Diário de um Resistente
Colunista

Diário de um Resistente

"Entretanto, convém indagar: que bravata e que esbirro de depravados que não termina? Se ainda me achais vivo, tenho de dar graças a Deus e à minha própria iniciativa de viver fora do alcance de uma gentalha inescrupulosa, por quase 20 anos a fio. A barganha tem início em 1993, quando subitamente decidi abandonar a carreira, para não ser nunca industriado a bel prazer dos poderosos da então falsa promessa de dias melhores"

 

«Ter sempre na memória o mártir Jacques de Molay, grão-mestre da Ordem dos Templários e combater, sempre e em toda a parte, os seus três assassinos: a ignorância, o fanatismo e a tirania». Fernando Pessoa, um pouco antes de expirar.

Estou a vir de um longo sonho. Durante o tempo da minha verdadeira alienação, percutiram a minha pele e instaram-me a dar a nova da minha jorna. E isso aconteceu por mais de três décadas inteiras. Acordei e comecei a conviver. Apesar da minha sincera “bona fide”, de há um tempo a esta parte, não só pressinto como noto claríssimos sinais de uma atroz hostilidade à minha proba pessoa de bem. Depois de cutucado por alguns charlatões da barriga de barata, acordei e desatei a deliciar a doce experiência de uma mirabolante anastasia. É como se nunca tivesse batido a bota ou deixado de respirar. Agora torno a acompanhar a dinâmica social da minha estância. As picardias e importunações têm vindo da banda dos que nunca saíram da casca de miserável casulo alheio. Emerge de dentro da minha ingente comunidade uma falange de estultos energúmenos. Uns bimbos azedados e cangaceiros da chamada “estúpida feição”.

Tudo para exponenciar aquilo que a leviana verborreia tem de mais sinistro, esconso e abominável, que é a obsessão pela vaga perceção e pela apresentação de pacotes truncados, obtusos, anacrónicos, crus e rudes. Os tais transumantes e sinecuristas à volta do trono sazonal não pretendem obter nada, com vista à elevação moral de um debate, que se quer impoluto e consequente, para uma verdadeira cidadania, nesta ingrata terra de promissão. Esses jagunços e lapuzes são uma caterva de escoriadas flanelinhas, a soldo de um fascismo serôdio e assaz bacoco, de insipiente modalidade, da casta dos da horda de trumpistas, bolsonaristas e venturistas, mas manhosamente dissimulados nas vestes de democratas. Enfim, uma pochade a pool de coque no pantanal, para pacóvios. O atabalhoado ímpeto rufião tem o fito de não deixar pensar pela própria cabeça, mui ao contrário daquilo que eximiamente apregoava o cosmopolita e visionário líder da nossa emancipação, Amílcar Lopes Cabral.

Especializados no diz que disse, notabilizam-se na ofensa verbal gratuita e no vazio boçal de preconceitos, na negação de eventos e cataclismos, no alucinante terrorismo da palavra e noutros quejandos abrenunciáveis. E esses bichinhos da terra não há nada que façam, sem se escudar detrás do achismo e do enjoativo “Fladu fla”. Claro, um mainato ou matumbo ao cubo, que nada reflete e lê, só pode reproduzir os maneirismos dos da rua e das achadas de alimária. São uma cambada de idiotas prepotentes e galopantes, uns arrogantes gabarolas de natura, compulsivamente mentirosos e desonestos. Uns avarentos polichinelos e escudeiros da detestável corte do belzebu. Embora já decadente e quase no ralo, um tanto fora de moda, a tal enojada selvajaria, os seus cães de fila e lacaios contumazes da lei e ordem, empenhados na falcatrua e na adulteração da substância natural das coisas, continuam excitantes a espalhar o ódio pela comuna, a disseminar mentiras e calúnias entre as boas mentes do território, com a torpe insinuação, para desabrir as pessoas e pô-las umas contra as outras, sem nenhuma isca de patriotismo e senso de irmandade. A tática funesta é dividir para reinar.

Uma façanha assaz inglória e peregrina, já que quando a coisa der para o torto, a casa vai cair, implacavelmente e sem remissão. Os borra bota e boias frias ficam murchos, tais que uns galos ensopados na lamaceira. Felizmente, a sociedade civil e a comunidade estão de olho. Exacerbados nas hilariantes patacoadas, os tais excêntricos javardos e ativistas da hedionda agremiação deviam perceber que a república não é só deles, mas sim de todos os cidadãos e adventícios, legalmente estabelecidos. Se calhar, os “capitis diminutio” não conseguem intuir a derrocada que aí vem. Devia servir de arrimo, para refrear a ânsia dos caninos, janotas e papalvos, a trágica e adstringente trajetória de John Wycliffe, Jhon Huss, Copérnico e Jerónimo de Praga, como lembranças de barbárie, para evitar a todo o custo. Porém, gente míope, da cabeça de nígua tonta, nunca jamais viu coisa alguma, ainda que da alçada de uma verdade de La Palice. Nem mesmo com suporte de uma lupa do tamanho de candelabro e da mais alta resolução.

