadada nas suas relações com um país que tem sido seu parceiro desde a independência; (ii) a desprezar a palavra dada por um dos seus órgãos de soberania mais importantes no campo da política externa – o Governo; (iii) a mostrar ao mundo o quanto as suas instituições democráticas se encontram desnorteadas no que concerne ao diálogo político e administrativo sobre as grandes questões do Estado e da nação.
São, com efeito, palavras que vinculam o Estado. Cabo Verde não pode ficar indiferente em relação a este assunto. As afirmações de Jorge Carlos Fonseca mostram que o país precisa acertar os passos em assuntos estruturantes para a afirmação e bem-estar da nação.
É o combate pela palavra e suas implicações. O silêncio da oposição é o prenúncio de um país à beira do descrédito. A hipocrisia e o cinismo não podem assumir a identidade da mensagem e muito menos do mensageiro. Porque aqui a mensagem é Cabo Verde e o mensageiro também é Cabo Verde.
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