Herdeiros dos terrenos ocupados em São Martinho Pequeno procuram justiça
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Herdeiros dos terrenos ocupados em São Martinho Pequeno procuram justiça

Afinal os terrenos ocupados com construções de habitação, quintas e outras formas de construção em São Martinho Pequeno, Lém Dias, e que tem sido objeto de notícia neste diário digital têm donos e estes já apresentaram uma denuncia por crime público na Procuradoria Geral da República, alegando que os ocupantes praticaram crime de desobediência, nos termos conjugados dos artigos 359.º do Código de Processo Civil e 356.º n.º 3 do Código Penal.

Santiago Magazine teve acesso ao texto da queixa, onde consta que Severiano Mendes Carvalho Silva e Ulisses Manuel Tavares, herdeiros de Manuel Carvalho Silva desejam proceder criminalmente contra os denunciados, Aldino Gonçalves Cardoso, Anatólio Manuel Fonseca Lima, Augusto Andrade Mendes Teixeira, Daniel dos Santos Lobo, Edmilson Amaro Tavares, Filipe Fonseca da Silva, Lene Freire Joaquim Varela, Jeir Gomes de Figueiredo Gonçalves, José Gomes, Marino Vieira do Canto, Octávio César Silveira Melício Pires e outros ocupantes que têm realizado construções de noite e à socapa, desrespeitando a decisão do Tribunal de Relação de Sotavento, e fugindo à notificação da Guarda Municipal, requerendo, desde já, a sua constituição como assistente no processo.

Entre os ocupantes constam ainda nomes dos deputados Emanuel Barbosa e Isa Costa.

Os queixosos alegam que por herança de Manuel Carvalho Silva, seus avôs, constam dos bens duas propriedades, Verba N.º 16 (Dezasseis), e Verba N.º 17 (Dezassete), situadas em São Martinho Pequeno, na Freguesia de Nossa Senhora da Graça – Praia.

Neste momento, segundo os mesmos, estas propriedades encontram-se registadas na Conservatória do Registo Predial sob o nº 4.144, e inscritas na Matriz Predial Rústica da freguesia de Nossa Senhora da Graça, sob os n.º 21/0, 28/0 e 50/0, tendo já procedido ao levantamento topográfico, confirmando-se assim uma área de 289ha.

Por outro lado, afirmam, o Município da Praia tem vindo a cobrar imposto sobre a propriedade, o IUP, no valor estimado de 1.000.000$00, tendo os proprietários pago mais de um terço deste valor, ou seja, mais de 350.000$00.

Com a cobrança do imposto, observam, significa que o próprio Município da Praia reconhece o direito de propriedade dos denunciantes sobre os respectivos terrenos.

Ora, é evidente, lamentam os denunciantes, que a “ocupação clandestina desses terrenos tem causado graves prejuízos aos proprietários, que assistem a sua propriedade a ser ocupada de forma criminosa por construções clandestinas”.

Os denunciantes fundamentam a queixa no disposto no artigo 359.º do Código de Processo Civil, segundo o qual “constitui crime de desobediência qualificada o não acatamento da providência cautelar decretada, sem prejuízo das medidas adequadas à sua execução coerciva.”

Este crime é sancionado com pena de prisão até 2 anos ou multa de 60 a 200 dias, nos casos em que existir disposição legal que comine a punição por desobediência qualificada.

Dos factos. No dia 31 de Dezembro de 2018, o presidente da CMP, Óscar Santos, assinava um despacho, cuja cópia este diário digital teve acesso, onde determinava que a direção da Guarda Municipal e demais serviços municipais competentes, procedessem ao entulho dos caboucos e demolição da raspais construídos ilegalmente naquela zona.

Na referida carta, Óscar Santos, escrevia que “não obstante as várias diligências levadas a cabo, até à presente da data (31 de dezembro de 2018), não foi possível identificar os infratores, pois que as obras são executadas à socapa, desafiando a autoridade municipal e causando prejuízos consideráveis ao município”, acrescentando que “as referidas obras põem em causa os futuros planos urbanísticos que a Câmara Municipal da Praia pretende criar e implementar naquela zona da cidade”.

No dia 10 de janeiro de 2019, ou seja, 11 dias após o despacho para a demolição das construções, Óscar Santos, assinava uma carta dirigida à Polícia Judiciária onde pedia a colaboração dessa corporação policial na identificação dos infratores e o consequente apuramento das responsabilidades criminais dos seus atos.

Nessa carta, Óscar Santos, reafirmava que os serviços municipais não tinham conseguido identificar os infratores porque estes trabalhavam na calada da noite, dificultando assim a fiscalização, por um lado, e por outro, os infratores punham-se sempre em fuga face à presença dos Guardas Municipais, complicando ainda mais a intervenção da Câmara Municipal.

Ora, se faz evidente que com essas investidas da CMP, o cerco sobre os infratores ia-se apertando. E é nesse ambiente que os 14 indivíduos acima identificados requereram uma providencia cautelar judicial sobre o despacho municipal de demolição das suas obras, alegando, em síntese, que são donos e legítimos proprietários das referidas obras, que não foram notificados da demolição, o que constitui violação dos seus direitos de proprietários, que os terrenos não são da CMP, nem de ninguém, tratando-se de terrenos abandonados.

No dia 24 de julho de 2019, o Tribunal da Relação de Sotavento proferiu o douto Acórdão n.º 104/19, nos Autos Cíveis de Apelação – Providência Cautelar n.º 53/19, no qual os Senhores Juízes Desembargadores acordaram em conceder provimento ao recurso interposto pelo Município da Praia, declarando a incompetência em razão da matéria do juízo cível da Comarca da Praia, e em consequência absolver o requerido da instância, por tratar-se de uma matéria da competência do Supremo Tribunal de Justiça

O douto Acórdão convalidou o despacho n.º 89/2018, datado de 31 de dezembro de 2018, em que o presidente Óscar Santos ordenou a demolição dos raspais e caboucos ilegalmente construídos na zona de São Martinho Pequeno.

O referido Acórdão não foi objeto de recurso, tendo, por isso, transitado em julgado nos termos estabelecidos na lei, facto que reconfirma que os denunciados ocuparam de forma ilegal e ilícita uma área superior a 30.000 m2.

Mesmo tendo sido notificados dessa decisão judicial que reconhece como válida a decisão do presidente da CMP, e não tendo recorrido dessa decisão, os denunciados continuaram com as suas construções, desobedecendo dessa forma o Acórdão do Tribunal da Relação de Sotavento.

E essa atitude terá eventualmente servido de exemplo para outras pessoas que a partir desse momento também ocuparam várias outras parcelas de terreno, levando a cabo construções similares, mesmo sabendo que a sua conduta era ilegal e ilícita, e desobedecendo uma decisão judicial.

Aliás, o próprio Acórdão sugere que os denunciados não podem desconhecer a ilegalidade e a ilicitude da sua conduta, visto serem pessoas com responsabilidades e com formação superior (comandantes de polícia, jornalista, empresários e engenheiros), podendo ainda estar implicados Deputados Nacionais, de acordo com informações de pessoas residentes na mesma localidade.

O estranho em tudo isso é que a Câmara Municipal da Praia não cumpriu o Acórdão do Tribunal de Relação de Sotavento como, de resto, recomenda e a lei, tendo remetido ao silêncio até este momento, uma posição que muitos consideram uma forma de encobrir colegas e partidos e pessoas com alguma influência na sociedade. 

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