A corja de símios e sus scrofas imbecis não precisa das lições da História, aperitivo reservado a apenas magníficas figuras, a personas instruídas e miríficas, amigas da ciência e da cultura. Tais matacões embrutecidos são uma coutada de primatas e matutos, sem nenhum construto teórico ou enzima na craveira e sem expertise de espécie alguma. O que sabem é berrar, com tonitruante voz de fera e com a miasma na garganta, contra a dignidade dos semelhantes. Ainda por cima ousam falar, corriqueiramente, da democracia e da Constituição, sem nunca se preocuparem em enxergar o que significa a Constituição de um Estado Democrático de Direito. Porém, isto é, com certeza, lá com eles. Cada um escolhe o que quer. Eu, por bom gosto e por bom senso, optaria por modelos de conduta da Escandinávia e do pujante Canadá. Sim, adoro países grandes e colossais, do tipo de Brasil, Angola e Moçambique. Territórios diminutos carcomem e matam, porque mesquinhos e picuinhas.

Eu integraria no meu panteão de predileção, os traquinas da estirpe de Adão e Eva, Prometeu e Ícaro de Dédalo ou Asclépio de Corónis, ao lado de Galileu, Max Planck e o rebuscado génio, Albert Einstein. Não ficaria enleado ao atrasado mais do mesmo provincianismo. Uns marmanjos desajeitados e frustrados de taberna, a leste de qualquer premonição, furtando-se à relampejada epifania, como o Lúcifer foge da cruz. Vivem da prebenda do efémero poder, com a pútrida missão de serem veados ao serviço dos chefões ou padrinhos da ingente “cosa nostra ”da hodiernidade. Desperdiçam o tempo com o mesmo afã e frenesim com que se engaja um rapazote de recado ou animal de espúria carga, para difundir o boato no meio de alguns incautos e marsupiais, com o fito de minar a credibilidade de quem só sabe trabalhar, desde implume gatinhar. Essas infestadas criaturas vegetam em torno do partido no poder e querem silenciar a massa pensante da nossa herdade.

Da mesma forma que alguns fizeram ao meu nitente inspirador e líder espiritual, da poesia, do direito e de pulsante integridade, o memorável compatrício, Kaoberdiano Dambará, o mais notável vate da língua cabo-verdiana, de todos os tempos, ou seja, o eminentíssimo Dr. Felisberto Vieira Lopes.  Eu, pessoalmente perseguido, apoquentado e esculachado, por todas as franjas da cidade, nunca jamais me deram tréguas. Sou frequentemente bombardeado por todas as bandas de sol e vento, tal que uma revoada de milhafres a cair, em campo aberto, sobre a couraça de um imbele pintainho, a partir dos longínquos e turbulentos anos de 1993/94. Os insultos e calúnias e mentiras, as mais disparatadas difamações a meu respeito, não param de crescer. Em Cabo Verde tudo muda. Só não muda a minha relação com os abutres e capachos do entourage, que há muito me mataram.

Tudo porque na altura disse de plena viva voz – O meu domínio não é espaço para política- Pois assim estava e continua a estar na lei. Foi exatamente por causa disso que o ora cronista se afastou. Certo que não me deixaria manipular a bel talante do pusilânime freguês da conturbada aziaga altura. A minha validade, enquanto cidadão deste país, não depende da cor de nada e de ninguém, a não ser a de bandeira nacional. Apesar da minha relativa juventude da época e da minha impulsiva franqueza de alma, os tenebrosos do poder não entenderam a minha escusa. E agora pergunto aos esmirrados folgazões: para quê me estão a matar constantemente e sine die? Um gritante ensejo para explicar, mais uma vez, junto dos meus algozes e cangalheiros – Senhores leviatãs, sou um triste pobre poeta, um intelectual apaziguado e resolvido, como ene vezes já cheguei a esmiuçar. O que é que vocês querem, afinal?

Não somos concorrentes em tempo algum e não há nenhuma interferência dos nossos voos. Nem nenhuma curvatura do espaço celestial, para nos colocar no mesmo sítio. Portanto, deixai-me ser apenas poeta e prosador, um tanto sofredor - “Se tão sublime preço cabe em verso”. Parai de me matar, a não ser que adoreis viver da sombra do finado ou de fantasma. Pois, como sabeis, eu já morri sob as patas da vossa ardilosa senhoria, há bué de tempo. Trinta anos seguidos a trucidar-me, horrorosos bandoleiros e meus carrascos? E sempre com argumentos atribuíveis aos pais e avôs dos próprios pútridos canalhas e desalmados provocadores. Quem foi sipaio dos colonialistas tem que ser bufo dos seus atuais infelizes conterrâneos. Aliás, nunca houve tantos bufos e sicofantas como agora neste país.

Nada de estranhar nesta matéria. Entretanto, convém indagar: que bravata e que esbirro de depravados que não termina? Se ainda me achais vivo, tenho de dar graças a Deus e à minha própria iniciativa de viver fora do alcance de uma gentalha inescrupulosa, por quase 20 anos a fio. A barganha tem início em 1993, quando subitamente decidi abandonar a carreira, para não ser nunca industriado a bel prazer dos poderosos da então falsa promessa de dias melhores.

*Um dos mártires da esquerda

 

 

Partilhe esta notícia

Comentários

  • Este artigo ainda não tem comentário. Seja o primeiro a comentar!

Comentar

Caracteres restantes: 500

O privilégio de realizar comentários neste espaço está limitado a leitores registados e a assinantes do Santiago Magazine.
Santiago Magazine reserva-se ao direito de apagar os comentários que não cumpram as regras de moderação.