O 28º dia do julgamento do advogado Amadeu Oliveira ficou esta segunda-feira, 26, marcado pela acusação da testemunha António Monteiro, deputado, ao procurador Vital Moeda, que acusou de lhe fazer “perguntas insultuosas” durante a inquirição.
Com efeito, já na ponta final da audição da testemunha António Monteiro, que durou uma hora e vinte e cinco minutos, o procurador Vital Moeda questionou o deputado sobre quais as críticas de Amadeu Oliveira feitas à justiça que estavam insertas no despacho de pronúncia e, logo, em julgamento.
Monteiro respondeu uma primeira vez, que as críticas do ora arguido formam feitas “sempre no sentido de buscar o que é melhor para sector”, o procurador não satisfeito com a resposta voltou à mesma questão e a testemunha então disse que o Ministério Público “conhecia bem” as críticas e, dirigindo-se ao procurador, clamou tratar-se de “perguntas insultuosas”.
A juiz-presidente do colectivo interveio de imediato e considerou normal o facto de o procurador insistir numa questão, e que não considerava tal um insulto, ao passo que Vital Moeda preferiu não fazer mais questões à testemunha, ressalvando: “Sou íntegro, faço o meu trabalho, é a primeira vez que isto me acontece na minha carreira de mais de 20 anos, ai daquele que algum dia colocar em causa a minha integridade”.
Um outro momento que marcou a sessão da de hoje, que durou cerca de três horas, foi quando a defesa do arguido, através do advogado Félix Cardoso, voltou a pôr em causa a condução dos trabalhos pela juiz-presidente do colectivo de juízes.
Para a defesa, a condução tem sido marcada, “desde o início”, por notas de “manifesta violação de imparcialidade”, conduta que, segundo o advogado, não é estranha à defesa e que “reforça ainda mais” os pedidos de suspeição ainda pendentes no Supremo Tribunal da Justiça (STJ), também envolvendo a presidente do colectivo.
Esta reação da defesa foi motivada por um despacho do tribunal que autorizou a leitura de uma prova documental a pedido do Ministério Público, e cuja leitura tinha sido impugnada pela defesa na sessão do passado dia 13.
Em causa uma troca de mensagens no aplicativo WhatsApp entre o arguido e o director do jornal online Notícia do Norte, documento que a defesa pediu para ser declarado nulo e sem nenhum efeito probatório, recurso que a juiz deferiu e que deve seguir nos próprios autos ao STJ, mas mesmo assim, ordenou a leitura do documento na audiência de discussão e julgamento.
Sobre a inquirição da testemunha António Monteiro, arrolada pela defesa, esta explicou ao tribunal que o convite para a integração de Amadeu Oliveira nas listas da UCID, partido que à época presidia, partiu dele, Monteiro, que nunca o arguido teve comportamentos violadores da sua condição de deputado, e que Oliveira critica a situação da justiça “há muito, muito tempo”, antes de ser eleito deputado, e “sempre como cidadão/advogado”.
Que não teve conhecimento de plano nenhum do arguido para sair de Cabo Verde com o seu constituinte e que o levantamento da imunidade do então deputado Amadeu Oliveira foi feita “de forma indevida e ilegal” e que ainda aguarda, na qualidade de um dos 15 deputados subscritores, a decisão de um recurso junto do Tribunal Constitucional sobre a matéria.
O julgamento prossegue esta terça-feira, 27, as 14:30, estando a tarde reservada ao arguido Amadeu Oliveira para comentar toda a prova produzida no decorrer do presente julgamento.
A presidente do colectivo de juízes que julga a causa apontou o dia de quarta-feira, 28, para as alegações finais, no final das quais marcará o dia de leitura do acórdão.
O advogado Amadeu Oliveira está acusado de dois crimes de “responsabilidade de titular de cargo político”, um dos quais na modalidade de atentado contra o Estado de Direito e o outro de coacção ou perturbação do funcionamento de Órgão de Soberania, e ainda dois crimes de ofensa a pessoa colectiva.
Foi detido no dia 18 de Julho de 2021 e, dois dias após a detenção, o Tribunal da Relação do Barlavento, sediado em São Vicente, aplicou a prisão preventiva ao então deputado nacional eleito nas listas da União Cabo-verdiana Independente e Democrática (UCID) pelo círculo eleitoral de São Vicente.
No dia 14 de Fevereiro, como resultado de uma Audiência Preliminar Contraditória, Amadeu Oliveira foi pronunciado nos crimes que vinha acusado e reconduzido à Cadeia Central de São Vicente onde continua em prisão preventiva.
Em 29 de Julho, a Assembleia Nacional aprovou, por maioria, em voto secreto, a suspensão de mandato do deputado, pedida em três processos distintos pela Procuradoria-Geral da República (PGR), para o poder levar a julgamento.
Em causa estão várias acusações que fez contra os juízes do Supremo Tribunal de Justiça e a fuga do País do condenado inicialmente a 11 anos de prisão por homicídio – pena depois revista para nove anos – Arlindo Teixeira, em Junho do ano passado, com destino a Lisboa, tendo depois seguido para França, onde está há vários anos emigrado.
Arlindo Teixeira era constituinte de Amadeu Oliveira, forte contestatário do sistema de Justiça cabo-verdiano, num processo que este considerou ser “fraudulento”, “manipulado” e com “falsificação de provas”.
Amadeu Oliveira assumiu publicamente, no parlamento, que planeou e concretizou a fuga do condenado, de quem era advogado de defesa, num caso que lhe valeu várias críticas públicas.
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